Ouvir e ler, dias antes e depois do referendo na Grécia, os comentadores televisivos, cronistas de imprensa escrita ou bloggers é uma tarefa penosa e irritante, que apenas nos deixa ansiedade revoltada. Parece que nada aconteceu. E no entanto, a julgar pelo estado de emergência na Europa, tudo aconteceu. Portugal é realmente pequenino nas suas mentes e nas suas personalidades.
Eu, jornalista de formação e deformado, neste caso mal informado e viciado pelo ambiente nacional, até julguei que a pressão europeia iria fazer mossas no estado de espírito dos gregos. E que o "Sim", aprisionando o povo grego, iria - apesar disso - acabar por vencer. Por medo, por pavor do desconhecido, pelo horror ao novo. E que o Syriza iria perder os seus pontos ao decepcionar o povo grego e dando a perder a última esperança na Europa para uma política diferente da austeridade assassina e estúpida, irracional.
Eu e muitos jornalistas, comentadores e políticos. Bastava ouvi-los nas televisões, a dizer que a maioria do povo grego queria ficar no euro e que portanto votaria "Sim". Que o voto no "Não" nada alterava, que a Grécia estava - de novo - em default - e que - de novo - os Estados "equilibrados", "desenvolvidos", "disciplinados" iriam de ter de pagar. E para quê? Era preciso dizer "Basta" a essa cambada. Austeridade era a única forma de disciplinar os gregos indisciplinados.
Como era possível dizer tamanha aleivosia quando a Grécia estava onde estava pela política de austeridade levada a cabo durante 5 (!) anos, incapaz de resolver o problema que - oficialmente - se quis atacar?!
Depois, no próprio dia do referendo, quando todos os seus planos foram furados, era pressentir o seu estado de desorientação. Sentia-se o fim de um raciocínio. Sobretudo, sentia-se o hiato colossal que ia entre a desvalorização que faziam do "Não" grego e a importância que as instâncias comunitárias - igualmente em estado de choque - lhe davam. Reuniões de emergência, cimeiras franco-alemãs, etc. Mas mais espantoso ainda foi ouvi-los e lê-los dias depois do referendo a defender precisamente o mesmo que tinham defendido antes, como se nada se tivesse passado. Parece um toque à normalidade que deixou de existir.
Como foi que o Referendo "inútil" - redundante de um mandato claro do Syriza meses atrás - tinha desencadeado tanto nervosismo? Como que foi que uma "vacina" para os restantes Estados - aquele "sinal claro" de que falava Juncker dias antes do referendo - aquele antídoto contra a "esquerda revolucionária", "radical", se tornou num medo de uma "epidemia"? Será que não se pressente o quartel-general do "império" europeu a mover-se de imediato? Como é possível que estas mentes pequenas não pressintam o que aí vem? Que a União Europeia - até pressionada pelos Estados Unidos - vai ter de mudar de política ou arriscando-se a colapsar pelo pânico cego (?) dos mercados? Que até o caso português - ao arrepio de tudo o que a troika defendeu - é o início de uma mudança de política, sem ser assumida, oposta à da austeridade e dando como vitória o que, na realidade, é a assunção envergonhada do seu fracasso modernizador, tal como tinha sido previsto no Memorando de Entendimento. Disso é sintomático o programa eleitoral do PS e as jornadas parlamentares do PSD e CDS, a apostar no crescimento económico.
Tão pequenos e tão pouco flexíveis, tão perdidos naquilo que os levaram a defender, que agora não querem dar o braço de torcer porque isso significaria partirem a sua espinha endurecida pela violência do que estava em jogo neste combate, afinal tão ao lado da realidade.
John Lennon disse enquanto era vivo que “A vida é aquilo que acontece enquanto fazemos planos para o futuro”. Foi isso que senti quando desliguei a televisão.
«Mas mais espantoso ainda foi ouvi-los e lê-los dias depois do referendo a defender precisamente o mesmo que tinham defendido antes, como se nada se tivesse passado»
ResponderEliminarA melhor expressão disto mesmo foi o comunicado oficial do PS sobre o resultado do referendo. Podia ter sido lido na véspera.
Mas o que é que se esperava dos partidos da troika, do PS, do PSD e do CDS? Que ficassem do lado da troika, pois é claro!
fazer moças? essa deixou-me uma mossa na cabeça.
ResponderEliminarÉ assim....
ResponderEliminar:-) muito obrigado pela correcção do erro. Quando se escreve demasiado depressa, a mão tende a ouvir o "som" do pensamento...
ResponderEliminarClaro que o referendo nada significa para a Europa.
ResponderEliminarQual a novidade de se querer mais e melhor, pão e circo, mais euros sem contrapartidas como num período de que só parcialmente se exclhateia é que ainda auem os últimos cinco anos?
30% dos gregos sabem o que é a UE; já é notável.
O que me chateia é que ainda vamos pagar para os ver fora do euro!
...parcialmente se excluem os últimos cinco anos?
ResponderEliminarNão há muito a fazer, uns são a favor dos Capitais e da Finança e outros são a favor da igualdade de oportunidades e de boas condições de vida para todos. Uns preferem ser miseráveis toda a vida, desde que possam entretanto imaginar que um dia serão privilegiados. Outros desejam viver em igualdade de circunstâncias com os demais mesmo que isso não os coloque em nenhum patamar de eleição.
ResponderEliminarEstas duas correntes combatem-se desde sempre, os métodos podem oscilar mas os objectivos são os mesmos.
-Uns submetem-se a tudo desde que lhes concedam um lugar no manjar dos Eleitos nem que seja por um minuto, outros consideram-se naturalmente eleitos ao lado de todos os restantes para toda a vida e não dão importância demasiada, a quem não tem importância nenhuma.
Nada a fazer enquanto a má-formação se mantiver e o egoísmo for a cultura dominante!
Nem mais caro Meireles.
ResponderEliminarMas há mais. Uns defendem com unhas e dentes a sua posição , a sua vida à custa das rendas garantidas pelas negociatas entre os seus governos e as suas empresas.
Uns defendem a continuação da exploração alheia como fonte de riqueza do seu acumular de Capital
O "claro que o referendo não significa nada para a europa" é apenas o sinal claro do nervosismo que se espalha como óleo de esgoto entre as hostes neoliberais e de direita-extrema.Qualquer observador minimamente honesto ( e que não faça a apologia de colaboracionistas traidores) sabe que só alguém muito perturbado não vê a crispação e a irritação, o medo e o pânico, a raiva e o ódio que o Não grego provocou entre a cúpula não democrática da UE , do FMI e do BCE.
A prova provada de tal desnorte é o absurdo desta frase:"30% dos gregos sabem o que é a UE". Só alguém perturbado não percebe que quem votou Não sabe mesmo muito bem o que é esta "europa" da merkel e do jose e do passos e do portas e da restante quadrilha. Precisamente por saber é que votou um rotundo Não.
Mas esta pecha tão significativamente autoritária, tão esclarecedoramente anti-democrática de quem não segue o caminho de submissão não "sabe o que é", não pertence ao rebanho iluminado, faz lembrar outros tempos que se julgavam desaparecidos.
A menos que "jose" os queira voltar a impôr
De