As atenções estão todas centradas na Grécia. Mas estará Portugal realmente melhor?
Basta olhar de relance para os factos. Portugal não está num risco de bancarrota menor que o da Grécia. A dívida pública do país, situada em 124% do PIB, pode ser inferior à grega. Contudo, o défice público é apenas uma parte – mesmo que importante – do total da dívida.
Em termos agregados, a dívida global portuguesa – de 381% do PIB quando se considera também a dívida privada, das famílias e das empresas não financeiras – é bastante superior à dívida global da Grécia (286% do PIB) [ver gráfico].
Por isso, enquanto os problemas gregos se manifestam sobretudo ao nível do endividamento público, Portugal regista uma dívida excessiva nestes três sectores da economia.
Uma dívida que continua a crescer
Entretanto, a dívida portuguesa continua a aumentar a um ritmo superior ao do crescimento da economia. Entre 2008 e 2013, a dívida agregada subiu 69 pontos percentuais. Para se conseguir inverter esta diferença, seria necessário que o sector público, por si só, aumentasse a receita fiscal em cerca de 3,6% do PIB.
Considerando o estado global da economia portuguesa e os problemas de endividamento do sector privado, essa solução constitui uma missão impossível. Se fosse tentada, arrastaria a economia para uma depressão sem limites.
Perante estes factos, torna-se ainda mais surpreendente que o parlamento alemão tenha votado por unanimidade a favor da proposta portuguesa, de pagamento antecipado dos empréstimos do FMI.
Os deputados do parlamento alemão fizeram-no com agrado. Porquê? Porque no contexto das tensas negociações com o novo governo da Grécia em Bruxelas, sobre a extensão do programa grego, era importante afirmar que a abordagem europeia à crise, assente na imposição da austeridade e das reformas, está de facto a funcionar.
Para Portugal, tratou-se de um bom negócio, pois permitiu substituir a dívida do FMI, com juros próximos dos 4%, por dinheiro mais barato, obtido nos mercados financeiros. Mas o refinanciamento de Portugal nos mercados não é propriamente um sinal de sucesso das políticas europeias.
Na medida em que os credores são maioritariamente estrangeiros, Portugal não pode deixar crescer a dívida infinitamente. E também não se encontra numa situação de crescimento que permita ultrapassar o problema da dívida. Mesmo assumindo um excedente de 0,9% (como o obtido em 2013), seriam necessários 128 anos para pagar integralmente a dívida externa.
A dura realidade portuguesa
Para lá da questão da dívida, Portugal enfrenta outros desafios de peso: possui a mais baixa taxa de natalidade da zona euro e tem que lidar com um êxodo da população jovem para outros países, em regra com menores níveis de qualificações e de produtividade.
Com 9 patentes por um milhão de habitantes, Portugal revela um melhor desempenho que a Grécia (com 4 patentes por milhão de habitantes). Contudo, distancia-se significativamente de países como a Itália, com 70, ou a Alemanha, com 27. E competir com base nos preços? Essa é uma estratégia muito difícil para um país europeu com elevados níveis de endividamento.
Chego assim a duas conclusões: Primeiro, Portugal nunca reunirá condições para cumprir o serviço da dívida. Segundo, o acesso aos mercados de capitais é apenas o resultado das políticas do BCE e não do sucesso de políticas levadas a cabo internamente, à escala macro ou micro. Assim sendo, a que é que esta situação conduz?
Uma solução idêntica à da Grécia?
Até agora, o ministro grego das Finanças, Yanis Varoufakis, é um dos poucos a solicitar abertamente financiamento directo do BCE. A sua proposta, no sentido de que o Banco Central Europeu compre e permute títulos perpétuos de dívida pública, sem juros, parece ser demasiado criativa para que possa ser amplamente aceite.
Quanto maior for o crescimento dos níveis de dívida dos Estados Membros europeus - e isto é matemática simples - mais evidente se torna que a dívida está fora de controlo. E nesse sentido a pressão sobre o BCE, para que "resolva" o problema, tornar-se-á insustentável.
Quando falam sobre a Grécia, os meios de comunicação social costumam sentenciar que a extensão do programa pelo Eurogrupo permitiu "evitar a bancarrota do país". O que é obviamente um disparate.
O que se adiou não foi a bancarrota, mas apenas a declaração oficial de bancarrota da Grécia. O momento em que a Grécia deixe de ter dinheiro não será um momento de falta temporária de liquidez (como a comunicação social supõe), mas sim a declaração oficial de um facto já conhecido.
E é importante perceber que isto também se aplica, basicamente, a Portugal.
Versão portuguesa do recente artigo de Daniel Stelter (fundador do think tank alemão Beyond the Obvious), Portugal’s Successful Turnaround? A Fairy Tale, no The Globalist.
Não serve de atenuante, mas à boleira dos últimos acontecimentos mediáticos, o Passos Coelho, veio confessar que não sabe nada de nada, uma coisa que nós já sabíamos.
ResponderEliminarPoderia era ter dito exactamente o mesmo há quatro anos.
Ter-nos ia poupado uma data de sofrimento, teríamos se calhar a mesma divida, mas a EDP, a ANA, a Cimpor, a PT, os CTT, e por aí fora ainda seriam nossas, e sem empresas estratégicas, numa país sem escala, vai ser IMPOSSÍVEL sair desta armadilha para coelhos onde todos fomos enfiados....
2ª frase do texto:
ResponderEliminar"Portugal não está num risco de bancarrota menor que o da Grécia."
Como é evidente para todos, a começar pelos investidores que compram dívida pública e que, de forma masoquista, sabem perfeitamente que vão perder o dinheiro investido mas continuam a emprestar. Tótos (como diz o meu filho de 6 anos)!
Totós são os que ainda não aprenderam nada com o que se tem passado nos últimos anos!
ResponderEliminarO risco de bancarrota é evidente.
ResponderEliminarO BCE é que manipula os mercados e os juros.
Portugal não tem um verdadeiro acesso aos mercados.
A bancarrota instalou-se em Portugal a quando da entrada na CEE. ERAM ENTÃO PRESIDENTE DA REPUBLICA Mário Soares E PRIMEIRO MINISTRO Cavaco Silva.
ResponderEliminarNa mira de nos enfeudar eternamente nesta forma imperialista de enganar os povos
Adelino Silva
"Portugal não está num risco de bancarrota menor que o da Grécia."
ResponderEliminar"O BCE é que manipula os mercados e os juros."
Como pessoa de bem, o Estado Português devia recusar pagar taxas de juro tão baixas ao investidores optando antes pela taxas pagas pelo Estado Grego (implícitas, porque o Estado Grego nem com manipulações de mercado por parte do BCE se consegue financiar junto dos investidores). A bancarrota é evidente por isso chega de enganar os investidores!!!
"Totós são os que ainda não aprenderam nada com o que se tem passado nos últimos anos!"
"Portugal não está num risco de bancarrota menor que o da Grécia."
ResponderEliminarNão somos todos Gregos mas muitos de nós preferiam ser. E daqui a 4 meses ainda mais!
Sem ter em conta que, a adopção das novas regras de contabilização europeia (SEC2010) conduzirá em 2015, à inclusão na dívida pública da Parpública e das suas próximas – com destaque para a célebre Parvalorem – bem como das EPE e alguns dos preciosos reguladores. O aumento daí resultante colocará a dívida nuns € 242000 M (cerca de 147% do PIB).
ResponderEliminarCaro anónimo das 16.01
ResponderEliminarSe isso é verdade o que diz então é simples.
O BCE pode simplesmente dizer que recusa as obrigações portuguesas como colateral.
E exclui-nos do programa de QE.
Depois logo se vê o que vai acontecer aos juros.
"O BCE pode simplesmente dizer que recusa as obrigações portuguesas como colateral.
ResponderEliminarE exclui-nos do programa de QE.
Depois logo se vê o que vai acontecer aos juros."
Aconteceria o mesmo que à Grécia: juros elevados e na prática uma exclusão do mercado. Felizmente Portugal não é a Grécia e isso não acontece (neste momento). O que não quer dizer que não venha a acontecer. Se a espiral recessiva se mantiver, por exemplo.
"E exclui-nos do programa de QE."
ResponderEliminarA Grécia está fora do programa de QE do BCE? (sinceramente não sei)
Qual é o risco de investir na dívida de um país (emprestar-lhe dinheiro) quando o seu próprio governo defende a reestruturação da dívida (naturalmente com perdas para os investidores)?
"Sem ter em conta que, a adopção das novas regras de contabilização europeia (SEC2010) conduzirá em 2015, à inclusão na dívida pública da Parpública e das suas próximas"
ResponderEliminarEm princípio, segundo percebo, o montante total não é alterado uma vez que essa dívida estará, neste momento, a ser contabilizada como privada (erradamente do meu ponto de vista). Essa actualização só vira tornar ainda mais claro o verdadeiro peso da dívida pública no total. É uma boa iniciativa!
Era bom que pudéssemos consultar a fonte.....
ResponderEliminarhttp://www.mckinsey.com/insights/economic_studies/debt_and_not_much_deleveraging
ResponderEliminarFull Report p. 106
Nesta análise também não deveria entrar a divida total externa? Entendo que a dívida privada é constituída pelo sector bancário português que compra divida pública, o que faz com que não se possa acumular as 2 percentagens para obter um total. especialmente na ultima reestruturação de 2012, tenho ideia que os credores de divida publica grega são mais diversificados dificultando uma comparação justa. Se calhar devia-se comparar com Espanha em vez da Grécia.
ResponderEliminarCaro Anónimo das 19h44, o gráfico apenas serve de ilustração dos valores referidos no texto pelo autor do artigo (juntando o valor da dívida pública da Grécia).
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