domingo, 4 de janeiro de 2015

Nova carta à Alemanha


Senhora Merkel, Chancelerina da Alemanha

Em novembro de 2012 por ocasião de uma visita sua a Portugal escrevi-lhe uma carta em que lhe pedia que desse conhecimento aos seus compatriotas dos riscos em que os fazia incorrer com os resgates à Grécia, à Irlanda e a Portugal.

Pedia-lhe que lhes dissesse que “os empréstimos concedidos à Grécia, à Irlanda e a Portugal são na realidade uma dívida imposta aos povos destes países para “resgatar” os vossos bancos”. Isto que então lhe dizia tornou-se entretanto cristalino ao ponto de ser quase oficialmente reconhecido.

Dizia-lhe também que em consequência da austeridade “estes países, chegarão ao ponto em que terão de suspender o serviço da dívida [com] perdas pesadas para todos, contribuintes alemães incluídos”. Pois bem, a avaliar pelo que publicam os jornais do seu país esse ponto está cada vez mais próximo.

Segundo esses jornais a senhora conseguiu vencer o risco de “contágio” da Grécia. A Grécia deixou de contar. A Irlanda e Portugal estão “reabilitados”.

Dispenso-me de comentar o recurso ao horrível verbo “reabilitar”. Digo-lhe só que se engana. Engana-se duplamente e engana os seus concidadãos. Nem a Grécia deixou de contar, nem Irlanda e Portugal estão a salvo.

É verdade que a Grécia, Portugal e a Irlanda já não devem quase nada aos bancos do seu país. Os bancos do seu país, estão, não diria a salvo, mas muito mais protegidos. No entanto, em contrapartida, a Grécia, Portugal e a Irlanda devem muitíssimo aos fundos europeus garantidos pelos impostos de todos os europeus, incluindo os dos cidadãos do seu país.

É verdade também que as taxas de juro da dívida portuguesa e irlandesa são de momento baixas, mas não é menos verdade que qualquer abanão vindo da Grécia, como vimos no mês passado, tende a quebrar esse equilíbrio, vedando de novo o acesso pelo menos de Portugal ao mercado de capitais.

Vemos assim que não lhe bastou omitir a verdade uma vez. A senhora na realidade sabe que qualquer solavanco, seja ele na Grécia, seja ele em Espanha, seja ele na Irlanda, seja ele em Itália, será suficiente para desencadear uma reação em cadeia. No entanto, para tentar submeter a democracia Grega, dá-lhe jeito fingir que não é assim. Dessa forma volta a faltar à verdade ao esconder as enormes perdas para os contribuintes alemães que decorreriam de um agravamento da tragédia Grega por si provocado.

Mais uma vez senhora Merkel lamento a amargura que transparece das minhas palavras. A senhora está presidir a um desastre europeu de grandes proporções. E o mais absurdo é que nem sequer o está a fazer em nome do interesse do povo alemão.

6 comentários:

  1. A ser verdade o que a comunicação social relata, trata-se de um novo nível de chantagem, chocante, absolutamente inadmissível e intolerável. Mas o outro lado dramático é que não se vê o Syriza com estofo para aguentar uma perspetiva de saída do euro e muito menos preparar-se para isso, de que foge provavelmente ainda mais do que a Merkel.

    É muito exagerada, provavelmente errada, de qualquer modo demasiado categórica, a afirmação de que qualquer solavanco vindo da Grécia tende a fazer subir as taxas de juro dos periféricos e a ser suficiente para desencadear uma reação em cadeia que ponha novamente Portugal fora dos mercados nos próximos tempos.

    Os abanões recentes da Grécia, digamos dos últimos três meses, apenas se traduziram em pequenos assomos em alta das yields das obrigações portuguesas, rapidamente corrigidos em baixa. Na verdade, com a cada vez mais próxima provável vitória eleitoral do Syriza (apesar das terríveis pressões externas, da Alemanha, UE e FMI), a tendência é para uma alta pronunciada dos juros dos títulos de dívida grega, que a dez anos já se abeiram dos 10%, mas para uma baixa inegável, pelo menos até agora, dos congéneres portugueses, fechando a 2,45% na sexta-feira.

    Na perspetiva dos “mercados”, a dívida portuguesa e outros periféricos europeus está, atualmente, desconectada de facto da grega. Claro que não se podem excluir reações em cadeia, com uma base objetiva contudo mais estreita, devido ao descarte das obrigações gregas pelos bancos europeus e a crescente “oficialização” da (do aumento do peso da UE e do FMI, com outro poder de encaixe, na) dívida grega, mas o nervosismo tem-se mostrado pouco contagioso e, embora não seja o mais provável, nem se pode excluir que uma saída forçada (contra a vontade do Syriza, que, o mais certo, é que antes disso cederia) da Grécia do euro fizesse, eventualmente depois de um curto período de turbulência sem grande significado, cair os juros das dívidas públicas dos países, tanto do core europeu, como dos restantes periféricos. É a tese de alguns setores do grande capital europeu, de que é preciso mandar fora os ovos podres.

    Mais prudência, mais cuidado com previsões demasiado unilaterais, subjetivas e perentórias.

    ResponderEliminar
  2. «...da tragédia Grega por si provocado».
    O ridículo da irresponsabilização dos periféricos só pode garantir que sejam entregues ao destino que merecem, por irresponsáveis e venais.
    Era o que mais faltava! pôr o capital alemão sob a pata de cretinos que apelam ao capital para o desbaratrem no exaltante exercício do tudo a todos.

    ResponderEliminar
  3. Caro Professor. Bem haja pela sua notável carta. Espero que chegue a seu dono. Também acho que isto da retoma é de uma grande fragilidade, uma invencao com fins puramente eleitoralistas cá dentro e certamente uma conveniencia da China lá fora, pois sao eles os grandes financiadores das dividas externas de muitos países. Fico sempre triste quando verifico que lhe enviam comentários anónimos. Porque o fazem e com que intencao, senao de intimidacao, desconheco. Mas acho sempre muito cobarde.. Atentamente, MB

    ResponderEliminar
  4. A fácil profecia concretiza-se.

    Mas convenhamos que se torna excessivo este amor desmedido ao "capital" em si, ao Capital alemão em particular e ao destemor e facilidade como se apelidam de "cretinos" (com patas e tudo) quem se tem por inimigo desse mesmo Capital.

    O "tudo a todos" é uma fórmula que serve às mil maravilhas para esconder o desejo secreto e fundado que "o tudo" deve apenas ser reservado a meia dúzia.

    A concentração da riqueza sempre foi o objectivo de. Há tempos um verdadeiro ... do dito capital regozijava-se com a abissal monstruosidade de 85 pessoas terem o rendimento equivalente à da metade da população do planeta.

    Outros vasconcelos e outras estórias.

    Viva o capital.Viva a alemanha.Viva o o capital alemão.

    De

    ResponderEliminar
  5. Desculpe o atalho da epistolografia para a ficção.A construção europeia assemelha-se cada vez mais a um parque temático.Parque natural do capital e de espécies selvagens que se julgava extintas e lugares exóticos-a Grécia aparece ao fundo do cenário num lago. Mas a grécia permanecerá no imaginário popular muito para além-da europa de Merkel.Esta faz lembrar mais Ness nas suas metamorfoses para provar a sua inexistência embora tenha feito muitas mortes.A exaltação grega lembra-me o herói popular, Gramsci dizia a propósito"Talvez o super-homem popular dumasiano se deva mesmo considerar uma reacção democrática à concepção do racismo de origem feudal...

    ResponderEliminar
  6. Os "CRÁPULAS EMPROADOS LAMBE-BOTAS", que se instalaram nos centros de decisão,

    manipulando e subvertendo a democracia,
    só têm um objectivo:

    fazer perdurar o Sistema

    - por cada dia que passa, aumenta o valor do saque ao POVO.

    O tempo, só joga a favor dos SAQUEADORES!

    ResponderEliminar