Assustados com os resultados das eleições europeias, os principais líderes europeus, incluindo Merkel, Hollande, Barroso e Draghi, anunciaram nas últimas semanas uma aposta reforçada no crescimento e no emprego. Têm em mente, como habitualmente, o recurso a dois tipos de instrumentos: as chamadas reformas estruturais e a política monetária. Sucede que as primeiras são contraproducentes e a segunda é ineficaz.
Estruturais e contraproducentes
As "reformas estruturais" são um termo especialmente fluido que se destina a esconder mais do que revela e que parece algo de inquestionavelmente positivo... até que se torna visível o conteúdo programático concreto que efectivamente encerra. A esse nível, o que encontramos é invariavelmente um conjunto de medidas de liberalização e flexibilização do lado da oferta, com ênfase na flexibilização do mercado de trabalho. Acontece que, no contexto actual, a estagnação do investimento e do emprego, em Portugal como na Europa, não se deve a qualquer tipo de rigidez do lado da oferta. Isso é especialmente óbvio no caso do mercado de trabalho: na última década e meia, por exemplo, foram várias as reformas do código do trabalho levadas a cabo em Portugal, sempre no sentido da flexibilização... e o desemprego não só não diminuiu, como aumentou de 4% para mais de 15%.
Isso nada tem de surpreendente. É o que o problema não está do lado da oferta, mas do lado da procura. E por isso, na medida em que a maior parte do que está em causa quando se fala em "reformas estruturais" são medidas que tendem a pressionar os salários em baixa, estas medidas são na verdade contraproducentes do ponto de vista macroecónomico, pois os baixos salários e a desigualdade do rendimento são, a par do endividamento acumulado, os principais factores que constrangem actualmente a procura.
O expansionismo estéril do BCE
É verdade, porém, que a estratégia de combate à crise dos líderes europeus não assenta exclusivamente no lado da oferta, apostando também no incentivo à procura através do recurso à política monetária expansionista. A ideia, como vem nos manuais, é reduzir o preço do crédito de modo a estimular o investimento, o emprego e o crescimento económico, e isso é feito quer de modo convencional (redução das taxas de juro directoras, que estão já em 0,25%) quer de modo não-convencional (LTRO, OMT e outras formas de cedência de liquidez aos bancos).
O problema - e esse não vem na maior parte dos manuais - é que o mecanismo de transmissão da política monetária assenta na hipótese de uma relação estável entre a base monetária e a oferta de moeda... e essa relação supostamente estável simplesmente deixou de se verificar nos últimos anos, se é que alguma vez foi mais do que uma ilusão em termos do sentido da causalidade. Entre 2010 e 2012, por exemplo, o BCE quase duplicou a base monetária da zona Euro, mas nem por isso a oferta total de moeda (que na sua maioria é constituída por depósitos bancários, criados através dos empréstimos concedidos) sofreu alguma alteração significativa. Neste tipo de contexto, inundar o sistema bancário com liquidez adicional não se traduz em empréstimos à actividade produtiva porque, lá está, a procura encontra-se constrangida, pelo que as oportunidades de investimento lucrativas são escassas. A oferta de moeda não é verdadeiramente controlada pelas autoridades monetárias mas sim, em última instância, endogenamente constrangida pela procura. A liquidez adicional injectada no sistema bancário tende a permanecer inerte no próprio sistema, a ser eliminada (através da respectiva devolução ao BCE) ou, em alternativa, a alimentar a formação de bolhas especulativas como aquelas a que temos assistido em sucessivos mercados nos últimos anos: habitação, matérias-primas, derivados de produtos alimentares ou, a mais recente de todas, dívida soberana da zona Euro.
Realidade e fantasia
Para restaurar duradouramente o emprego e o crescimento na zona Euro, seria necessário algo muito diferente do que é permitido pelo actual contexto político-institucional: um nível de inflação que permitisse eliminar gradualmente o fardo do endividamento privado e público; uma política de rendimentos que restaurasse o dinamismo da procura por via do aumento sustentado dos salários reais; e uma verdadeira articulação entre as políticas orçamental e monetária. Como o que temos são "reformas estruturais" e uma política monetária condenada à impotência, bem podemos continuar a pedir crescimento, emprego... e já agora um unicórnio.
Haverá problemas que possam atribuir-se à Europa ou à zona euro, mas o qye tenho por seguro é que há problemas em Portugal que só a Portugal dizem respeito e que só podem ser resolvidos pelos indígenas.
ResponderEliminarE são tantos e tão graves e tão evidentes que invocar a Europa para os soluconar é tão só o meio de os ignorar.
Por falar em unicórnios:
ResponderEliminar... nível de inflação que permitisse eliminar gradualmente o fardo do endividamento privado e público ... aumento sustentado dos salários reais ...
Tudo na mesma frase !!
Se recuarmos até ás mais antigas filosofias vemos que em comum têm uma mesma conclusão:
ResponderEliminaro nível de evolução de uma sociedade
mede-se pelo tamanho da classe média, quanto maior,maior a distribuição de poder.
Ou muito me engano na minha simples opinião ou estas políticas estão a ir precisamente na direcção contrária, mais irónico que isto só mesmo rever o filme METROPOLIS De Fritz Lang, que me 1927 fez um retrato fiel do que hoje é a Europa.
Também com isto não vamos entrar em esquizofrenias de "brothers and sisters" mas os países do topo percebam que só com uma Europa toda forte é que isto é um projecto viável.
Problemas que Portugal tem e que lhe são peculiares:coelho,portas, cristas, cavaco, dias loureiro, os corrécios...
ResponderEliminarMais uma caterva idêntica de catrogas, de mendes, de oliveiras e costa, de duartes lima, de jonets, de pires de lima...
De
«um nível de inflação que permitisse eliminar gradualmente o fardo do endividamento privado e público; uma política de rendimentos que restaurasse o dinamismo da procura por via do aumento sustentado dos salários reais;» O Anónimo das 23.02 citou mal as duas frases, e não uma. É a política de rendimentos que tem que garantir os salários reais; não há nenhuma contradição com desejar um nível de inflação mais elevado....
ResponderEliminarAo contrário do que diz o Zéquinha das 22,49 do dia 8/6, os grandes problemas de Portugal( como bem diz o anónimo de 9/6/ 00:29) são os fulanos que ele indica e outros tantos semelhantes áqueles.
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