O défice orçamental e o défice externo rondavam os 10% do Produto Interno Bruto [2010]. A crise financeira expôs os desequilíbrios da economia portuguesa, não os criou.
Maria Luís Albuquerque, apresentação do OE-2014
Vamos por partes. A crise financeira “criou” o défice orçamental, variável endógena, como se vê, já que, em 2007, o défice orçamental era de 3,2% do PIB, tendo subido para 3,7%, em 2008, e para 10,2%, em 2009. Isto foi sobretudo o resultado do colapso das receitas fiscais (6,1 mil milhões dos 8,9 mil milhões de euros de crescimento do défice, entre 2008 e 2009, por exemplo), devido à crise, bem como do aumento automático da despesa e da ajuda à banca e muito menos o resultado de qualquer estimulo discricionário (pouco mais de 800 milhões). O que é facto é que, graças aos chamados estabilizadores automáticos, a economia já estava a crescer em 2010. A dívida pública, que era de 68% do PIB, em 2008, está agora mais próxima de duplicar, em percentagem do PIB, do que outra coisa, graças à dinâmica recessiva e à diferença imparável desta com a dinâmica dos juros. A dívida tinha passado de 51% para 68% do PIB nos primeiros anos do novo milénio, marcados pela estagnação e austeridade latente, antes da crise internacional e da austeridade aberta provocarem danos ainda maiores.
O problema dos défices externos não foi de facto criado pela crise financeira, mas foi criado pela adesão à UEM, instituição que serve para justificar todos os sacrifícios, pela inserção dependente e pelo perfil de especialização que cristalizou, pela perda de instrumentos de política – cambial e industrial, por exemplo – que acarretou. De resto, a dívida externa liquida, medida pela posição de investimento internacional, residual até meados da década de noventa, andava pelos 110% do PIB, em 2010 e 2011, para subir para 120%, em 2013.
Desequilíbrios há muitos e não podem ser confundidos, mas as suas causas comuns fundamentais encontram-se no enquadramento externo que as elites criaram para a nossa economia. De resto, creio que este livro pode ajudar a desmontar a narrativa dos credores e do seu governo.
O verdadeiro PORQUÊ da «crise financeira:
ResponderEliminarFernando Madrinha - Jornal Expresso de 1/9/2007:
[...] "Não obstante, os bancos continuarão a engordar escandalosamente porque, afinal, todo o país, pessoas e empresas, trabalham para eles. [...] os poderes do Estado cedem cada vez mais espaço a poderes ocultos ou, em qualquer caso, não sujeitos ao escrutínio eleitoral. E dizem-nos que o poder do dinheiro concentrado nas mãos de uns poucos é cada vez mais absoluto e opressor. A ponto de os próprios partidos políticos e os governos que deles emergem se tornarem suspeitos de agir, não em obediência ao interesse comum, mas a soldo de quem lhes paga as campanhas eleitorais." [...]
Paulo Morais, professor universitário - Correio da Manhã – 19/6/2012
[...] "Estas situações de favorecimento ao sector financeiro só são possíveis porque os banqueiros dominam a vida política em Portugal. É da banca privada que saem muitos dos destacados políticos, ministros e deputados. E é também nos bancos que se asilam muitos ex-políticos." [...]
[...] "Com estas artimanhas, os banqueiros dominam a vida política, garantem cumplicidade de governos, neutralizam a regulação. Têm o caminho livre para sugar os parcos recursos que restam. Já não são banqueiros, parecem gangsters, ou seja, banksters."
[...]
Os aumentos de impostos que nos martirizam e destroem a economia têm como maiores beneficiários os agiotas que contrataram empréstimos com o estado português. Todos os anos, quase dez por cento do orçamento, mais de sete mil milhões de euros, destina-se a pagar juros de dívida pública.
Ainda no tempo de Sócrates, e para alimentar as suas megalomanias, o estado financiava-se a taxas usurárias de seis e sete por cento. A banca nacional e internacional beneficiava desse mecanismo perverso que consistia em os bancos se financiarem junto do Banco Central Europeu (BCE) a um ou dois por cento para depois emprestarem ao estado português a seis.
Foi este sistema que levou as finanças à bancarrota e obrigou à intervenção externa, com assinatura do acordo com a troika, composta pelo BCE, FMI e União Europeia. [...] Mas o que o estado então assinou foi um verdadeiro contrato de vassalagem que apenas garantia austeridade. Assim, assegurou-se a continuidade dos negócios agiotas com a dívida, à custa de cortes na saúde, na educação e nos apoios sociais.
[...] A chegada de Passos Coelho ao poder não rompeu com esse paradigma. Nem por sombras. O governo optou por nem sequer renegociar os empréstimos agiotas anteriormente contratados; e continua a negociar nova dívida a juros incomportáveis.
Os políticos fizeram juras de amor aos bancos, mas os juros pagámo-los nós bem caro, pela via dum orçamento de estado que está, primordialmente, ao serviço dos verdadeiros senhores feudais da actualidade, os banqueiros."
Miguel Sousa Tavares - Expresso 07/01/2006
«Todos vimos nas faustosas cerimónias de apresentação dos projectos [Ota e o TGV], não apenas os directamente interessados - os empresários de obras públicas, os banqueiros que irão cobrar um terço dos custos em juros dos empréstimos - mas também flutuantes figuras representativas dos principais escritórios da advocacia de negócios de Lisboa. Vai chegar para todos e vai custar caro, muito caro, aos restantes portugueses. E o grande dinheiro agradece e aproveita.»
Caro João Rodrigues, a sua ingenuidade ultrapassa todos os limites...
ResponderEliminarAmigo João Rodrigues:
ResponderEliminarConforme escreveu: até meados da década de noventa o envidamento liquido externo era residual.
Tal significa que a nossa entrada na UE em 1986 não causou endividamento externo acentuado até meados de 90.
Já anteriormente, em 1979 e 1982 (antes da adesão à UE), tivemos de recorrer ao FMI por esgotamento das reservas de divisas. Não tendo sido suficiente o facto de termos moeda própria e algum controlo na circulação de capitais e bens, para evitar o recurso ao FMI naqueles anos.
Por isto, talvez a UE e o Euro não tenham o grau de culpa que os ladrões de bicicletas lhe atribuem no crescimento (a partir de meados de 90) do endividamento externo liquido da economia Tuga.
Pelo contrário, talvez outros factores tenham sido muito mais importantes, a saber:
a) crescimento exponencial da concorrência externa, derivada da queda do muro de Berlim e do progressivo acesso da China (e outros emergentes) aos mercados Europeus;
b) o aumento do preço medio do barril de petroleo: de menos de 20USD nos anos 90, para mais de 100USD actualmente (sendo que o petroleo tem um peso grande nas n/importações) - bem como o aumento do preço das materias primas em geral;
c) a revolução tecnológica dos anos 90, que originou uma série de novos produtos importados (ligados à informática/electronica/novas tecnologias).
Por conseguinte: será assim tão linear pressupor que se tivessemos o escudo e estivessemos fora da UE não teríamos Troika? quando com concorrencia externa muito mais fraca, em 79 e 82, tal não foi suficiente.
Mais, será que, com o grau actual da concorrência externa nos n/produtos tradicionais, a saida do euro seguida da desvalorização do novo escudinho terá assim tão impacto no crescimento das exportações? - note-se que em 2008 as nossas exportações tinham em média 40% aprox. de incorporação de produtos importados.
O comentário do Anónimo acima é muito avisado.
ResponderEliminarAcusa-se o Euro de todos os nossos males. Pedro Arroja, um economista de direita, diz que devíamos até sair da UE. Mas o tempo não volta para trás, e as receitas económicas que deram resultado outrora (as propagandeadas por Pedro Arroja ou por João Ferreira do Amaral, um economista de esquerda) não são forçosamente as adequadas no presente. Porque os problemas presentes são outros, nomeadamente os três que o Anónimo enuncia.
"A crise financeira “criou” o défice orçamental ..."
ResponderEliminarQual foi a crise financeira específica que criou TODOS os défices orçamentais registados desde 1974?
Concordo com a explicação do défice externo; não compreendo como é que continua a avaliar os défices públicos pré-crise sem levar em conta a enorme desorçamentação que existia (PPPs, EPs, etc.) e que agora está a cair (às prestações) em cima da dívida pública.
ResponderEliminarMas porque é que este (des)governo português não faz como a Grécia fez hoje(finalmente.!!!!!!!) negando categoricamente á troika cortes suplementares em 2014.? Vale mais tarde do que nunca.
ResponderEliminarAté que enfim que o governo grego adquiriu alguma da muita dignidade já perdida.!
Infelizmente nós já não poderemos dizer o mesmo do (des)governo deste (pobre) país, que continua impunemente - com a concordância colaboracionista dos economistas de e da miséria, Passos Coelho, Vitor Gaspar,César das Neves, Maria L Albuquerque, etc - a afundar o país e o seu povo.
A história há-de lembrá-los como a pior coisa que este país já produziu. Delinquentes destes como alguém bem disse, depois de serem corridos nem que seja a pontapé, devem ser julgados, tantos e tão graves são as consequências dos seus actos contra o povo português.
O fmi em Portugal em 78 e 83 terá sido resultado do prec e da convulsão revolucionária que baralhou por completo a economia tuga que passou do corporativismo ao comunismo e do comunismo ao socialismo liberal de mercado em poucos meses.
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