terça-feira, 10 de setembro de 2013

Mitos do cheque-ensino: «o monopólio da oferta estatal» (I)

A ideia de que existe uma hegemonia absoluta da oferta pública em educação é um dos argumentos recorrentemente utilizados pelos defensores do cheque-ensino. De facto, parece ser mais fácil fazer passar um camelo pelo buraco de uma agulha que encontrar, entre nós, um arauto dos interesses privados em educação que ceda à tentação de sugerir, enganosamente, que o Estado tem o monopólio absoluto da oferta educativa.

No Público de ontem, por exemplo, com a falsa candura a que já há muito nos habituou, João Carlos Espada referiu-se uma vez mais ao «monopólio estatal sobre a sociedade civil», para de seguida deixar no ar a ideia de que os serviços educativos não devem continuar a ser «fornecidos universalmente pelo Estado». E, numa linha muito semelhante, o ministro Nuno Crato sustentou, na semana passada, que o novo acordo com o Ensino Particular e Cooperativo tem em vista, entre outros aspectos, abandonar a «preponderância absoluta do papel do Estado». Quem os oiça falar fica pois com a sensação que o Estado tem em Portugal um peso esmagador, asfixiando a existência do ensino privado, quase como se este estivesse interdito a quem o queira frequentar.

Nada mais falso. De acordo com dados do Eurostat, Portugal é não só um dos países europeus (UE15) com maior peso relativo do ensino privado em termos de número de alunos (sendo apenas antecedido pela Bélgica, Espanha e Reino Unido), como esse peso percentual tem vindo a aumentar ao longo da última década (passando de 16% em 2000 para 21% em 2011), contrariando assim a variação - no mesmo período - observada à escala da União Europeia (UE27), de 18% para 17%. Aliás, se considerarmos o alargamento a Leste, a divergência comparativa de Portugal - no que respeita ao peso do ensino privado - torna-se ainda mais expressiva (uma vez que nestes países o sector privado de educação representa, em média, apenas cerca de 5% do total de alunos).

Fomo-nos habituando, desde há muito - e graças a uma persistente campanha que encontra eco fácil na comunicação social - à ideia de que o Estado Social é, entre nós, desmesurado (e até «gordo», dizem). E é a partir dessa ideia que se procura fazer vingar uma outra: a de que o nosso atraso se prende com esse «peso excessivo» do Estado, como se os grandes progressos feitos pelo país nas últimas décadas, em matéria de educação, não se lhe devessem. É destas duas ideias, entre outras, de que se alimenta a ideologia fraudulenta do cheque-ensino.

12 comentários:

  1. Carissimo,

    Sou totalmente a favor do cheque ensino, na sua generalidade. Penso que ainda falta esclarecer vários pormenores da implementação deste projecto.
    Sou a favor por nenhuma das razões que apresentou no seu comentário. Sou a favor porque acredito na livre escolha e concorrência entre os sistemas.
    Sou a favor porque acredito que os melhores avaliadores da qualidade dos serviços são os próprios utilizadores (neste caso os encarregados de educação).
    Com o cheque ensino, passam os verdadeiramente interessados a poder manifestar a sua opinião sobre o funcionamento dos serviços.

    Não entendo o medo de tanta gente com este tipo de projectos. Há dúvidas de que a maioria dos alunos vão continuar no ensino público?
    Haja coragem para criar uma escola verdadeiramente diferenciada, tornando-se uma real mais-valia para os alunos.

    Não sou contra ou a favor do Estado. Sou a favor do melhor serviço possível, seja ele oferecido por estado ou privado.

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  2. "Sou a favor porque acredito na livre escolha e concorrência entre os sistemas."

    Pois, mais ou menos como as criancas acreditam no Pai Natal...

    "Há dúvidas de que a maioria dos alunos vão continuar no ensino público?"

    Ha, muitas e fundadas duvidas.

    "Haja coragem para criar uma escola verdadeiramente diferenciada, tornando-se uma real mais-valia para os alunos."

    E eis, enfim, o sumo desta salada putrida: "escola verdadeiramente diferenciada" isto, uma escola para ricos e outra para os pobres.
    Desprezivel portanto.

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  3. A favor do Ensino Público Universal e Gratuito! O cheque-ensino vai somente piorar as condições de sobrevivência do Ensino Público, e a prazo representa a sua Morte anunciada.

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  4. Só para esclarecer, uma coisa que ainda nao percebi: de que forma é que a Escola Pública representa concorrência desleal para com o sistema privado, quando competem em dois campeonatos diferentes?

    Ja agora, em nome da concorrência leal, perderao as Escolas Privadas o direito a escolherem os seus alunos, tendo de aceitar todos os que lá vao parar e criar as famosas turmas de 30 (e tal?) alunos? E quanto às pedagogias, estarao as escolas privadas sujeitas também a cada invençao "pedatrêtica" que emana dos iluminados ministeriais?

    Depois de respondermos a estas, e outras, poderemos falar do cheque ensino. Ah, isso e da troika, no memorando original, dizer que se devia diminuir, com tendência a acabar, as transferências do Estado para as escolas particulares. Deve ser do "ir para lá da troika"...

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  5. Gostaria de saber (se tal for possível) qual a percentagem de alunos cuja frequência em escolas privadas é paga/apoiada/subsidiada, total ou parcialmente, por dinheiros públicos, independentemente da sua forma (do dinheiro “seguir” o aluno ou ser direcionado diretamente para a escola). Este pedido/pergunta dirige-se quer aos números portugueses quer aos dos outros países analisados no primeiro gráfico.
    Obrigado
    António

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  6. Caro António,
    As estatísticas do Eurostat não permitem tirar grandes conclusões nessa matéria (volume de apoios ao ensino privado por país), uma vez que apenas contabilizam os alunos a frequentar escolas com algum tipo de apoio do Estado (o que pode ir desde o pagamento integral da frequência a ajudas de natureza mais simbólica).
    Feita esta ressalva, pode contudo dizer-se que em 14 dos 27 países membros (tratando-se sobretudo neste caso de países de Leste) não existe qualquer espécie de apoio ou esse apoio é manifestamente residual, (na ordem dos 1%). E em 7 países membros, todos os alunos que frequentam o ensino privado têm um qualquer apoio do Estado.
    O que quer dizer que Portugal se encontra num grupo intermédio, de países (6) em que apenas parte dos alunos do ensino privado recebem apoio do Estado. No caso de Portugal o número de alunos do privado que têm apoio público ronda os 9% (sendo a média da UE27 de cerca de 13%).

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  7. Queria agradecer os esclarecimentos prestados.

    Cumprimentos

    António

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  8. Acho muito importante esclarecer, mais ainda do que comparar Portugal com outros Países (porque estamos quase sempre a comparar realidades parcelares, não a realidade global, que nem sempre é comparável), que o custo por Aluno para o Estado português, é SUPERIOR no Ensino Privado face ao Ensino Público! Será que o António não pediu também este esclarecimento?

    Perante isto, pergunto a quem, ingénua ou perversamente, defende o chamado "cheque-Ensino" se também defende um "cheque-Saúde", um "cheque-Justiça", um "cheque-Segurança", ou até um "cheque-Finanças", para em nome da santa Liberdade individual (do raposão no galinheiro) poder livremente prescindir, respectivamente, de recorrer aos Centros de Saúde e Hospitais públicos, aos serviços dos Tribunais, às autoridades policiais e, finalmente, às próprias vias públicas e "fornecer-se", exclusivamente, no mercado dos serviços privados.

    Isso é que era bom, não era?

    Já existiu, noutros tempos! Chamava-se Feudalismo. Muito giro...

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  9. Eu nao sou a favor de cheque de ensino por duas razões, quem tiver unhas que toque guitarra, segundo, o cheque de ensino e o meio para acabar com o ensino publico, nao temos dinheiro para comer quanto mais para pagar os estudos básicos aos filhos, íamos continuar de sermos ricos &pobres.Parou com os ladroes, basta,as criticas que aqui se lê nao tem sentido algum, pois quem assim escreve já nao tem problemas financeiros e era mais uma ajuda como sempre a quem pode como sempre este governo nos tem amostrado como deseja.

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  10. Caro Nuno Serra,

    No seu comentário de "12 de Setembro de 2013 às 02:20", indica que em média, a UE27 apoia MAIS 4% dos alunos a estudar no privado do que o estado Português.
    Este seu comentário é bastante pertinente pelo que pergunto se pode disponibilizar a curva temporal deste tipo de apoio (Portugal vs UE27), independentemente do valor a que são financiados, apesar de sabermos que só 2,7% destes alunos são financiados a 100% pelo estado (contratos de associação).

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  11. Caro Paulo Lopes,
    O Eurostat só permite fazer comparações temporais nesta matéria a partir de 2004. As tendências são as seguintes: entre 2004 e 2008, a percentagem de alunos do privado com apoio estatal passa de 15 para 10% na UE e mentém-se entre 3 e 4% em Portugal. A partir de 2008 verifica-se uma subida de 10 para 13% (2011) na UE e de 3 para 9% em Portugal.

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  12. A retórica fraudulenta das pessoas contra o cheque ensino resume-se a agoirar q o ensino deixaria de ser gratuito para os pobres ( pesquisem o q cheque ensino significa) e que irá levar ao fim do ensino público. Ambos os argumentos são falsos e até desonestos por parte de quem os usa e está minimamente informado sobre o assunto. Eu sonho c o dia em que o debate político em Portugal vá por um rumo mais racional e deixe de estar inundado por ideologias como "tudo tem de ser do estado" ou "tudo tem de ser privado"

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