Imaginem uma economia capitalista envelhecida e estagnada vai para duas décadas, com uma dívida pública que ultrapassa 200% do PIB, causada pela tal estagnação, uma deflação enraizada e uma banca “zombie”. Portugal, 2020? Não. Japão, 2012. Que fazer? Não ligar à sabedoria convencional aplicada ao longo das últimas décadas e usar a soberania monetária, o facto de o endividamento ser numa moeda controlada pelo Banco Central, e colocar nesta instituição um governador de confiança, ao serviço da estratégia do governo, capaz de mobilizar o financiamento monetário para tentar garantir que a deflação é superada, no quadro de um significativo programa governamental de investimento público, garantindo, ao mesmo tempo, uma sempre útil desvalorização cambial. O resultado? Um crescimento anualizado de 3,5% no último trimestre no Japão. Desgraçadamente, é a direita nacionalista, liderada por Shinzō Abe, que está a adoptar uma política económica heterodoxa que funciona. Não é a primeira vez que tal acontece.
Entretanto, a esquerda europeia maioritária, por exemplo em França, está reduzida, graças ao euro e ao declínio económico e político por este gerado, a cada vez mais impotentes discursos sobre o governo económico europeu. A única coisa que me dá esperança é saber que um pouco por todo o lado, e em Portugal também, a ideologia do globalismo e suas potentes declinações europeias, o culto da impotência do Estado e do seu decisivo favorecimento pelo “colete-de-forças dourado” de um sistema cambial rígido, pode estar em quebra à esquerda.
De resto, neste país, a esquerda tem condições únicas para monopolizar com realismo a bandeira da recuperação de margem de manobra soberana no campo económico, monetário e não só, dando-lhe um cunho progressista, em defesa do emprego, das liberdades e legitimidade democráticas e da expansão igualitária das capacidades individuais, graças a um Estado social que não pode ser preservado com estes constrangimentos externos. Contra as amalgamas em que muitos globalistas se especializaram, esta é aliás a diferença crucial na economia política e moral face a uma direita nacionalista que, reconhecendo também, como Karl Polanyi afirmou na sua comparação entre socialismo e fascismo, a “realidade da sociedade” e do poder de Estado, está disposta a sacrificar as liberdades e a sua igualização perante este reconhecimento.
Oportunidades capazes há muitas....faltam pessoas capazes.
ResponderEliminarComentário ao comentário 1 (ñ ao texto): "vai dar banho ao cão".
ResponderEliminarCaro J. Rodrigues, o Japão acumula décadas de excedentes comerciais (apesar dos recentes e excepcionalíssimos meses de deficit), uma posição primeira de credor líquido internacional, poupança que excede vezes mais o produto. Teve anos de políticas punitivas ao retorno de capitais investidos no exterior. O mais próximo, do mundo industrializado, que se conhece será a Alemanha. Nestas circunstancias permite-se tudo!!
ResponderEliminarPor fim, a política heterodoxa a que se refere, no Japão, estou em crer, será ali a mais ortodoxa de sempre!! E sempre, ali, pela mão da tal direita nacionalista!!