O governo conseguiu impor no país o debate sobre a reforma do Estado social, e nos termos que lhe interessava. Numa economia em recessão, com as receitas fiscais a cair, as despesas sociais a aumentar e com elevados encargos anuais com o serviço da dívida, torna-se cada vez mais difícil o financiamento das funções sociais do Estado. A austeridade mingou a capacidade da nossa economia de criar riqueza e agora a solução que apresentam é mingar o Estado social até ele caber nessa economia encolhida. Acontece que o corte nas despesas sociais não é menos austeridade. Se os portugueses pagarem mais no acesso aos serviços públicos vão ter menos rendimento disponível. Assim, uma reforma como a que o governo e o FMI querem fazer em vez de tornar o Estado social – que sobreviver aos cortes – sustentável só vai agravar a espiral recessiva, destruir mais economia e obrigar a ainda mais cortes no futuro. É uma corrida descontrolada para o fundo. Uma economia estrangulada pela austeridade e pelo peso da dívida não consegue crescer nem garantir o financiamento das funções sociais do Estado.
São infelizmente poucos os políticos com a coragem necessária para confrontar os problemas com a verdade e para assumir posições com clareza. Foi o que fez Ferro Rodrigues nas jornadas parlamentares do Partido Socialista e Correia de Campos na sua crónica semanal no jornal “Público”. O primeiro defendeu a necessidade de “uma unidade nacional muito forte” para “renegociar com a troika e se necessário incluir nessa renegociação alguma reestruturação dos valores e dos prazos da dívida”. O segundo argumentou a favor da adopção pelo governo português de uma política de firmeza nas negociações com a troika. Como escreveu Correia de Campos: “Os nossos parceiros só conhecem a linguagem do lucro e da força; têm de passar a conhecer a da sobrevivência colectiva. Os credores só nos prestarão atenção caso os ameacemos com a ruptura.”
(crónica publicada às quartas-feiras no jornal i)
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