quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O que aprendemos com a grande recessão?

A edição de hoje do Jornal de Negócios (pela mão do jornalista Pedro Romano), sintetiza em 10 pontos o que a grande recessão que hoje vivemos nos ensina.

Analisando esses pontos um por um, não é difícil identificar momentos vários em que a mesma mensagem - por essas ou outras palavras - foi transmitida neste blog (antes e depois da falência do Lehman Brothers).

Ficam aqui as 10 lições (entre parêntesis, a minha interpretação das mesmas e das suas implicações):

1. Os bancos centrais não podem olhar só para a inflação. (Em particular, não é sustentável que o BCE continue a sobrepôr o controlo do aumento dos preços a outros objectivos de política económica, desde logo o crescimento e o emprego).

2. A eficácia da política monetária tem limites. (Não é possível esperar que uma UE sem instrumentos orçamentais de curto-prazo - leia-se, um orçamento europeu significativo - seja capaz de responder eficazmente às crises, muito menos a choques que afectam assimetricamente as economias dos países membros.)

3. Não há consolidações orçamentais expansionistas. (Ou, como costuma dizer Krugman, a fada da confiança não existe. Promover a austeridade para resolver a crise só a agrava.)

4. A moeda única não acaba com os problemas do défice externo. (Ao contrário dos defensores incondicionais de Maastricht afirmavam, o euro não diminui - pelo contrário, acentua - as diferenças entre as estruturas das economias participantes, tornando-as mais claramente distintas ao olhos dos especuladores financeiros. O resultado deste euro não é, como se vê, maior estabilidade financeira na Europa.)

5. O controlo de capitais até pode ser útil. (Neste blog fomos mais além. Sempre afirmámos que a circulação irrestrita de capitais acentuava a instabilidade, penalizava o investimento produtivo e favorecia a desigualdade social. O FMI andou décadas a afirmar o contrário. parece que agora vai mudando de opinião.)

6. O mundo não ficou mais seguro com a inovação financeira. (Nem tudo o que é inovador e moderno é bom. Aprendemos isto a custo.)

7. É necessária mais regulação da banca. (Regressar à regulação que existia nos anos 80, antes da Terceira Via de Clinton e Blair ter aderido irresponsavelmente ao mito dos mercados eficientes, já seria um passo na direcção certa. Mas é preciso muito mais - é preciso reduzir o peso que o sector financeiro tem nas economias. Até lá, só podemos esperar mais do mesmo.)

8. Os modelos económicos têm muito a melhorar. (Apesar de a sobranceria dos economistas que vivem de modelos formais ser hoje menos pronunciada do que já foi, continua-se a dar mais importância aos resultados dos modelos do que à sensibilidade das conclusões face às hipóteses incorporadas nos mesmos. A realidade será sempre mais complexa do que os modelos podem capturar. Quem passa a sua vida a brincar acriticamente com uma espécie de 'Jogo das Contas de Vidro' está condenado - tal como os geniais mestres descritos no livro de Hermann Hesse - a ser um completo ignorante acerca das coisas do mundo secular. E a conduzir o mundo para as consequências desastrosas das suas folias.)

9. Os mercados têm desejos estranhos. (Grande parte dos economistas continua a ter dificuldade em viver com a noção de que as pequenas racionalidades individuais não conduzem forçosamente a racionalidades colectivas. E que a informação dispersa por uma miríade de actores não é necessariamente de melhor qualidade do que a informação que está disponível para todos ao mesmo tempo. É por isso que o 'livre funcionamento dos mercados' não pode ser o alfa e o ómega dos sistemas sociais.)

10. O mundo que nos rodeia é mais rápido do que pensamos. (Ou, como alguém dizia há mais tempo, tudo o que é sólido dissolve-se no ar. A história não acabou. Mas não vale a pena pensarmos que a sua evolução tem um sentido único.)

2 comentários:

  1. Uma compilação esclarecedora, mas o título não pode estar no passado, uma vez que a realidade não traduz qualquer aprendizagem por parte de quem governa.

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  2. Relativamente a "reduzir o peso que o sector financeiro tem nas economias" é facílimo: é obrigar os bancos a emprestar apenas e só o que têm em depósito, em vez dos 190% do que têm de depósitos como actualmente acontece.

    Foi esse disparar que criou a "inovaçäo financeira" que criou o aumento enooooooooorme do PIB de 1990-2008 (vede Irlanda). Claro que como virtual que é, desfez-se no ar.

    Ui, mas qualquer reduçäo nesse sentido acarreta reduçäo do PIB. Logo o primordial é começar por mandar o PIB como indicador de progresso às couves...

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