A campanha que alimenta o mito do «Estado gordo» prossegue o seu curso. Um episódio eloquente teve ontem lugar em horário nobre, no primeiro canal da televisão pública. Contou com a prestimosa colaboração da Pordata, presidido por António Barreto, que assim abençoa a causa. Em análise, a evolução das receitas do Estado nas últimas décadas, para concluir que «os portugueses pagam hoje três vezes mais impostos do que há trinta anos».
O problema são as contas. Ou melhor, as opções na hora de fazer as contas. Quando é grande a ânsia de propagar a ideia de que o Estado é um sorvedouro inútil de recursos torna-se tudo muito simples: divide-se a receita total pela população residente e já está. Como se as empresas (cujo número triplica entre 1990 e 2009) não pagassem, entre outros impostos, IRC e IVA. Como se a existência de um acréscimo de receitas não constituisse, por si só, um reflexo claro do aumento do emprego (mais trezentos mil postos de trabalho) e do aumento dos salários ao longo do mesmo período. Como se, enfim, o dinamismo económico do país e as condições de vida fossem os mesmos de há vinte ou trinta anos atrás, tendo simplesmente aumentado a suposta gula insaciável do Estado. Aliás, o assunto foi apresentado como se o Estado fosse um simples escoadouro de dinheiro. Como se, por exemplo, a generalização do acesso à educação e à saúde, a histórica quebra das taxas de mortalidade infantil e de analfabetismo tivessem, ao longo destes anos, caído do céu.
Os dados do gráfico aqui ao lado (clicar para ampliar) foram extraídos da insuspeita Pordata. Uma das séries estabelece o valor das receitas do Estado per capita e a outra o seu significado em percentagem do PIB (o que permite relacionar mais adequadamente a economia no seu todo com a carga fiscal). O contraste é evidente: as receitas do Estado ponderadas pela população formam a linha ascendente de que os detractores do Estado gostam. Mas a ponderação das receitas em percentagem do PIB revela - segundo os dados - uma estabilização do peso fiscal a partir dos anos noventa. E sublinhe-se, já agora, que estamos abaixo da média da OCDE nesta matéria.
Esclareça-me,pff, a origem dos dados desse grafico.
ResponderEliminarConcretamente aos valores da "receita per capita". Qual a sua fundamentação?
obv: 15000 quê? creio nao bater certo com qq valor de receitas do estado q corresponda a +-20%pib
obg
É só "puxar pela cabeça". Este é o nível dos especialistas em economia(s) nos ladrões de bicicletas.
ResponderEliminarDesde IVA pago pelas empresas a um valor de receitas a 20% do PIB...É só qualidade. Enfim, um conselho: era melhor para a vossa reputação se se mantivessem estritamente nos charros e demais substâncias do que quando se decidem a fazer comentário económico.
A origem dos dados do gráfico é a que se refere no post: as bases de dados do Pordata (Tema Contas do Estado; Sub-tema Receitas; e Quadros receitas per capita e receitas em % do PIB).
ResponderEliminarQuando é que os telejornais vão começar a dar informações imparciais?
ResponderEliminarIsto é muito triste, porque quem não percebe o suficiente de economia e matemática para perceber o que está em causa(muita gente), está simplesmente a ser enganado. Embora no fim da reportagem a apresentadora diga que contra factos não há argumentos, a verdade é que para além dos factos que apresentam explicitamente, também é apresentado de forma mais ou menos implícita argumentos, que provavelmente levam as pessoas a serem induzidas em erro.( A forma expressiva com que a apresentadora fala dos impostos parece que está a representar! Até parece que é de propósito!
Das duas uma... a jornalista da RTP ou é ignorante ou mal-intencionada.
ResponderEliminar"A origem dos dados do gráfico é a que se refere no post: as bases de dados do Pordata (Tema Contas do Estado; Sub-tema Receitas; e Quadros receitas per capita e receitas em % do PIB)."
ResponderEliminarCertamente que o Nuno Serra, que elaborou o gráfico aqui apresentado,
poderá esclarecer-me qual a fundamentação desses valores,nomeadamente os que dizem respeito às receitas per capita representas a azul no seu gráfico.
cump.
Caro Anónimo,
ResponderEliminarNa verdade não lhe consigo adiantar mais do que a informação que é apresentada no PORDATA e que é, de facto, omissa relativamente às variáveis que inclui no cálculo das receitas do Estado (sugerindo assim que se trata do total de receitas).
Relativamente ao peso no PIB, por exemplo, há uma descoincidência quanto aos dados apresentados na publicação da OCDE (ver link no post), que aponta para um valor mais credível do peso percentual das receitas do Estado no PIB (em torno dos 40%).
Ou seja, os cálculos do PORDATA serão provavelmente omissos quanto a algumas fontes de receita (contribuições para a segurança social?). Mas, se pensarmos que a série é credível na medida em que se constrói sempre a partir do mesmo conjunto de receitas, podemos concluir que o peso da fiscalidade no PIB estabilizou desde o início dos anos noventa. Isso mesmo é sugerido, de resto, pela publicação da OCDE, que apresenta Portugal como um dos países em que a carga fiscal menos aumentou desde 2000, desfazendo portanto o mito do galopar consecutivo do Estado gordo sobre a «economia» (como se o Estado não fosse, também ele, economia).
Cumprimentos
Concretamente na linha a azul, que traduz os dados da PORDATA, os valores resultam da divisão do montante global das receitas do Estado pela população residente. Tal como na linha vermelha, o PORDATA não esclarece que receitas do Estado estão contempladas (nem se estão todas elas contempladas). E presume-se que os valores estejam em preços correntes (sendo que o desenho da linha azul não se modificaria substancialmente se o PORDATA tomasse o valor das receitas em preços constantes)
ResponderEliminarCaro Nuno Serra
ResponderEliminarDuas notas apenas.
1) O que ainda é mais relevante nisto tudo é que a inferência legítima é exactamente a oposta da que é oficialmente propalada.
De facto, quando a ratio impostos/PIB deixou de crescer, e aliás a tendência se inverteu parcialmente (no último período), o PIB deixou também ele mesmo de crescer.
Ou seja, a tentativa de levar à prática o programa neoliberal de "emagrecimento do Estado" - na qual, aspecto importante, PSD, PP e PS estão todos igualmente mancomunados - foi efectivamente catastrófica do ponto de vista da evolução do PIB. Os países mais próperos são, em termos gerais, estatísticos, países em que o Estado é proporcionalmente muito "gordo": é mais "gordo" na Suécia do que em Portugal, mais "gordo" em Portugal do que em Moçambique, etc.
O programa neoliberal "global" é, bem no fundo, o programa da "moçambiquização" do mundo...
2) A desonestidade e a... "magreza" intelectual da generalidade dos nossos comentadores político-culturais e demais intelectuais "orgânico-mediáticos" é um abismo sem fundo - compensado apenas, talvez, pelas alturas a que chega o seu "chico-rolhismo" político. A única coisa sábia a fazer é, por vezes, deixar de todo de ver televisão.
Observação final: este comentário é da minha inteira responsabilidade e, por isso, não vos compromete. Por favor, não o "moderem"...
Senhor 2.º Anónimo:
ResponderEliminar(o que deixou este comentário elucidativo)
«Enfim, um conselho: era melhor para a vossa reputação se se mantivessem estritamente nos charros e demais substâncias do que quando se decidem a fazer comentário económico.»
Foi pena não ter feito este comentário há mais tempo, pois arriscava-se a ser candidato (direi, ganhar mesmo) o Nobel de Economia.
De facto, com uma argumentação económica destas, ficamos todos definitivamente esclarecidos.
"...a histórica quebra das taxas de natalidade..." é um dos nossos maiores dramas!
ResponderEliminarCaro Kruzes Kanhoto, agradeço o reparo. O que se pretendia referir era, obviamente, a histórica quebra da taxa de mortalidade infantil (e não da natalidade). Já corrigi, obrigado.
ResponderEliminarCaro João Carlos Graça, só moderamos insultos gratuitos ou comentários ininteligíveis (o spam encarrega-se do resto). Bem assinalada a relação entre a descida do PIB e o seu impacto na carga fiscal. É todo uma outra leitura, de facto, do lugar e do papel do Estado nas economias e nas sociedades.
Viva!
ResponderEliminarO gráfico azul encontro na pordata em "Estado: receitas per capita" mas a divisão pelo PIB de "PIB e rendimentos" não poderá gerar o vermelho uma vez que o PIB estabilizou (não cresceu mt mais) desde a crise financeira mundial iniciada em 2007.
Podia explicar como chegou lá..
Caro Pedro Reis,
ResponderEliminarEncontrará também na PORDATA a série «receitas fiscais em % do PIB» (em Contas do Estado, Receitas), que o gráfico reproduz.
A estabilização da linha a partir dos anos 90 é compreensível, justamente porque o PIB estabiliza, não se registando ao mesmo tempo uma alteração de vulto na carga fiscal.
Portanto, a conclusão dos ladrões de bicicletas, é de que os impostos em Portugal até nem são muito altos. Chamar a aos nossos impostos medidas de austeridade, é afinal um tremendo exagero...
ResponderEliminarCaro João Rafael,
ResponderEliminarTalvez fosse bom reler melhor o post para não inferir dele o que ele não diz. O facto de o aumento da carga fiscal ser proporcional ao aumento do PIB nada diz sobre se os impostos são baixos ou elevados.
A propósito, então o que é um bom indicador para saber qual o nível de impostos num país? Fico baralhado ( e certamente não serei o único) quando jornalistas defendem uma coisa referindo-se ao nível de impostos por pib per capita ou outros que defendem outra coisa falando em impostos em % do pib... E isto a propósito até do título deste post...porque realmente há tanta informação que invade as pessoas que muitas vezes não têm capacidade/conhecimento para ter uma perspectiva crítica... Obrigado.
ResponderEliminarContra factos, só há argumentos.
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