sexta-feira, 16 de setembro de 2011

O capital da troika

A austeridade fracassou. O que propõe a troika? Austeridade reforçada, mas com a redução dos juros cobrados para tentar aliviar a pressão financeira. Tenta-se desta última forma evitar o destino grego, ao mesmo tempo que se insiste na economia de austeridade que o torna cada dia mais provável. No meio desta flagrante contradição, o “acordo” com a troika, tão celebrado na altura pela brigada do reumático em que se transformou a “elite” económica, política e intelectual nacional dominante, já não vale o papel em que está escrito, não pode comprometer ninguém passado menos de meio ano da sua assinatura, tantas foram as mudanças.

No fundo, confirma-se que pouco se aprendeu com todos os fracassos dos programas de ajustamento estrutural no “Sul global”. Estamos perante instituições que foram desenhadas para não aprenderem. CE, BCE e FMI são instituições políticas com muito poder, mas que prescindem da democracia e dos seus ingredientes – debate e escrutínio públicos, sociedade civil activa, participação e eleição. Por muito fragilizados que estejam, estes mecanismos, de base ainda essencialmente nacional, são a nossa melhor esperança para reconhecer e corrigir os erros colectivos e, elemento crucial deste processo, para que possam emergir e afirmar-se contrapoderes às facções do capital com escala internacional e com toda a influência nestas instituições.

Sem este elemento de economia política, não se compreende o sistemático enviesamento de classe das políticas que são prescritas pelas troikas: da pilhagem dos bens públicos através de ruinosos processos de privatização às políticas regressivas de concorrência internacional pela desvalorização directa e indirecta do trabalho, reduzido a um custo, e pela taxação cada vez mais baseada nos impostos sobre o consumo, os impostos que penalizam mais os que não podem deixar de consumir todo o seu cada dia mais parco rendimento. Os austeritários não precisam de estudos sérios para tomar decisões que afectam a economia política dos países. Precisam apenas de manter o seu poder, tarefa facilitada quando têm à sua frente um governo subalterno, formado por crentes ingénuos no romance de mercado ou por realistas testas de ferro do capitalismo internacional, um governo que exprime a extensão da crise da democracia, a extensão do seu esvaziamento pela ressurgência política de um certo tipo de capital nas duas últimas décadas.

3 comentários:

  1. Caríssimo João Rodrigues,

    Concordo inteiramente com o teor do texto. Na verdade, não parece haver luz ao fundo do túnel com estas políticas de austeridade impostas pela Troika. As democracias estão cada vez mais esvaziadas de poder de participação cívica, como nos diz, com muita lucidez, Boaventura Sousa Santos no seu mais recente ensaio. Este paradigma comunitário esvaziou o poder das democracias e propagou o mirífico caminho neoliberal que extenuou a capacidade de regeneração das próprias economias assentes em bases especulativas.

    Num dos meus últimos "posts" trato desta aberrante crise da democracia: http://cronicasdoprofessorferrao.blogs.sapo.pt/31658.html

    Saudações cordiais, Nuno Sotto Mayor Ferrão
    www.cronicasdoprofessorferrao.blogs.sapo.pt

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  2. A opção da austeridade nunca teve a ver com uma tentativa de salvar a Grécia (ou até Portugal) de um default, mas pelo contrário, colocar o país em condições de efectivamente o 'receber' (no caso, praticar). Mas deixo tal discussão para outra altura.

    Digo desde já que concordo com poucas coisas que são ditas, escritas neste blog. Contudo, tenho alguns amigos que constantemente me referem o mesmo, portanto, acabo por o acompanhar regularmente. Deixo portanto o desafio: o próximo post que seja acerca de quais são as soluções que os senhores acham que deviam ser implementadas ou seguidas (se tal post já foi escrito, peço desde já desculpa, e peço também que me refiram onde o posso ler).

    Melhores cumprimentos.

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  3. Aparentemente, no momento em que escrevia o meu comentário anterior, um novo post era colocado. A forma como esse novo post foi escrito parece responder ao meu desafio, ou seja, colocarem o caminho a seguir. Ou seja, deduzo pelo post "Saída grega" que defendem uma solução semelhante para Portugal, estou correcto?

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