quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Lições heterodoxas

Leiam a vingança do anarquista, por Rui Tavares. A Bélgica está governo? “Sem governo, nos tempos que correm, significa sem austeridade. Não há ninguém para implementar cortes na Bélgica, pois o governo de gestão não o pode fazer. Logo, o orçamento de há dois anos continua a aplicar-se automaticamente, o que dá uma almofada de ar à economia belga.”

Rumemos mais para norte guiados pelas crónicas de um historiador atento à realidade económica internacional: “O resultado é que a Islândia, onde os bancos tinham estourado dez vezes a economia do país, o desemprego decuplicado e a moeda caído sessenta por cento, conseguiu dar a volta à crise com um mínimo de injustiça – e sair por cima.”

É claro que a desvalorização cambial e o controlo de capitais ajudam muito a Islândia a enfrentar os seus problemas. Não se esqueçam que nós também tínhamos estes dois instrumentos aquando da última visita do FMI na década de oitenta, o que também ajudou a explicar a rapidez com que nos livrámos da sua tutela.

Duas lições: a austeridade, neste contexto, não funciona porque transforma os governos no problema; a desvalorização cambial é bem preferível a esta economia política da deflação salarial, necessariamente com muito desemprego misturado com muito esforço para mudar as regras que estruturam as relações laborais, dando mais direitos a patrões, o que só aumenta o abuso e a desigualdade.

A questão central não vai desaparecer: Portugal está amarrado a um euro que é, na ausência de profunda reconfiguração institucional, uma cruz para a maioria dos trabalhadores e para uma facção não negligenciável, ainda que politicamente subalterna, do capital produtivo. Esta última facção pode ter a ilusão de ganhar alguma coisa com trabalhadores mais “disciplinados”, mas perde bastante mais onde, como até o Banco de Portugal reconhece, tudo se decide: no crédito e sobretudo na procura…

2 comentários:

  1. Mais uma liçäo heterodoxa: a Suécia, cuja moeda anda em alta relativamente ao Euro, apresentou o seu orçamento, que é superavitário, e que NÄO inclui cortes no Estado Social. Nem corta nos incentivos à economia.

    O governo sueco é supostamente de direita.

    É a direita que imita a esquerda! Ou o facto de a direita nórdica estar à esquerda da ala central do PS...

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  2. Adoro ver certo tipo de frases tais como: "a desvalorização cambial é bem preferível a esta economia política da deflação salarial" ou dizer que sem desvalorização cambial nunca sairemos da actual situação.

    Antes de mais, dizer que sem desvalorização cambial, nada feito, nunca conseguiremos ser competitivos, é o mesmo que dizer: "amigos, não vale a pena lutar contra o facto de sermos menos produtivos que o norte da europa, nunca vamos conseguir ser como eles, eles são melhores que nós e temos de aceitar tal facto".

    Segundo ponto, uma desvalorização cambial não é assim tão diferente de uma salarial. Uma das principais diferenças é psicológica. Por outro lado, gostaria ainda de ver um estudo (acho no entanto que será muito difícil de fazer) que tentasse estimar os custos que a desvalorização cambial permanente que Portugal usou nos anos 80 e 90 teve no 'afastamento' de capital humano qualificado para outros países. Que teve custos significativos ao nível da capacidade dos portugueses serem 'naturalmente' competitivos é sabido, não sei no entanto, qual foi a quantidade de pessoas qualificadas que se afastaram de Portugal devido a tal política.

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