domingo, 24 de julho de 2011
Práticas democráticas
No seminário organizado pelo CES, o sociólogo norte-americano Robert Fishman, que deu ontem uma interessante entrevista ao Público, apresentou uma síntese do seu mais recente artigo académico sobre os efeitos positivos nas práticas políticas e culturais, onde se incluem importantes igualdades substantivas, das origens revolucionárias da democracia portuguesa, por comparação com a transição espanhola: sempre confiante nas práticas democráticas avançadas e na herança de Abril. Questionei Fishman sobre a elevada desigualdade económica em Portugal, algo superior à registada na sociedade espanhola. Respondeu que esta resulta sobretudo do maior atraso na difusão de oportunidades educativas herdado pela democracia no nosso país. Isto está de acordo com o que me parecem ser duas das variáveis mais importantes para a narrativa progressista de Fishman: a educação e a inovação. No entanto, alguma investigação sobre desigualdades económicas tem assinalado padrões que chamam a atenção para outros elementos, nomeadamente as mudanças institucionais, associadas ao conflito social, que podem contrariar as consequências positivas do investimento na educação. De facto, a queda da desigualdade económica aprofunda-se, no nosso país, logo a seguir à revolução, graças às mudanças progressistas ocorridas nos mais variados campos, da legislação laboral e social ao papel dos sindicatos, mas este processo igualitário é interrompido e revertido pela instituição do neoliberalismo, que ganha fôlego com a economia política do cavaquismo. Os governos do PS nunca puseram em causa o modelo económico herdado, e o seu viés liberalizador e privatizador, mas procuraram de alguma forma conter algumas das suas consequências sociais mais danosas, e aí tiveram sempre apoio à sua esquerda, com modestos efeitos positivos em termos de redução das desigualdades económicas, de acordo com os dados disponíveis. Desde algum tempo que estamos precisamente confrontados com o esgotamento desta estratégia social-liberal de aposta na construção simultânea de uma economia cada vez mais mercadorizada, muito impulsionada pela natureza da integração europeia seguida, e de barreiras, relativamente mais frágeis, que impeçam a instituição de uma sociedade de mercado...
Olhe que não olhe que não
ResponderEliminara queda da desigualdade económica aprofunda-se, no nosso país, logo a seguir à revolução, graças às mudanças progressistas ocorridas nos mais variados campos, da legislação laboral e social ao papel dos sindicatos, mas este processo igualitário é interrompido e revertido....no tempo do Soarismo cavalgante
aumentava-se 30 ou 40 % nos salários e a inflação comia os aumentos
quando havia pessoal que embolsava dezenas de milhares de donas marias
quando o nº de bicos de pato e apartamentos em Paris
crescia e um general ou um meirinho de tribunal
ganhava muito mais em termos comparativos do que antes de 69
e um pedreiro ou um pescador tinham menos poder de compra do que em 69
e estamos a falar de constatações
em 70 ou 73 muita gente podia comprar bife ou pescada umas duas vezes por semana
de 74 a 85 a dieta de sardinha
e de farináceos e massas predominou em muitos bairros operários
e muito pescador levava baldes de peixe como salário...
logo essa percepção que o fosso
se restringiu
só se foi pelo aumento de funcionários públicos
como dizia o extinto Zenha
400 mil mas isto come tudo à conta do estado e não sobra nada para o resto...creio que a citação é de 79
mas não m'abalanço
a memóira anda má
Caro João
ResponderEliminarNo nosso caso, em vez de termos (por analogia com a França) os "portugueses contensiosos", parece-me termos sobretudo os "portugueses arrependidos". A maneira como, depois do 25A e ao longo das décadas, tem sido contada a história do período de 74-75, fez deste sobretudo um período "terrível", quase um período "terrorista", do qual teríamos sido salvos pelos heróis do 25 de Novembro... e depois disso a narrativa já se divide, de facto, com a direita a querer pescar nos salários em atraso do período de Soares, por exemplo...
Mas até Abril de 76, mesmo com a clamorosa incongruência duma constituição pró-socialismo aprovada quase 5 meses depois do 25 de Novembro, a coisa faz quase a unanimidade no "país oficial".
Daí que os portugueses sejam de facto muito mais "mansos" ou "arrependidos" do que alguns estrangeiros ainda possam pensar...
Mas os clichés colados à imagem de cada povo são realmente uma coisa interessante. Antes de 1789, e para dar o exemplo mais notório, os franceses passavam globalmente por "ordeiros", e os ingleses por "desordeiros"... Depois as coisas inverteram-se, claro.
Quanto a educação, note que a visão neo-conservadora já não diz que ela é inútil e o povo mais feliz sem ela, etc., à Salazar. Diz é que ela deve ser "aplicada", com "vias profissionais" e coisas no género... à Guterres, à Durão, à Santana, à Sócrates, à Passos...
Em paralelo temos também, é verdade, o "eduquês". Mas a isso, francamente, já ninguém liga. Já ninguém leva isso a sério, salvo talvez o Nuno Crato... Isso é tipicamente para entreter jogos florais e debates internos à "classe docente"...
Olhe, é um pouco como a econometria no caso dos economistas (veja o post do Alexandre, sff). Isso vale o que vale e só lhe liga quem quer (e depois há um grupo que faz disso métier e raison d'être, sim, claro, mas é uma minoria muito exclusiva).
Para a galeria, o importante é mesmo: educação, sim; cultura geral, não.
Especialização, "empregabilidade", aplicação "prática", etc., isso sim. Tudo o mais é de evitar: torna o pessoal "contensioso", precisamente.
E nós, portugueses, em tempos que já lá vão realmente parece que fomos assim. Mas agora não. Estamos "arrependidos" e aprendemos a ficar muito contentinhos com isso...
Mesmo assim, algum respeitinho pela ortografia, por favor: "contenciosos", portanto, que não "contensiosos".
ResponderEliminar"Se não receio o erro..."