quarta-feira, 16 de março de 2011

«Houston, we have a problem»

Os Censos 2011 já estão em marcha, encontrando-se os respectivos questionários disponíveis na página do INE. No ficheiro relativo ao questionário individual é inquirida a «situação na profissão», determinando-se - com instruções inequívocas (imagem ao lado) - que os falsos recibos verdes serão contabilizados na categoria «Trabalho por conta de outrém».

Ora, o regime legal de prestação de serviços (recibos verdes), caracteriza-se precisamente pelo facto de não pressupor «um local de trabalho fixo dentro de uma empresa», a existência de uma relação de «subordinação hierárquica efectiva» e de um «horário de trabalho definido». Quando estes pressupostos não se verificam em contexto de prestação de serviços por um trabalhador independente (não por acaso assim se designa), estamos perante casos de «falsos recibos verdes», punidos por lei.

Assumindo estas orientações, o INE incorre - como é óbvio - no inaceitável branqueamento estatístico de uma das mais relevantes transformações do mercado de trabalho português das últimas décadas: a precarização das relações contratuais e o recurso manifestamente abusivo aos recibos verdes para suprir necessidades de mão-de-obra que deveriam corresponder, na verdade, a trabalho por conta de outrém. Na perspectiva do objectivo mais elementar que um recenseamento encerra, «conhecer a realidade», não colhe pois o argumento das «recomendações internacionais», com que o INE se procura defender. Interessante seria, justamente para conhecer a dimensão que assume o incontornável fenómeno da precaridade em Portugal, perguntar primeiro «se trabalha a recibos verdes» e, de seguida, indagar a existência de condições passíveis de configurar casos de «falsos recibos verdes».

Mas esta distorção assume um alcance mais vasto, questionando a veracidade da informação estatística que o INE tem vindo a produzir nesta matéria e que tem sido usada para relativizar as razões que levaram à manifestação do passado dia 12. De facto, como poderemos acreditar que os números relativos «ao modo como exerce a profissão» correspondem à realidade, quando é o próprio responsável pelos Censos 2011, Fernando Casimiro, que nos diz que a opção de «conversão» de falsos recibos verdes em trabalho por conta de outrém segue «a tradição que temos utilizado a nível nacional para caracterizar a variável "situação na profissão"»?

16 comentários:

  1. As justificações para este tipo de situações chegam a parecer ofensas à inteligência.

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  2. E depois ainda têm a soberba lata de falar em "recomendaçöes internacionais", como se fosse verdade!
    Em qualquer país civilizado do mundo, quem trabalha em regime de "recibos verdes" é prestador de serviços, e como tal é marcado como "trabalhador por conta própria", que afinal, é o que é, já que é ele que faz os descontos.
    Portugueses, rebaixem-se, que eles väo abusando até vocês escoicinharem. Sempre foi assim, sempre será. Nos países civilizados o povo escoicinha bem mais rapidamente, por isso näo há tanto abuso.

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  3. Aparentemente, a coisa seria de fácil resolução, como propõe Maquiavel.
    Mas torna-se mais complicada quando vemos todos os dias exemplos «desse povo abusado que não escoicinha» a ser o protagonista de todo o tipo de fraudes.
    Hoje os jornais mostram a fraude na agricultura, em que famílias inteiras se declaram agricultoras sem terra para receberem os respectivos subsídios. No Brasil os Sem-Terra reivindicam, precisamente, terra para trabalharem.
    Cá reivindica-se subsídios para terra que se não tem.
    Será que uma solução maquiavélica poria cobro a isto?
    M.H.F.

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  4. O governo não está interessado em que os falsos recibos verdes constem nas estatísticas

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  5. A Máfia está em todos os sectores.
    Seja no Governo, seja na CIP, seja na CAP, seja no INE.
    Por isso o PS vai ficar, sem qualquer dúvida, associado e ser responsável por um dos piores e mais negros periodos da história recente de Portugal.
    Com um partido assim tão mafioso no governo e outro igual na oposição quem é que precisa de inimigos.?

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  6. Caro Manuel, tem toda a razäo!

    Mas soluçäo existe sim.
    Nos tais países onde o povo vai escoicinhando existe essa coisa estranha aos tugas chamada "fiscalizaçäo independente".

    Atentemos, porém, que os abusadores ainda säo uma minoria. Vá lá vá lá. O problema é que depois quem manipula a opiniäo pública faz pensar o contrário, para justificar cortes nas prestaçöes a quem realmente precisa delas!

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  7. O estado sabe quantos 'recibos verdes' e quantos 'trabalhadores por conta de outrem' existem, por via do IRS. Se os falsos recibos verdes responderem num censo que pertencem aos 'trabalhadores por conta de outrem', com uma simples conta de subtrair sabes quanto Falsos Recibos Verdes existem.
    Mas, quem sou eu, que deixei a Matemática no 9 ano, para ter estes pensamentos.

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