terça-feira, 16 de novembro de 2010

Quantitative Easing


“Quantitative Easing” é uma expressão que voltou à actualidade económica depois do Federal Reserve (Banco Central dos EUA) ter anunciado uma nova ronda de utilização deste muito heterodoxo instrumento de política monetária, no montante de 600 mil milhões de dólares (o equivalente a 4% do PIB). Significativo, mas, ainda assim, bastante abaixo dos1 750 milhões de dólares de dívida comprados ao longo de 2009. O “Quantitative Easing” resume-se à compra de activos nos mercados por parte do banco central – aparentemente, esta segunda ronda consistirá na compra de títulos de dívida norte-americanos. O resultado é um reforço da liquidez do sistema financeiro e a criação monetária ex-nihilo.

Pode o simples facto de imprimir moeda ajudar à recuperação económica? Sim, de diferentes formas. Mas primeiro convém fazer uma nota sobre o entendimento da moeda na economia. A teoria convencional, de influência monetarista, entende grosso modo a moeda como variável exógena à economia, manipulada pelo Estado através da quantidade de moeda ou do seu preço, a taxa de juro. A política monetária como forma de estímulo económico estaria sempre condenada ao fracasso no longo prazo: qualquer estímulo no curto prazo traduzir-se-ia em inflação no longo. Outra perspectiva, de raiz pós-keynesiana, entende a moeda como o resultado da procura de crédito. São sobretudo os agentes económicos, através dos bancos, quem cria moeda. Segundo este entendimento, a inflação seria, pelo contrário, o resultado de conflitos em torno da repartição de rendimentos, choques de preços externos e instabilidade das taxas de câmbio.

Seguindo este último entendimento da moeda, na actual situação em que os bancos receiam emprestar às famílias e às empresas, congelando consequentemente os motores do crescimento económico (consumo e investimento), a criação monetária fica aquém das necessidades da economia no processo de crescimento económico, dando origem a uma espiral deflacionária que aumenta o peso relativo das dívidas no PIB. É aqui que entram os Bancos Centrais, que agora se substituem aos bancos privados na criação monetária, na esperança de assim reavivarem a economia. Este parece ser o modelo que está a ser seguido nos EUA e no Reino Unido. Face à impossibilidade política de maiores estímulos orçamentais no primeiro e aos cortes orçamentais no segundo, espera-se que seja a política monetária a constituir o instrumento de estímulo económico.

No entanto, não é certo que resulte. Os preços dos títulos de dívida pública norte americana já caíram a pique, o que torna o fardo dos juros mais baixo e dá ao estado norte-americano alguma folga orçamental. Contudo, as injecções de liquidez num sistema financeiro disfuncional não significarão necessariamente mais crédito às empresas e famílias. Existe o risco dos novos dólares criados servirem apenas para financiar a especulação e a criação de novas bolhas nalguns mercados - com consequências desastrosas, como o Alexandre Abreu já aqui exemplificou. Por outro lado, estas medidas têm um carácter unilateral, sem coordenação internacional, o que pode significar instabilidade cambial acrescida nos próximos tempos.

E a Zona Euro? No actual centro geográfico da crise financeira, onde não existe qualquer política fiscal e onde a política monetária poderia ser um instrumento valioso de intervenção de curto prazo mas não o é, nada disto parece interessar. Ou melhor, aparentemente a UE opõe-se a estas medidas em nome da estabilidade de preços. Medo da chuva, enquanto tem o quintal a arder. E não, o BCE não está a proceder a “quantitative easing” quando compra títulos de dívida, já que essas compras são devidamente “esterilizadas” através de depósitos dos bancos em contas do BCE. Não admira, pois, que depois se discuta a própria sobrevivência da União Europeia.

3 comentários:

  1. "Não admira, pois, que depois se discuta a própria sobrevivência da União Europeia."


    Alertar é discutir?

    Se o médico me alerta o doente para a hipertensão está, com esse alerta, a discutir se acaba com a vida do doente ou não?

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  2. Tanta verborreia em «economês»!

    «O resultado é um reforço da liquidez do sistema financeiro e a criação monetária ex-nihilo»

    Que bonito! Não era mais fácil dizer que o dinheiro é criado a partir do nada?


    «São sobretudo os agentes económicos, através dos bancos, quem cria moeda».

    Não são os agentes económicos, são os bancos quando fazem depósitos à ordem (o maior roubo da História).


    Não se escondam, para explicar aquilo que não compreendem, atrás de gíria «economista», ou melhor, de palavreado de merda.

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  3. Tenho de concordar com o Diogo... :D

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