segunda-feira, 15 de março de 2010

Cá como lá

“Os correios são parte da estrutura da sociedade britânica. Asseguram um serviço universal para todos. Os trabalhadores dos correios chegam a todas as portas, independentemente da riqueza que está para lá delas. Nas suas filas, todos somos cidadãos em igualdade. As empresas de todas as dimensões dependem deles. Para as pessoas idosas, para os deficientes, para os trabalhadores com baixos salários e para os que vivem em comunidades rurais, os seus serviços são indispensáveis. Funcionam bem e podem funcionar melhor se forem modernizados e se forem realizados os investimentos apropriados. Este é o caminho alternativo às várias formas de privatização que o governo propõe. As actuais propostas do governo começariam por partir os serviços postais, reduzir a sua eficiência e resultariam na captura de serviços em função dos lucros e não para benefício de todos. Apelamos ao governo para que abandone os seus planos de privatização do Royal Mail e para que comece a modernizar este valioso serviço público, estabelecendo um autêntico banco popular na sua rede de correios.” [minha apressada tradução]

Keep the post public”, a recente e bem sucedida campanha britânica em defesa de um dos pilares de uma sociedade civilizada. A juntar aos bons argumentos de Agostinho Santos Silva e de Jorge Bateira. Precisamos de todo o conhecimento e de toda a força democrática para nos defendermos da barbárie de novas liberalizações e privatizações, que se segue à crise causada pela barbárie de anteriores liberalizações e privatizações. Estas lutas nunca são puramente defensivas. Até porque há de novo nacionalizações necessárias, entre outras coisas, para proteger a democracia da predação dos grupos económicos.

Deixo algumas referências sobre este assunto da reforma dos sempre elásticos e contestáveis direitos de propriedade e da importância da promoção da participação democrática dos trabalhadores na gestão das empresas públicas: o Nuno Teles tem escrito muito e bem sobre privatizações e nacionalizações: “Privatizações: O Insustentável Peso do Seu Ser” (em co-autoria com Gustavo Toshiaki) ou “Quando nacionalizar é a melhor alternativa”; as conclusões do projecto de investigação europeu sobre os fracos resultados da onda europeia de privatizações das últimas três décadas – Presom – devem ser retidas; os argumentos “clássicos” a favor de um robusto sector empresarial do Estado estão bem sistematizados neste estudo do economista Ha-Joon Chang.

8 comentários:

  1. No fim, tudo se reduz à velha máxima, que nunca é demais repetir: socializam os custos, privatizam os benefícios.

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  2. "Os correios são parte da estrutura da sociedade [britânica]" - Tal como as farmácias
    "Asseguram um serviço universal para todos" - Tal como as farmácias (24 horas por dia/ 7 dias por semana)
    "Os trabalhadores dos correios chegam a todas as portas, independentemente da riqueza que está para lá delas." - As farmácias devem passar a entregar medicamentos porta-a-porta: afinal um medicamento e mais importante que uma carta
    "Nas suas filas, todos somos cidadãos em igualdade." - Tal como nas farmácias
    "Para as pessoas idosas, para os deficientes, para os trabalhadores com baixos salários e para os que vivem em comunidades rurais, os seus serviços são indispensáveis." - Tal como as farmácias
    "Funcionam bem e podem funcionar melhor se forem modernizados e se forem realizados os investimentos apropriados." - Tal como as farmácias já fazem neste momento

    "Este é o caminho alternativo às várias formas de privatização que o governo propõe. As actuais propostas do governo começariam por partir os serviços [postais], reduzir a sua eficiência e resultariam na captura de serviços em função dos lucros e não para benefício de todos."
    Não podemos permitir a privatização das farmácias!!!!!
    Espera lá, as farmácias já são privada. Nacionalizem-se as farmácias!!!!!!!

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  3. Manuel Sebastião, Autoridade da Concorrência (AdC) que tem a seu encargo a regulação deste sector dos mercados, foi ouvido no Parlamento no passado dia nove, sobre as suspeitas de haver cartelização nos preços dos combustíveis, isto é, se as respectivas empresas combinam entre si a fixação de preços de venda, o que poderá acontecer cá dentro e/ou nas empresas internacionais. A regulação dos mercados por entidades ditas independentes é uma das palavras-chave dos adeptos do mercado livre, que defendem não caber aos Estados meter o bedelho nessa questão. Sebastião garantiu que os preços dos combustíveis em Portugal seguem os preços intenacionais. Sobre a cartelização foi claro: «Não dizemos que não exista, mas não detectamos indícios».
    in http://mundodaglobalizacao.globspot.com

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  4. É certo que os CTT aindam prestam esse serviço público na mais recôndita aldeia de Portugal! Os liberais do costume dizem que uma empresa privada tb o fará desde que convencionado com o Estado! Lá vai o Estado pagar!
    Mas, esta privatização estava anunciada. Os sinais estavam todos aí, desde que as estações dos CTT se transformaram numa espécie de briqueabraque onde se encontra desde telemóveis, livros de auto-ajuda e de literatura light, jogos infantis... E em que os funcionários por vezes até fazem promoção dos mesmos sem ninguém lhes ter pedido nada?!?! E há inclusive estações já privatizadas! Isto estava escrito nas estrelas!

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  5. Caro Politikos,
    Quando diz "Lá vai o Estado pagar!" está de facto a dizer "Lá vão os contribuintes pagar!", porque o estado não existe.
    Ora hoje em dia esse serviço é pago, não pelos contribuintes, mas pelos clientes dos CTT, que suportam tarifas que pagam não só o serviço que os CTT lhes prestam, como os que prestam nessas aldeias.
    Se me conseguir explicar em que é que é diferente serem os contribuintes ou os clientes dos CTT a suportar esse sobrecusto, eu perceberei porque considera este tema da privatização dos CTT importante?

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  6. Caro Manuel Vilarinho Pires. Já grafa o Estado com minúsculas, eu, por enquanto, ainda o faço com maiúsculas...
    A resposta à sua questão é sim, claro, são os contribuintes que irão pagar essa factura. Encaixa-se a receita uma vez e no dia seguinte começa-se a pagar renda para todo o sempre... Um negócio e tanto... É mais um monopólio privatizado, como outros... Veremos depois qual será a evolução das tarifas no futuro... A julgar por outros, muito maiores...

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  7. Boa tarde, caro Politikos,
    Creio que misturou nas suas contas duas coisas diferentes:
    1.Por vender a empresa, o estado (os contribuintes) vai "pagar a factura" deixando de receber dividendos resultantes dos seus lucros;
    2.Por conceder à empresa o serviço público, que inclui serviços prestados a tarifa abaixo do custo, o estado vai ter de pagar à empresa uma compensação pelos serviços deficitários.
    Era esta segunda "factura" que estávamos a discutir antes.
    Mas discutamos a primeira também.
    Tem razão ao dizer que é mais um monopólio privatizado, uma empresa que, se não for controlada na política de preços, pode destruir riqueza, praticando preços monopolistas.
    O governo tem ferramentas para limitar a liberdade de acção das empresas monopolistas, e pode fazê-lo com eficácia ou sem eficácia.
    Se for com eficácia, pode mesmo fazer reverter em favor dos consumidores, com reduções de preços, os ganhos de custos que a gestão privada quase sempre consegue nestas empresas.
    Se for sem eficácia, vai conceder aos novos accionistas da empresa um "negócio da China".
    A prática dos sucessivos governos tem resultado mais nesta segunda via, infelizmente, como se pôde verificar nas comunicações fixas em Portugal.
    De modo que, seguro, seguro, para beneficiar os consumidores e permitir a criação de mais riqueza, é liberalizar o mercado e, só quando houver concorrência com algum significado, privatizar, como se pôde verificar nas comunicações móveis em Portugal.
    Mas, resumindo razões, nesta fase é importante o estado realizar algum capital para abater a dívida, os CTT funcionam relativamente bem, o que é um factor importante para vender bem a empresa, e conseguem-se controlar os efeitos perniciosos que uma privatização sem prévia liberalização pode vir a causar, pelo que vender os CTT parece ser uma boa opção.
    A não ser que se seja de opinião que o estado deva ser capitalista e, neste caso, se seja contra a privatização por uma questão de bandeira.

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  8. Caro MVP. Não misturei, adicionei à discussão. Vejo que o seu Estado continua com minúsculas. O estado em que chegaram as coisas do Estado… ;-)
    As ferramentas do Estado para limitar as empresas monopolistas são curtas. Até para as outras, como se vê naqueles inúteis painéis de preços que enxameiam as nossas auto-estradas. E a AC faz inquéritos que dão em nada: claro, queriam o quê: documentos em que se combinam preços?! Ou escutas telefónicas de combinação dos presidentes das petrolíferas?! É virtualmente impossível provar a concertação! Mas voltando aos CTT. A realização de capital para abater a dívida é pontual e vai servir para pouco. Depois passamos todos – os clientes – a pagar mais por aquele serviço e todos – novamente: os contribuintes – a pagar pelos serviços deficitários que são vários – atenção! – não é só a distribuição do correio nas aldeias?! São os vales, o carregamento de telemóveis, o pagamento de serviços por quem não domina a tecnologia para ir a uma ATM, etc., etc. E para sempre!
    Quanto à «bandeira» e ao Estado capitalista, isso não me repugna nada. Aliás, o Estado capitalista até deu um jeitão ao «mercado» para tapar – via CGD – o buraco do BPN que começou em 800 e agora já vai em 4,4 mil?!
    Os marcos de correio e as estações acabam por ser de facto uma presença do Estado em locais em que poucas outras há. Mas enfim, como os CTT tb já estão descaracterizados. E o tempo do carteiro de Pablo Neruda já passou. Aquilo agora é igual a qualquer privado. Seja: vendam-se tb os CTT e os últimos anéis...

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