O capital gosta de abrigos, de protecção. E são vários os que lhe têm sido proporcionados na economia portuguesa.
A “protecção” que acho mais estrutural e mais incontornável é a que lhe é dada pelo trabalho. Refiro-me, em concreto, ao “conforto” que resulta de sermos a economia periférica europeia com uma das maiores taxas de participação no mercado do trabalho. Mais de ¾ das pessoas com idade entre os 15 e os 64 anos está inserida em relações laborais. Esta ampla disponibilidade de recursos humanos – e o uso que as empresas lhe dão – contrasta claramente com o que se passa nos outros países da Europa do Sul (da Espanha à Grécia, passando pela Itália e pela França, o valor é sistematicamente inferior a 70%). Os casos semelhantes são os dos países escandinavos. Mas é desnecessário apontar as diferenças radicais dos sistemas de emprego.
Se a proporção fosse semelhante à da Grécia, isso significaria que mais 700 mil pessoas em idade activa estariam fora de uma relação com o mercado de trabalho. Não será difícil deduzir os impactos que daí resultariam para as empresas, para as políticas sociais, para o processo imigratório. E mesmo que a comparação fosse com a Irlanda chegaríamos a um valor superior a 300 mil. Em anos recentes estes diferenciais eram ainda mais elevados. Por isso, os mecanismos ditos “assistenciais”, que tanto perturbam a direita, teriam forçosamente de ser reforçados.
Num país de salários baixos e de tantos défices organizacionais empresariais, que agora conhece níveis de desemprego crescentes, este assunto deve ou não ser trazido para o debate? Em economias que têm que reconstruir os seus modos de funcionamento, reclamar um lugar central para o trabalho é uma exigência de justiça mas também uma condição de uma economia mais capaz.
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