...por favor edite este livro em português: «Até quando?». Até agora foi a melhor coisa que eu li sobre a actual crise. Rigoroso e pedagógico. Tem um glossário útil para o não iniciado e a descrição dos mecanismos perversos da «proliferação financeira» é esclarecedora. O economista francês Frédéric Lordon, que pertence à chamada escola da regulação e é colaborador regular do Le Monde Diplomatique, está particularmente bem posicionado para analisar a crise e as estruturas que a geraram. Os seus trabalhos críticos começaram na década de noventa. Tem existido muito material para investigação: a instabilidade é indissociável do chamado regime de acumulação capitalista sob hegemonia da finança. Compreendê-lo exige recursos intelectuais que não estão disponíveis na teoria económica convencional.
Lordon é assumidamente estruturalista. A cupidez não é tanto um problema individual, mas sim um problema da estrutura de incentivos que gera determinados padrões de comportamento. O autor escalpeliza a linguagem e a ideologia da finança de mercado que escondem mais do que revelam. Por exemplo, Lordon argumenta que a chamada «inovação financeira» não passa de «proliferação financeira» que só serve para gerar comissões astronómicas para os operadores e uma muito maior opacidade. Já Martin Wolf, editor do FT, havia reconhecido que «a concorrência não funciona bem na finança. Os ‘produtos’ da indústria financeira são promessas para um futuro incerto, vendidas como sonhos que se podem transformar em pesadelos».
É precisamente a concorrência intensa, em contexto de incerteza radical, que torna os agentes, dopados a incentivos, «míopes face ao desastre» da acumulação de riscos. Estes são ignorados até ser demasiado tarde. Como dizia Keynes, na esfera financeira, «mais vale fracassar com as convenções do que ser bem sucedido contra elas». Quase ninguém está em condições de resistir à busca de níveis de rendibilidade que se revelam, mais tarde, insustentáveis. É por estas e por outras que os economistas críticos alertaram, em momento oportuno, para os riscos sistémicos que se escondiam nos lucros sem paralelo do sector financeiro. Os lucros excessivos, por comparação com outros sectores da actividade económica, alimentam os excessos que geram a catástrofe paga por todos (são os milagres da alavancagem…). Hyman Minsky, em quem Lordon também se inspira, dizia por isso que «a finança é demasiado importante para ser deixada ao mercado».
Temos então de regressar ao futuro: um sistema financeiro administrado com controlo público (incentivos, taxas, propriedade…) que assegure, com tranquilidade, muita tranquilidade, aquilo que os bancos devem prioritariamente assegurar: o financiamento do investimento. Sem miopias ou aventuras. Isto funcionou razoavelmente durante algumas décadas. O ponto estruturalista de Lordon sai reforçado: as crises não são defeito, são feitio de uma configuração historicamente determinada do sistema financeiro. Um dos capítulos aprofunda as pistas de reforma, de restauração, que Lordon já tinha apresentado aqui.
No entanto, Lordon não se limita à esfera financeira. Argumenta, à boa maneira da escola da regulação de Aglietta , Boyer e Chesnais, que estamos perante um novo regime de acumulação, uma totalidade sistémica, que exerce uma pressão contínua para a baixa dos salários, para o aumento da polarização social e para o sobrendividamento. Lordon descreve as relações umbilicais entre estes três elementos.
Será um bom exercício comparar o contributo de Frédéric Lordon com o de Paul Krugman. Está para sair uma reedição, com novos capítulos, do livro que Krugman publicou depois da crise asiática. A avaliar por este artigo, acho que a tropa liberal não vai gostar nada das conclusões do Prémio Nobel: «A seguir à crise asiática dos anos noventa houve alguns apelos para a imposição de restrições de longo prazo nos fluxos internacionais de capitais e não apenas restrições temporárias em tempos de crise. Na sua maioria, estes apelos foram rejeitados a favor da acumulação de reservas cambiais que deveriam evitar futuras crises. Agora parece que esta estratégia não resultou». Enfim, a história repete-se. E, no entanto, também há diferenças. «Esta é uma crise especifica e genérica», diz-nos Lordon. Quem quiser um «resumo» desta posição pode ver esta conferência. Economia para os cidadãos.
Se a história se repetisse
ResponderEliminarnas mesmas circunstancias
o BPM não teria este tratamento
em defesa do bom nome
das nacionalizações