A Comissão Europeia apresentou hoje o seu já esperado Plano Europeu de Recuperação Económica, um documento que pretende apontar os caminhos europeus para a saída da crise. Ainda houve quem acreditasse que a crise levaria a UE a rever alguns dos aspectos cruciais que a têm transformado num factor de expansão da lógica neoliberal, cujos resultados estão à vista de todos. A julgar por este documento, foram esperanças vãs.
O Plano da Comissão Barroso é uma mistura de constatações de facto, da reafirmação de profissões de fé acerca das grandes orientações da UE desde Maastricht, e de algumas medidas modestas para enfrentar a crise.
Ao dizer que o BCE já mostrou a sua disponibilidade para baixar mais as taxas de juro a Comissão está apenas a reconhecer a impossibilidade de pôr a política monetária ao serviço de uma estratégia política de resolução da crise (o ultra-independente BCE baixará as taxas de juro se e quando entender que não existem ‘pressões inflaccionistas’ – o que quer que isso queira dizer em tempos de incerteza como a actual). Ao anunciar um aumento da despesa pública dos Estados Membros correspondente a 1,2% do PIB, a Comissão Europeia não faz mais do que fazer contas por baixo àquilo que a maioria dos governos já decidiu fazer (o plano de Obama, por exemplo, aponta para valores superiores a 3% do PIB americano), revelando a incapacidade da UE para prosseguir uma política orçamental que não esteja assente nas racionalidades de cada governo (potencialmente irracionais para conjunto da UE). Ao afirmar que as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) serão lidas com a flexibilidade que a nova versão do mesmo permite, a Comissão está apenas a declarar que se resigna perante o inevitável – ou seja, que em momentos de crise, o objectivo de manter o défice público abaixo dos sacro-santos 3% do PIB é simplesmente inviável.
Entretanto, a crise é aproveitada para reforçar a agenda liberal da Comissão. O Plano é usado para avisar desde já que as despesas a mais de hoje serão pagas amanhã com juros: os Estados Membros terão de entregar até ao fim de 2008 um programa de ajustamento que garanta o respeito pelos objectivos do PEC no médio prazo (tendo em conta que o cumprimento das metas do PEC envolve considerações acerca da taxa de crescimento das economias, pergunto-me quem vai ter coragem para se pronunciar sobre a validade das previsões de crescimento para 2012 ou 2015 que os governos irão apresentar para justificar os seus planos).
Das poucas medidas de realçar pela positiva é a predisposição da Comissão para agilizar as transferências de fundos europeus para os países membros. Tendo em conta que o actual período de fundos estruturais envolve montantes anuais não superiores a 0,2% do PIB europeu, percebe-se a modéstia desta medida.
Para frustração dos europeístas de esquerda, nem em tempos de crise a UE consegue ser algo diferente do que lhe chamou, e bem, Jean-Paul Fitoussi: um Cavalo de Troia da globalização neoliberal.
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