Num artigo publicado ontem no The New York Times, Paul Krugman alerta para a necessidade de se começar desde já a trabalhar na reforma do sistema financeiro, apesar das atenções estarem agora viradas para as medidas a tomar para impulsionar a actividade económica e evitar uma recessão séria. O argumento de Krugman é claro: se as medidas de combate à crise funcionarem, quando a retoma vier as componentes do sistema financeiro que estiveram na base da actual crise vão entrar novamente numa espiral de especulação, dando aos seus responsáveis um poder de lobbying que tenderá a dificultar a adopção das reformas necessárias. Krugman apela, por isso, à equipa de Obama para não deixar de se focar, desde já na reforma do sistema financeiro (e não apenas no relançamento económico imediato).
A sensação de que a reforma de um sistema financeiro sem rédeas está a ser menorizada também existe na Europa. No Plano Europeu para a Recuperação Económica, lançado na 4ª feira, a Comissão dedica duas linhas a este tema, apenas para afirmar que o ritmo de reforma do sistema financeiro será mantido nos próximos meses. A verdade é que ainda não foram assumidos quaisquer compromissos a este nível.
É preciso desde já exigir as medidas necessárias para evitar a repetição das consequências da economia de casino em que andamos a viver há mais de duas décadas. As propostas existem e incluem:
- a proibição da titularização de empréstimos e da sua venda em pacotes de activos opacos;
- standardização e supervição dos produtos derivados;
- a proibição dos hedge funds no espaço europeu e da aplicação de fundos europeus em hedge funds a operar no exterior;
- a abolição de incentivos para os gestores baseados no desempenho de curto-prazo;
- o encerramento dos off-shores isentos de supervisão financeira e de impostos (i.e., fim dos paraísos fiscais);
- a reposição da separação entre a banca comercial e a banca de investimentos, impedindo a primeira impedida de se envolver na transacção de títulos;
- a introdução de requisitos mínimos de capital que variem com o ciclo económico (exigindo que os bancos aumentem as suas reserves em tempos de bonança);
- a submissão da avaliação do risco financeiro (i.e., agências de rating) à supervisão pública;
- a introdução de impostos sobre as transacções financeiras de curto prazo (tipo taxa Tobin);
- limitações aos investimentos especulativos por parte dos fundos de pensões;
- a inversão da tendência para a privatização da segurança social;
- a manutenção permanente sob controlo do Estado de uma parte significativa do sector bancário.
Estas são medidas que, a ser adoptadas, reduzem a possibilidade de formação de bolhas especulativas e seu posterior rebentamento - com os custos que estamos a assistir em termos de redução do crescimento, aumento do desemprego e do endividamento das famílias, esforço financeiro dos Estados (que terá de ser compensado com aumentos posteriores da carga fiscal) e instabilidade permanente.
Dirão os liberais do costume que estas medidas reduzem a eficiência e constituem restrições inaceitáveis à liberdade individual. Mas esse caminho já experimentámos nas últimas décadas e os resultados não foram famosos. Experimentemos agora os caminhos alternativos.
Há uma medida que não é propriamente financeira mas que é igualmente necessária.
ResponderEliminarTrata-se da proibição pura e simples dos bens alimentares básicos serem negociados em qualquer tipo de bolsa.