Nos cinco anos que durou o segundo mandato de Berlusconi à frente do governo Italiano (2001-2006) assistimos a alguns dos momentos mais lamentáveis da politica transalpina desde o pós-guerra e, simultaneamente, ao desenvolvimento de novas dinâmicas sociais e reflexões politicas que constituíram um exemplo para a esquerda europeia.
Acusado pela justiça por inúmeros crimes económicos e por tráfico de influências, Berlusconi fez o que estava ao seu alcance para se ver livre do que apelidava de ‘perseguição pessoal e politica conduzida pelos juízes comunistas’. Sem sombra de pudor, reduziu o tempo de prescrição judicial à medida dos processos que o envolviam, descriminalizou as práticas de fraude contabilística e outros crimes económicos, e ajustou a lei das incompatibilidades dos políticos à necessidade de controlo do império comunicacional de que é proprietário. A nível internacional a sua imagem ficou ligada a sucessivas ‘gaffes’ de mau gosto (como aquela em que chamou chefe das SS a um eurodeputado alemão que o questionava no Parlamento de Estrasburgo). A política ‘séria’ deixou-a ao cuidado do seu principal parceiro de coligação, Gianfranco Fini, líder da Alleanza Nazionale (ex-fascistas), que procurou deixar a sua marca em diversas leis repressivas (e.g., limitação da possibilidade de redução de penas, reforço do proibicionismo em relação ao consumo de drogas, etc.).
Ao mesmo tempo que Berlusconi usava o governo para prosseguir os seus interesses pessoais e os ex-fascistas mostravam as suas garras na frente securitária, a esquerda italiana vivia um dos momentos mais activos e mobilizadores das últimas décadas. Na sequência dos protestos de Génova em 2001, aquando da reunião do G8, o movimento alterglobalista ganhou uma visibilidade e uma capacidade de mobilização raras. A força deste movimento fez-se sentir em varias ocasiões, como no protesto popular contra as guerras do Afeganistão e do Iraque (em que milhões de italianos, desde os vales dos Alpes às vilas costeiras da Sicília, colocaram nas suas janelas, durante meses, bandeiras com as cores do arco-íris em sinal de adesão ao protesto), na manifestação convocada pela CGIL que levou a Roma 3 milhões de pessoas em luta contra a liberalização da regras laborais (obrigando Berlusconi a recuar) ou ainda no Fórum Social Europeu de Florença, onde dezenas de milhares de activistas de várias causas se juntaram para trocar ideias e experiências, e procurar vias alternativas ao modelo de desenvolvimento neoliberal.
Quando chegaram as eleições de 2006, toda a esquerda se sentia preparada para expulsar Berlusconi e os seus aliados do poder, dando um rumo responsável e mais democrático à governação de Italia. Berlusconi também o percebeu - e tratou de minar devidamente o terreno. Antes de abandonar o poder procedeu a uma alteração da lei eleitoral com o objectivo declarado de perturbar a estabilidade do governo sucessivo.
O que poucos esperavam é que o novo Governo Prodi, eleito em 2006 com o apoio das várias esquerdas, fosse obrigado a viver com uma margem tão escassa no Senato Italiano. Logo após as eleições muitos perceberam o estado de fragilidade em que se encontrava a esquerda, agora no poder. Os festejos associados à derrota de Berlusconi e seus aliados não conseguiam, por isso, esconder que a esquerda italiana se encontrava, ainda e outra vez, em estado de choque.
Como análise parece-me fraco.
ResponderEliminarDá a entender que este regresso do cavalieri se deve apenas ao facto de ter minado legislativamente a alternativa de esquerda.
O povo italiano será então estúpido ou será que ninguém lhe ofereceu uma alternativa em que fosse possível acreditar ?
Humm... note-se que a a união de toda a Esquerda nas eleições de 2006 apenas conseguiu mais 40 mil votos (0.1%) que o agrupamento de direita na eleição para a Câmara de Deputados (onde apenas conseguiu uma maioria confortável por via dum "prémio de maioria" de cariz fortemente anti-democrático). Nas eleições para o Senado a Esquerda teve na realidade menos 240 mil votos (0.7%) que a Direita , só conseguindo mais 2 lugares devido às distribuição de assentos pelas províncias a ter beneficiado. Ouse ja, num contexto em que tivesse havido respeito pela vontade democrática dos eleitores, ou seja pela proporcionalidade, a Esquerda teria ficado numa posição de maior precariedade do que ficou.
ResponderEliminarEm 2008 a Esquerda (desunida) teve menos 2.8 (2.4 no caso do Senado) milhões de votos do que a Direita (excluindo a UDC) nas eleições para a Câmara dos Deputados.
Note-se que apesar do aumento da abstenção, o conjunto da direita (Bers.+UDC+fascistas) teve mais votos, portanto nem sequer foi devido à abstenção de Esquerda que se deu o colapso eleitoral desta. Houve uma transferência significativa de votos da Esquerda para a Direita. De quem? Esta é a pergunta chave....
Não acompanho a política italiana de perto o suficiente para perceber a que se deveu o colapso da Esquerda. Note-se que quando se vai a ver os resultados em detalhe quem na realidade colapsou dentro da Esquerda foi a sua componente radical. Quer o partido (coligação Oliveira antes) de Veltroni quer o de Di Pietro aumentaram o número de votos de 2006 para 2008, apesar do aumento da abstenção... Se fosse a Esquerda Radical italiana fazia um inquérito de opinião junto das pessoas que neles votaram em 2006 para perceber o que correu mal.
eu era feliz....e n sabia!!!
ResponderEliminarForam todos esses milhões, em movimento, que foram deitados fora pela política Prodi com o "assentimento" envergonhado da esquerda. Era preciso fazer política para esses milhões e não renegar o motivo pelo qual eles saíam à rua e punham a direita à defesa. Prodi, Bertinotti só têm aquilo que merecem!
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