terça-feira, 15 de abril de 2008

Autópsia da «esquerda moderna»

Vale a pena ler o artigo de Jorge Bateira - economista, investigador universitário e um dos dinamizadores da corrente «opinião socialista» do PS. Foi publicado no número de Abril do Le Monde Diplomatique - Edição Portuguesa. Intitula-se «Autópsia a um reformismo iluminado» e procura analisar criticamente a lógica das transformações em curso em muitos sectores da administração pública e apontar algumas das causas para o seu insucesso. Acho que a estratégia do Ministério da Educação, antes da luta dos professores ter lançado as bases para um acordo, ilustra bem o que Jorge Bateira tem em mente. É a melhor reflexão que eu li nesta área. Fico com vontade de ver o tema desenvolvido num trabalho de maior fôlego. Algumas pistas: (1) o discurso do combate aos supostos grupos de interesse assenta no pressuposto de que o oportunismo egoísta é o padrão de comportamento dominante nas organizações públicas; (2) este discurso, sobretudo quando é vertido em sistemas de avaliação e de monitorização, tende a ter efeitos perversos: «os sistemas de gestão que pressupõem o oportunismo generalizado acabam por estimular o tipo de comportamento que visam combater»; (3) a mobilização das motivações intrínsecas dos profissionais - por exemplo, nas áreas da saúde e da educação -, essencial para um bom desempenho, é bloqueada pela obsessão com o controlo burocrático de quem não concebe a possibilidade da cooperação autónoma para atingir objectivos de interesse público; (4) gera-se uma mentalidade dirigista que assume que o centro político tem todas as soluções e que se trata apenas de as impor com voluntarismo combativo de cima para baixo; (5) o conhecimento, disperso pela administração pública, é desvalorizado e não é incorporado no desenho das nova soluções. Bateira conclui, assinalando que este modelo não é original e reflecte problemas ideológicos e impasses mais vastos na social-democracia, versão social-liberal. Temos muito que discutir. Até porque a esquerda socialista tem a obrigação de apresentar alternativas robustas que revitalizem o serviço público e as lógicas não-mercantis que o suportam.

1 comentário:

  1. Os economistas de esquerda do PS deveriam começar por dizer qualquer coisa de esquerda que se ouvisse. E podiam fazer a autópsia ao governo Prodi

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