O artigo de Carlos Carvalhas no Mdiplo - «perspectivas para a economia portuguesa» - começa por chamar a atenção para as consequências perversas de uma política económica que fez do défice orçamental o seu objectivo último e que aceitou com passividade a divergência em relação à UE: «se o objectivo central fosse o crescimento económico, o objectivo do défice, também a ter em conta, deveria ser encarado a mais longo prazo e de forma menos rígida». Segundo Carlos Carvalhas, com o euro aprofundou-se e, paradoxalmente, tornou-se menos visível, aquele que é um dos nossos problemas centrais: o endividamento externo, fruto do atrofiamento do sector dos bens transaccionáveis para exportação (o euro forte também não ajuda nada). Isto é a expressão última de uma inserção internacional mal planeada e crescentemente dependente. O endividamento externo maciço resulta na perda do «controlo [nacional] de alavancas fundamentais da nossa economia». Vender activos é o que parece restar a quem não produz o suficiente. Aqui chocamos com um dos traços mais preocupantes da nossa economia: a «financeirização» e a natureza rentista dos grandes grupos económicos, reforçados por um processo de privatizações cada vez mais irresponsável (os bens transaccionáveis não são o seu forte. . .). Lucros fantásticos que contrastam com um tecido de PMEs muito desprotegido e em grandes dificuldades.
Que fazer? Para Carlos Carvalhas há duas linhas essenciais: (1) aumentar o investimento público, no quadro de uma estratégia de apoio ao sector de bens transaccionáveis, de qualificação da força de trabalho e de combate à especulação financeira, aliada a uma valorização do trabalho, única forma de colocar o «país a caminhar nas duas pernas, exportações e mercado interno»; (2) reconhecer que as tendências de polarização, resultado do alcance das forças de mercado na zona euro, só podem ser travadas por uma política europeia que aumente substancialmente «o papel redistributivo do orçamento comunitário». Isto é crucial para uma economia periférica com importantes défices socioeconómicos.
É engraçado, confesso, estas ideias há uns anos poderiam parecer-me bastante ousadas. Hoje surgem-me como de elementar sensatez.
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