quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020
Este país não pode ser racista
Augusto Santos Silva tem sido aqui frequentemente criticado. Esta semana, quero elogiá-lo pela posição que assumiu, enquanto Ministro dos Negócios Estrangeiros, a propósito do caso Marega. Santos Silva criticou o atentado à dignidade humana, como não podia deixar de ser, mas sublinhou, de forma complementar, como “as manifestações de racismo prejudicam a imagem internacional de Portugal”.
Lembro que o anti-racismo foi inscrito no sistema internacional graças sobretudo à libertação nacional dos povos colonizados, à emergência de países cuja maioria da população foi durante séculos vítima do racismo, filho ideológico do imperialismo colonial. Houve e há um nacionalismo com efeitos anti-racistas. Qualquer política externa de um antigo país colonial tem de ter um dos maiores progressos históricos de sempre em consideração. Qualquer boa política externa começa, aliás, por uma decente política interna. Todas as formas de racismo são contrárias aos interesses nacionais, qualquer forma de racismo é anti-patriótica, até por isto:
“Portugal é um país justamente reconhecido e justamente respeitado. Não por não ter racismo, porque, infelizmente, esse mal existe por muito lado, mas por o racismo não ter uma expressão social significativa, não ter expressão política (...) nem ocupar o espaço público.”
Mais do que ser verdade, e eu creio de facto que dela não anda muito afastada, esta hipótese de Santos Silva exprime uma certa ideia de comunidade que quer que isto seja verdade: Portugal não é um país racista, não pode e não deve ser.
No fundo, creio que são contraproducentes, para um popular combate anti-racista, dois hábitos políticos prevalecentes entre certos sectores e que consistem em dizer que os portugueses são racistas ou maioritariamente racistas, e que o nacionalismo, assim no singular, conduz ao racismo. O racismo combate-se onde existe em concreto e é preciso fazer também esse combate, mas não só, claro, em nome dos valores e interesses de todos os que fazem este país. Ou seja, em nome de uma primeira pessoa do plural inclusiva.
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4 comentários:
Aos gritos histéricos de 'Vem lobo'ainda o lobo acaba por vir.
Mais do que qualquer outra acção ou ideologia, a ciência desmontou o racismo e nada mais sobra que factores sociais, educacionais e até estéticos.
'Trabalhar como um negro', 'Vi-me preto para...' são memórias de um passado de dominação que o tempo irá apagando se os histéricos deixarem de propagandear os seus excelsos sentimentos à custa de fazerem dos outros racistas.
E como sempre, falar de boa-educação não dá créditos e o civismo está em decadência desde que atravessar a rua cm o sinal vermelho ter deixado de dar multa.
Partilho da opinião de Pinto da Costa: mais que um episódio de racismo, o que se passou em Guimarães foi um episódio de pura, bruta, irracional, imbecil, lamentável ESTUPIDEZ!
Acrescento: de ambas as partes, diga-se sem racismo.
Não vale a pena falar de anti-racismo quando depois se defende o estabelecimento de fronteiras, João Rodrigues. Porque os primeiros a serem parados pela fronteira, como as propostas para as novas leis de imigração do Governo Britânico mostram, são os pobres que não se parecem connosco.
https://www.theguardian.com/commentisfree/2020/feb/19/tory-points-based-immigration-low-skilled-workers-politics-economy
Aliás, quer um exemplo de países onde décadas dessa retórica que utiliza não produziram de todo sociedades anti-racistas? Olhe para o antigo Bloco de Leste. A única maneira das pessoas aceitarem a presença do Outro é aprenderem a viver na presença do Outro. O resto é conversa para enganar meninos.
Quanto ao carácter anti-racista do nacionalismo anti-colonial, o seu argumento seria muito mais convincente se em inúmeros casos, o mais recente é o da Índia, mas poderíamos também falar da trágica guerra civil angolana, a retórica de unidade nacional contra o opressor imperialista não tivesse dado depois lugar a uma retórica interna de exclusão do Outro, mesmo se disfarçada de luta ideológica ou com contornos religiosos e que depois descambou no paroxismo da violência...
O Nacionalismo é a Guerra, como bem dizia Mitterrand... Ninguém deseja um retorno aos tempos do império, mas é bom que as lições do Passado sejam aprendidas por aqueles que sonham com um regresso a um mundo de nações fechadas. A soberania sobre ruínas não interessa um chavo...
E o segundo problema com esta retórica da fronteira é que ela mina profundamente o caso moral que Portugal tem para pedir o tratamento decente dos seus emigrantes por outros Países, como em tempos bem disse o Ministro Silva Pereira. Por boas e sobretudo más razões, a emigração está inscrita na identidade do povo português.
Vir agora sugerir que para se satisfazer a necessidade de segurança das classes populares, se deve erguer fronteiras, é o maior tiro no pé que é possível dar-se, pelas implicações que pode ter nos interesses das nossas comunidades migrantes, que provêm maioritariamente, adivinhou, das classes populares...
Honra seja feita ao PCP que nunca utilizou tal retórica. O que é preciso é explicar às classes populares (chama-se isso fazer política) que é antes de tudo do seu interesse tratar e acolher bem as comunidades migrantes, assim como as minorias étnicas que vivem em Portugal, em alguns casos há muitos séculos.
É uma questão de reciprocidade para com o bom acolhimento dos nossos migrantes em toda a parte (desengane-se quem pensa que o racismo não existe entre brancos, mesmo se bastante menos virulento que aquele que é dirigido às pessoas de cor), é uma questão de inteligência e é uma questão da decência de que fala...
https://twitter.com/Luisvieira88/status/1230126048173531137?s=19 infelizmente temos destas manifestações...
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