quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

Um jornal que apoia a greve geral


O enfraquecimento dos direitos dos trabalhadores não afeta apenas a relação laboral e a vida pessoal. Afeta todo o funcionamento da sociedade, em particular quando ocorre, como é o caso, no quadro da degradação programada dos serviços públicos, algo já bem patente na saúde e na edução. E ainda vai no adro a procissão dos cortes nestes sectores para alimentar a viragem do «grande rearmamento europeu»… Já se sabe: tudo começa no trabalho, até a possibilidade de reduzir desigualdades socioeconómicas e criar sociedades que funcionem melhor. 

Num editorial neste jornal intitulado «Elogio dos sindicatos», escrito há mais de dez anos, em abril de 2015, Serge Halimi referia um estudo de economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI) que admitiam que «“cerca de metade” do aprofundamento das desigualdades que os liberais tradicionalmente preferem atribuir a factores impessoais (globalização, tecnologias, etc.) decorreria do declínio das organizações dos trabalhadores». E acrescentava: «Quando o sindicalismo, ponto de apoio histórico da maior parte dos avanços emancipadores, se apaga, tudo se degrada, tudo se fragmenta. A sua anemia só pode agudizar o apetite dos detentores do capital. E a sua ausência só pode libertar um espaço que é de imediato invadido pela extrema-direita e pelo fundamentalismo religioso, dedicando-se ambos a dividir grupos sociais cujo interesse seria mostrarem-se solidários». É também esta possibilidade de gerar solidariedades para impor direitos e igualdade que a atual proposta laboral do governo da Aliança Democrática pretende atacar. É esse o significado de impedir a entrada dos sindicatos, sem autorização patronal, nas empresas onde não haja trabalhadores sindicalizados, ou de limitar o direito à greve pelo alargamento abusivo dos serviços mínimos. 

 A greve geral não se justifica apenas, portanto, para forçar a retirada pelo governo de propostas laborais que degradariam, e muito, a vida laboral dos trabalhadores. Justifica-se também pela urgência de defender instrumentos legais e sindicais que serão cruciais às lutas futuras. Construir uma frente de recusa popular mobilizada em torno da greve geral é criar ação coletiva onde ela pode ainda impedir as derivas austeritárias e autoritárias que se anunciam.

Sandra Monteiro, Greve Geral, Le Monde diplomatique - edição portuguesa, dezembro de 2025.
 

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