«Na sua grande maioria são pessoas que estão a trabalhar. Algumas podem ter empregos mais precários, mas muitas têm contratos, e inclusivamente contratos sem termo. Portanto, até podem ter situações estáveis do ponto de vista profissional, mas têm rendimentos baixos, têm o salário mínimo ou pouco acima disso. E por isso não conseguem aceder a uma casa no mercado normal, no mercado formal de habitação, aos preços que estão a ser praticados.
Eu recordo-me, por exemplo, de um caso no bairro do Talude, precisamente, de uma jovem que trabalha 12 horas por dia, com apenas 8 folgas rotativas por mês, a cuidar de uma senhora idosa em Lisboa. Ganha cerca de 800 euros e, como é evidente, com 800 euros não consegue arrendar uma casa. Eu, aliás, hoje estive a fazer um exercício, que foi analisar, um a um, 200 anúncios de casas para arrendar, precisamente no concelho de Loures, e a casa mais barata que eu encontrei em Loures, que tinha 30m2, custava 750 euros. Ora, esta jovem, que trabalha 12 horas por dia - 12 horas por dia - ganha 800 e pouco, e portanto não tem solução possível.
No trabalho que fizemos agora, e publicámos há um mês, contactámos, uma a uma, as 18 autarquias da Área Metropolitana de Lisboa, perguntando precisamente quantos bairros é que tinham, com quantas famílias. Nós fizemos este mesmo exercício há 6 anos, em 2019. Na altura, o título desta notícia era "ainda há 13 bairros de lata na Grande Lisboa". E o "ainda" não era por acaso. Era porque na altura havia esta ideia, na população, que este era um problema que já estava resolvido ou que era residual. Porque tinha havido o PER, o Programa Especial de Realojamento nos anos 90, e portanto enraizou-se esta ideia, de que era um problema resolvido. Ora, nós voltámos a fazer 6 anos depois e o título é "já há 27 bairros de barracas na Grande Lisboa". E eu tenho a certeza de que se fizer este trabalho novamente, daqui a um ano, se calhar o título é "já há 40" ou "já há 50". Porque efetivamente, quem está na iminência de ir para a rua, vai construir um teto, por mais precário que esse teto seja».
Joana Pereira Bastos, Expresso da Meia-Noite (19 julho 2025)
Numa aproximação despudorada e irresponsável ao Chega, tanto Ricardo Leão (que tudo fez para associar as barracas a um golpe oportunista de gente que quer passar à frente nas listas de espera), como Patrícia Gonçalves Costa (que tentou associar a crise habitacional à imigração, ignorando olimpicamente as procuras especulativas que lhe deram origem), deviam prestar atenção a esta análise de Joana Pereira Bastos, jornalista do Expresso, que apurou mais informação útil de resposta às interrogações do Presidente, que os dois governantes juntos.
Hoje, em Lisboa, concentração promovida pelo Vida Justa, «contra a destruição de casas, os despejos e as mentiras». É em frente à Cultugest, a partir das 19h00.
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