quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

O que dizem os números da inflação na Argentina?


Na imprensa económica, Javier Milei tem merecido elogios pela contenção da taxa de inflação argentina. Ao fim de um ano de governação, em dezembro, a taxa de inflação mensal foi de 2,7%, o que contrasta com a taxa de 25,5% registada no mesmo mês do ano anterior, como foi assinalado pela revista The Economist, onde se pode ler que as medidas de Milei tiveram um efeito "dramático" sobre a taxa de inflação.

No entanto, este não é o único dado relevante apresentado no artigo: "Os preços de alguns produtos essenciais, dos quais dependem as famílias mais pobres, subiram de forma desproporcional desde que Milei assumiu o governo. [...] A eliminação dos subsídios aos transportes e energia significa que os preços dos bilhetes de autocarro e comboio aumentaram de mais de 300%. Os preços da eletricidade e do gás dispararam em 430%".

Quando se olha apenas para o valor da taxa de inflação, não se tem em conta as diferenças na evolução dos preços de diferentes produtos ou serviços. Por outras palavras, ao olhar para a evolução média dos preços, não se tem em conta a variância. Como os padrões de consumo variam consoante o rendimento das pessoas, há subidas de preços que afetam mais uns grupos do que outros. Tipicamente, a subida dos preços em bens ou serviços essenciais (energia, alimentos, transportes, etc.) tendem a prejudicar mais as pessoas que ganham menos, uma vez que gastam uma parte maior do seu salário nestes bens.

A eliminação dos subsídios públicos por Milei é parte de uma vaga de cortes nos serviços públicos, que tem tido consequências severas para a sua qualidade em áreas como a saúde, a educação ou a investigação científica. Além disso, a austeridade também contribuiu para acentuar a crise em que o país se encontrava: na primeira metade de 2024, a economia contraiu mais do que se esperava e a Argentina entrou em recessão técnica, com o desemprego a aumentar. É difícil ignorar os custos sociais da política económica de Milei. Nesse sentido, o artigo da The Economist termina com uma conclusão razoável: "A tolerância do público para crescimento baixo e desemprego e pobreza elevados não durará para sempre, mesmo que a inflação tenha sido mitigada".

2 comentários:

  1. Caro Vicente Ferreira, e demais Ladroes:

    https://billmitchell.org/blog/?p=62308

    O aumento das taxas de juro do BCE para combater a inflacao teve efeitos... inflacionistas! Diz um relatorio... do BCE!!!
    O Japao, passou todo este episodio inflacionista com taxas de juro negativas e controlou melhor a sua inflacao que todas as outras economias ditas avancadas juntas.
    A inflacao caiu a pique sem aumento de desemprego ou recessao - sinal claro de que NAO foram as taxas de juro que induziram esse comportamento - a teoria economica ortodoxa falhou nos seus proprios termos.
    Agora o BCE...

    Como e que e possivel assistir-se a uma falha grosseira de politica economica, assistir-se a uma falha grosseira da generalidade dos bancos centrais no cumprimento das suas "raisons d'etre", de se assistir a uma falha grosseira e de proporcao gigantesca das teorias centrais da "ciencia economica ortodoxa" sem qualquer registo mencionavel nos media de massas?

    Caros Ladroes: mexam-se caramba! Usem o poder que tem!

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  2. Os eleitores não comem macroeconomia, e são geralmente indiferentes aos parâmetros macroeconómicos que lhes são apresentados. Com uma excepção: detestam, detestam de verdade, a inflação. E detestam-na mesmo quando é acompanhada de um aumento proporcional nos rendimentos nominais, porque estes parecem prometer uma melhoria na capacidade de compra que acaba por não se verificar. Esta aversão à inflação talvez explique o benefício da dúvida que os argentinos estão a dar a Milei, e a disponibilidade para viverem pior agora em troca de viverem melhor no futuro. Mas quanto tempo estarão os argentinos dispostos a esperar por esse futuro? E o que acontece se ele nunca chegar?

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