quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

Ciência social da vida material


A entrevista do Negócios a José Reis (ver aqui ou aqui) não é de hoje. Foi publicada no passado dia 5, mas a sua leitura continua a justificar-se, claro. Desde logo por se iniciar a insistir no entendimento rico e plural da ciência económica: «Gosto de chamar à economia a disciplina que estuda a vida material. Outros dizem outras coisas: que estuda os mercados, que estuda as decisões individuais, ou a ciência que quantifica determinadas relações económicas». A ideia de «economia como a ciência da vida material e da deliberação coletiva», acrescenta.

É a partir daqui, deste entendimento de uma disciplina impura, que não dispensa o espaço nem o tempo, nem tampouco o diálogo com outras ciências sociais, que José Reis sinaliza o ciclo de crescimento e desenvolvimento associado ao 25 de Abril, marcado desde logo pela criação significativa de emprego, «o grande mecanismo de coesão social» que nos deve levar hoje a questionar o «perfil de especialização» produtiva da economia portuguesa: «Quando três quartos da mão-de-obra estão em setores cuja produtividade é inferior à média, às vezes muito inferior à média, temos um problema de criação de riqueza».

Apelando a uma discussão crítica da inserção europeia de Portugal, José Reis identifica três «desequilíbrios perante o exterior: produtivo, migratório e financeiro», sublinhando ainda, entre outros temas, a importância de as economias se autoestruturarem, e «não estarem dependentes de lógicas de abertura muito ousadas».

Li a entrevista no momento em que ecoava, na Casa da Democracia, um discurso miserável e equívocado sobre a descolonização. Também aqui, uma referência certeira: «no prazo de dias, não foi anos, tivemos meio milhão de pessoas. (...) Em dada altura, o Rossio era um grande sítio de aglomeração destas pessoas. Mas a maior parte dispersou-se rapidamente pelo território. É extraordinário que tenha acontecido. Temos aqui um dinamismo de uma sociedade e de uma economia que é forte. E que é um dinamismo para dentro, para a reorganização interna. Como sabemos, hoje temos dinamismos para fora».

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