segunda-feira, 14 de outubro de 2024

Enganem os jovens a ver se eles deixam

No discurso do Governo e de muitos comentadores, os efeitos da medida [IRS Jovem] são explicados de forma simples, em dois passos: primeiro, a redução do IRS leva ao aumento do salário líquido dos jovens trabalhadores; segundo, com um maior rendimento disponível, os jovens vão ter menos incentivos para emigrar. Esta explicação é intuitiva, mas as coisas são menos simples do que parecem. 

Embora incida sobre os rendimentos individuais, o IRS (tal como as contribuições para a Segurança Social) representa antes de mais um custo para os empregadores. Quando quer recrutar alguém, para o mesmo nível de salário líquido, uma empresa terá de suportar mais despesas quanto mais elevadas forem as taxas de imposto sobre os rendimentos singulares. Assim, o efeito directo de uma descida do IRS é a redução dos custos totais que as empresas suportam – e não um aumento do rendimento líquido dos trabalhadores. 

Aquilo que as empresas fazem com a redução dos custos que daí decorre pode variar muito: algumas reduzem os preços, esperando com isso conquistar uma maior quota de mercado, caso tenham capacidade produtiva por utilizar; outras aumentam os salários, na expectativa de conseguirem atrair e reter os trabalhadores mais capazes [sejam jovens ou não]; podem também contratar mais pessoal sem alterar as remunerações, se isso lhes permitir produzir mais e lucrar com esse aumento da produção; em alternativa, a maior disponibilidade de recursos poderá ser canalizada para a aquisição de equipamentos ou o pagamento de dívidas passadas (principalmente em empresas com maiores restrições de liquidez); algumas empresas, simplesmente, usam por inteiro a descida do IRS para distribuir lucros aos proprietários. 

O problema do IRS Jovem não é apenas ser ineficaz, para a esmagadora maioria dos jovens portugueses, nos objectivos que se propõe atingir. São também os elevados custos que acarreta, sob a forma de despesa fiscal: de acordo com a proposta de Orçamento do Estado apresentada pelo Governo, o IRS Jovem vai custar aos cofres públicos, só em 2025, perto de 800 milhões de euros – mais do que os recursos destinados a toda a rede de educação pré-escolar existente (e ainda incompleta) em Portugal, ou que os investimentos previstos no parque público de habitação. Com os recursos que assim se perdem seria possível fazer bem mais e melhor para responder às dificuldades que os jovens enfrentam no nosso país. Talvez não rendesse tantos votos, mas faria mais a diferença. 

O resto do meu texto pode ser lido no Público de hoje, em papel ou online.


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