A massa de congressistas que ontem se levantou em peso e aplausos, quando Luís Montenegro falou em «libertar» a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento «das amarras de projetos ideológicos ou de facção» - numa indisfarçável aproximação ao Chega -, não só não fará ideia dos temas realmente tratados na disciplina, como não terá noção de que os mesmos já faziam parte das orientações da
Educação para a Cidadania, no tempo de Passos Coelho e Nuno Crato.
Sim, é verdade. Por estranho que possa parecer a muitos dos militantes que estiveram ontem no Congresso do PSD em Braga, os temas da educação sexual, igualdade de género e interculturalidade já constavam - e bem - dos currículos do básico e secundário no tempo do anterior governo de direita. Aliás, as questões relacionadas com as «instituições e a participação democrática», que Montenegro diz querer agora «cultivar», foram integradas no programa da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento em
2018, por um governo do PS.
Não esqueçamos, porém, que já em 2020 o manifesto pela «objeção de consciência» reuniu figuras diversas, algumas das quais expectáveis pelo seu conservadorismo (Cavaco Silva, Helena Matos ou José Miguel Júdice), outras mais surpreendentes (António Araújo, David Justino ou Joaquim Azevedo), sendo de admitir, nestes casos, que possa não ter sido claramente percebido o que estava em causa. O próprio ministro Fernando Alexandre, aliás, visivelmente desconfortável com a iniciativa de ontem, foi incapaz de dar um exemplo de queixas concretas, assumindo apenas que a disciplina continuará a ser obrigatória.
De qualquer modo, como refere Eunice Lourenço, «que as mudanças numa disciplina que pretende formar melhores cidadãos tenha sido o momento alto do discurso de Luís Montenegro diz muito sobre o PSD que esteve reunido em Congresso». Pois diz, diz mais até. Excetuando quem se levantou e aplaudiu por convicção informada, diz muito sobre a permeabilidade dos congressistas, por desinformação, ao discurso do Chega. Desinformação a que Luís Montenegro não hesitou deitar mão, num impulso demagógico e desprovido de escrúpulos, com objetivos meramente eleitorais.
Excelente artigo. Conciso direto e informativo.
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