A reflexão soberanista – economia, política, política económica, economia política e respetivas histórias intelectuais – tem sido decisivamente ajudada pelos trabalhos do economista francês Jacques Sapir, professor na École des hautes études en sciences sociales de Paris: da desglobalização ao regresso do planeamento nacional, passando pela defesa da modernidade do protecionismo, mergulhando na história destas teorias práticas.
Com ele aprende-se que sem fronteira não há responsabilização política e logo não há democracia ou Estado social dignos desse nome. Por isso, os neoliberais sempre quiseram tornar a fronteira política economicamente irrelevante. Sapir faz uma aposta: sem soberania, não há escolha e liberdade coletivas. A soberania continua a ser uma ideia iluminadora. A perda de soberania, pelo contrário, é uma aposta reacionária e geradora de desordem social.
Sapir tem um trabalho persistente e consistente. Infelizmente, creio que só um livro seu está traduzido entre nós – Os economistas contra a democracia (2007, Sururu). Nele, denuncia a tentação antidemocrática do cientificamente incompetente “peritismo económico” liberal, com pesadas responsabilidades na crise que se seguiria.
Entretanto, no mundo francófono – da França ao Quebeque – o soberanismo tem direito de cidade, até porque foi aí que surgiu este ismo, aprendi. Não é aí olhado de lado, ao contrário do que acontece nesta periferia de intelectualidade esmagadoramente cooptada pelo europeísmo.
O europeísmo, declinado na hipótese de que já não há interesse nacional a descobrir e a defender, começou por ser a nova doença infantil de antigos esquerdistas (de Tirana-Pequim a Bruxelas-Frankfurt...) e acabou a conquistar grande parte da academia, também por via da lógica do financiamento, crescentemente europeu, a uma ciência cada vez mais por contrato. Os incentivos pecuniários, e o poder de os definir, não são tudo, mas são algo.
Enfim, merci, Jacques Sapir.
Muito oportuno. A atual forma de neoliberalismo, e a perspectiva do seu aprofundamento, defendida por algumas forças políticas, é o que de mais radical existe na “oferta” política. É extremamente perigoso, como se constata pelo que se passa na Argentina.
ResponderEliminarCaro João Rodrigues. Existe um outro livro do Jacques Sapir em português, Os Buracos Negros do Capitalismo, que eu acho muito interessante e importante mesmo para não economista como eu.
ResponderEliminar