domingo, 9 de abril de 2023
Páscoa
«Vindo das periferias de uma Igreja até então absolutamente eurocêntrica na sua estrutura de poder, Francisco quis ser fiel ao pobre de Assis e resgatou o que sempre devia ter sido o centro da vida da Igreja: os pobres, as sobras humanas, os descartados por esta economia que mata. Uma Igreja pobre e para os pobres, em que eles sejam “instância de evangelização da própria Igreja”, como escreveu na exortação Evangelii Gaudium – esse é o foco pastoral de Francisco.
(...) A Igreja precisava, para ser fiel a Jesus, de ser constipada pelo ar fresco dos debates a que Francisco a veio expor e que o poder curial havia vedado. Eu acredito que essa constipação – ou mesmo bronquite, sei lá – é necessária para que o organismo se torne mais saudável, ganhe imunidades (ao clericalismo, ao sexismo, ao autoritarismo, à administrativização) que agora não tem.
Esta Páscoa tem de ser a da tomada de consciência coletiva de que o clericalismo é uma “perversão da Igreja”, como lhe chamou o Papa. Em Portugal, parte importante da estrutura de governo da Igreja abjura tudo quanto possa pôr em risco o poder clerical. Como era de esperar, começam agora a vir à luz do dia posições de importantes membros do clero desqualificando expressamente o trabalho da Comissão Independente sobre os abusos sexuais na Igreja. (...) Por isso, nesta Páscoa da Igreja em Portugal, a ressurreição passará pelos gestos concretos de reparação das vítimas e de transformação da cultura de violência estrutural inerente ao que Francisco tem corajosamente designado por pecado do clericalismo.»
José Manuel Pureza, Tirar a pedra que sela o sepulcro
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