A maioria dos dados que têm sido publicados desde que muitos economistas começaram a alertar para o risco de uma "espiral inflacionista" - isto é, uma dinâmica de aumentos salariais que agravaria a subida dos preços - desmentem esta ideia. O gráfico acima, feito com base nos dados do INE sobre a evolução do salário médio e do índice de preços em Portugal, mostra que os salários reais têm caído acentuadamente nos últimos meses. A análise publicada pela base de dados Macrobond a partir das estatísticas nacionais disponíveis confirma um cenário semelhante nos países da Zona Euro.
Ao contrário do que ocorreu nos anos 70, quando se deu o último grande surto inflacionista associado a um choque petrolífero, os salários reais estão a cair a pique. Desta vez, é mesmo diferente. A Comissão Europeia prevê que a inflação atinja valores próximos dos 7% no país este ano. Para as pessoas cujos salários não forem aumentados, isto equivale a um corte de aproximadamente um mês de salário. Com a atualização aprovada pelo governo para a função pública (0,9%), o cenário não andará muito longe deste.
A estratégia do governo, que imputa a maior parte dos custos da crise a trabalhadores e pensionistas, já está a ter impactos negativos na procura interna: de acordo com os dados do INE, as despesas de consumo das famílias reduziram-se em 0,3% no 2º trimestre do ano (face ao trimestre anterior). As despesas com bens duradouros sofreram a maior quebra (-1,3%), seguidas das despesas com bens não duradouros e serviços (-0,2%). Já os gastos com bens alimentares aumentaram, o que pode dever-se ao aumento acentuado dos preços neste setor e ao facto de ser mais difícil abdicar do seu consumo.
O efeito de compressão da procura interna tem consequências para a atividade económica e para o emprego, visto que, para o conjunto da economia, os gastos de uns são o rendimento de outros. A redução do consumo afeta as atividades que dele dependem e os dados do investimento na economia portuguesa já dão alguns sinais disso mesmo: no 2º trimestre deste ano, o investimento caiu 4,4% face aos três meses anteriores.Embora ainda seja cedo para tirar conclusões, é expectável que a compressão da procura prejudique o investimento e o emprego, afetando o rendimento disponível das famílias. Face às opções orçamentais do governo, que recusou aumentar os salários e tem apostado apenas em pequenos apoios mitigadores, o risco que o país enfrenta é o de uma espiral recessiva, em que a quebra da procura se traduz numa redução da atividade económica, do emprego e do rendimento, o que por sua vez reduz ainda mais a procura. A fixação com o défice zero sai cara ao país.
É assustadora esta situação, sobretudo por mostrar a total incapacidade da sociedade Portuguesa Portuguesa de rebelar contra a situação.
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