Por uma vez dou razão a Manuel Carvalho, em editorial no Público, até porque em matéria florestal por vezes abandona os seus preconceitos neoliberais: “O algoritmo e o futuro risonho da serra [da Estrela] revelam sinais de nervosismo, insensibilidade e desorientação. Na sua tentativa de relativizar a dimensão do desastre não deram conta que a relativização e a propaganda não funcionam”.
E a desmemória também não. Como está o Pinhal de Leiria? Lembro o que Carvalho escreveu, em coautoria, num Público de 2017:
“No final dos anos de 1970 havia na circunscrição florestal da Marinha Grande (que se dedicava quase em exclusivo ao pinhal e tinha orçamento próprio) 5 técnicos, 200 trabalhadores rurais e 40 guardas florestais. Hoje não há circunscrições e na Marinha Grande trabalham dois técnicos e 10 trabalhadores rurais – não há, como se sabe, guardas florestais. Após duas grandes reformas nos serviços em 1993 e 1998, os serviços florestais locais e circunscrições florestais regionais (3 no centro) passaram a estar centralizados no ICNF [no Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas], em Lisboa.”
Nesse mesmo dia, num artigo de opinião, o geólogo Micael Jorge informava ainda que, entre 2001 e 2009, as matas do Pinhal tinham gerado 26,2 milhões de euros de lucros, enquanto que o valor investido fora de cerca de 2,7 milhões.
Avancemos cinco anos para chegarmos de novo ao verão de 2022, sabendo que pouco se fez para alterar este estado de coisas, por exemplo através de investimento público em serviços públicos nesta e noutras áreas. A passagem do tempo assim só piora tudo, até perante a evidência cada vez mais ululante das alterações climáticas.
A seguir ao incêndio na Serra da Estrela, o biólogo Jorge Paiva informava em artigo de opinião no Público:
“Com este devastador incêndio, resultante da incúria e incompetência de quem devia proteger o Parque Natural e Geoparque Internacional da Serra da Estrela, há animais e plantas que ficarão em elevado risco de extinção e até poderão ter sido extintas.”
E mais à frente afiançava:
“Recuso-me a utilizar a sigla ICNF (de Florestas), pois resultou de um dos maiores crimes florestais que os governantes cometeram: a extinção dos Serviços Florestais. No que resultou a ocorrência de devastadores piroverões.”
A lição é clara, mas só se virmos a floresta para lá do neoliberalismo que queima um velho Estado, também através da austeridade mais ou menos encoberta: Portugal é dos países com menos funcionários públicos, em percentagem do emprego total, no mundo desenvolvido, é um dos países europeus com menor percentagem de propriedade pública na floresta e regista o nível de investimento público mais baixo da UE.
E não será este Governo que alterará este estado de coisas, definitivamente. Sobram a propaganda e o relativismo, realmente.
O esforço posto na 'assistência psicológica' e não sei quantas mais assistências a um povo declarado 'coitadinho' e submetido a leis que tudo toleram e a impostos que tudo saqueiam, conduziu a que, pela mão de imbecis, governar se tenha transformado na arte de justificar desastres e formular promessas.
ResponderEliminarSobre a dimensão da AP
ResponderEliminarhttps://expresso.pt/economia/2022-08-25-Medina-nomeia-a-sua-antiga-chefe-de-gabinete-em-Lisboa-para-a-empresa-estatal-Estamo-56498e2c
Manuel Carvalho e os restantes neoliberais nunca abandonam os seus preconceitos neoliberais.
ResponderEliminarA utilização da indignação e de uma suposta consciência social faz parte do repertório dos neoliberais.
Tal como Mark Fisher escreveu no seu livro "Realismo Capitalista" os neoliberais até são capazes de reconhecer os problemas mas não querem soluções para eles, afinal, "Não Há Alternativa".