segunda-feira, 29 de junho de 2020

Quase lá, mas ainda longe: porque precisamos de um imposto digital?

Google, Facebook, Amazon, Netflix, Apple ou Microsoft são algumas das empresas mais presentes no nosso dia-a-dia. São também as que têm registado mais ganhos desde o início da pandemia, devido às medidas de confinamento e às alterações das rotinas de trabalho e socialização. Além disso, estão ainda entre as empresas que menos impostos pagam: algumas estimativas apontam para que, entre 2010 e 2019, estes seis gigantes digitais tenham poupado mais de 100 mil milhões de euros devido a esquemas legais para evitarem a tributação.

Pode parecer estranho, mas é essa a tendência dos últimos anos. Numa entrevista à Visão, Pascal Saint-Amans, o diretor do Centro de Política e Administração Fiscal da OCDE, destacou o caso da Netflix, que “normalmente não tem trabalhadores nem escritório onde tem consumidores, como Portugal ou França”, para defender que os gigantes digitais devem ser sujeitos a tributação direta. Saint-Amans deixou uma pergunta no ar: “Onde é criado o valor da Netflix? Na Califórnia, onde estão as pessoas que fazem a programação e concebem as séries ou em Portugal, onde estão as pessoas que veem?”.

Esta é uma das questões mais complicadas. Apesar de aparentemente não pagarmos pelos serviços fornecidos pelo Facebook ou a Google, a verdade é que somos a sua fonte de receitas principal. A razão para isto prende-se com a importância da informação que os utilizadores fornecem às empresas sobre os seus interesses, preferências e hábitos de consumo e de lazer. A informação é crucial para o modelo de negócios destas empresas, que registam enormes lucros com os serviços de intermediação (casos da Uber ou do Airbnb), publicidade online personalizada e transação de dados (como no caso do Facebook e da Cambridge Analytica). A The Economist não se enganou quando classificou a informação como “o petróleo dos dias de hoje”.

Embora operem um pouco por todo o mundo, tem sido difícil estabelecer um sistema de tributação eficaz sobre os gigantes digitais. Em 2017, os ministros das Finanças de França, Alemanha, Espanha e Itália defenderam um “imposto harmonizado sobre o volume de negócios gerado na Europa pelas empresas digitais”. A Comissão Europeia viria a avançar com duas propostas nesse sentido: uma de curto prazo, para criar uma taxa de 3% sobre serviços digitais, e outra de longo prazo, com o objetivo de rever o conceito de “estabelecimento estável” (tradicionalmente utilizado para efeitos fiscais e que liga tributação das empresas ao local onde a atividade é fisicamente desenvolvida) e incluir uma componente relacionada com a “presença digital significativa”. No entanto, não foi suficiente para superar a oposição da Holanda, Irlanda e Luxemburgo, paraísos fiscais que a União Europeia se recusa a reconhecer dentro de portas.

Depois de a OCDE ter anunciado a intenção de 129 países chegarem a acordo sobre um imposto digital até ao final do ano e de alguns meses de trabalho, os EUA anunciaram recentemente a sua saída das negociações. O anúncio controverso motivou protestos de outros países – Bruno Le Maire, ministro das Finanças francês, considerou-o uma “provocação” – e reacendeu o debate sobre a tributação dos gigantes digitais.

No Financial Times, Martin Sandbu foi lapidar: “O atual sistema para evitar a dupla tributação de atividades empresariais transfronteiriças foi desenhado para um mundo que já não existe”, sendo certo que “apenas a inércia e o lobbying empresarial o mantiveram até agora.” O problema de fundo, para Sandbu, é a facilidade com que as multinacionais podem alterar a sua sede para países ou estados onde as taxas efetivas de imposto são mais baixas. O facto de poderem operar em múltiplos países sem precisarem de uma presença física dificulta a tributação e leva à perda de receita nos países onde a atividade é desenvolvida. Exemplo disso é o estudo de Gabriel Zucman, Thomas Torslov e Ludwig Wier, que estimaram que os EUA e as principais economias da Europa perdem entre 14% e 28% da receita fiscal do setor empresarial devido às práticas de transferência de lucros para outras jurisdições. E isso tem uma consequência: menos receita fiscal implica menos financiamento dos serviços públicos ou mais impostos para o resto da sociedade.

O cenário é pouco auspicioso, já que a elisão fiscal está longe de ser um fenómeno pontual. Em 2017, dois investigadores do FMI, Philip Lane e Gian Milesi-Ferretti, olharam para os fluxos internacionais de capital e procuraram perceber as principais tendências. Os autores focaram-se no Investimento Direto Estrangeiro (IDE), o tipo de fluxo considerado mais desejável pelos países, por estar associado a investimentos de longo prazo, transferência de tecnologia e conhecimento do exterior e ser mais estável do que os investimentos de carteira. No entanto, o cenário encontrado por Lane e Milesi-Ferretti foi bem diferente: boa parte dos fluxos de IDE constituía investimento “fantasma”, isto é, movido pela engenharia financeira do setor empresarial.

A investigação recente do FMI e da Universidade de Copenhaga confirmou esta tendência e estimou que mais de 1/3 dos fluxos de IDE (cerca de 15 biliões de dólares) “passam por empresas fantasma vazias” sem qualquer “atividade empresarial real”, de acordo com os investigadores. Os principais beneficiados são a Holanda e o Luxemburgo, que recebem quase metade do investimento fantasma identificado pelo estudo. Alex Cobham, da Tax Justice Network, esclareceu que práticas como a transferência de lucros se tornaram dominantes na economia global: “É simplesmente a forma de fazer negócios hoje em dia”.

Sem surpresa, o objetivo das empresas é pagar o mínimo possível em impostos. Daí que a criação de um imposto digital internacional seja tão importante: é o que permite travar a corrida para o fundo na tributação das empresas e a perda de receita para paraísos fiscais. Numa altura em que pandemia fez disparar as necessidades de financiamento dos Estados, pode ser que o contexto ajude a forçar um debate sério sobre o papel da política fiscal nas nossas sociedades. Há quem diga que nunca se deve desperdiçar uma boa crise.

13 comentários:

  1. em época de crise criar um imposto sobre a actividade digital no caso da netflix significa um agravamento de custos sobre os consumidores no caso da google ou do facebook não sei como poderia ser aplicado um imposto justo, no caso das necessidades de financiamento dos estados cheira-me que vem aí uma época de austeridade sem precedentes

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  2. Asno lundgren cheira-lhe. E apressa-se a vir defender os interesses do Capital digital.
    Não é por nada que está na Holanda,curiosamente um dos paraísos fiscais aqui denunciado. E um dos entraves ao imposto fiscal
    O cheiro de João Pimentel Ferreira começa a ser inconfundível

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  3. "(...)apenas a inércia e o lobbying empresarial o mantiveram até agora(...)"

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  4. A Europa tem vários anos de políticas sociais, de esquerda e anti-liberais, contrárias à livre iniciativa privada e com uma regulamentação excessiva. Não admira que passados estes anos não haja um único gigante tecnológico com origem na UE. Nem um único, estão todos nos EUA e na Ásia. Resta o que resta aos socialistas e àqueles que ficam por baixo sem gerar riqueza: taxar a atividade lucrativa dos outros.

    Quando diz que “Onde é criado o valor da Netflix? Na Califórnia, onde estão as pessoas que fazem a programação e concebem as séries ou em Portugal, onde estão as pessoas que veem?”. Não é óbvia a resposta? Onde é criado o valor da BMW? Na Alemanha onde o veículo é desenvolvido e montado, ou em Portugal onde é comprado? Além disso o IVA, de acordo com as normas comunitárias, já é pago no país de residência do consumidor, e por isso estas gigantes entregaram aos estados membros da UE milhares de milhões em impostos em sede de IVA.

    Querem agora que todos os impostos sejam pagos no país de residência dos consumidores? Quando uma empresa portuguesa exporta uma bicicleta para Espanha, deve pagar proporcionalmente parte do seu IRC em Espanha, porque tem lá clientes?

    Como europeísta não sou contra este imposto digital porque na prática é uma medida de protecionismo europeu contra as políticas de Trump ou da China. Mas é pena que a medida de recurso seja, em vez de criar valor acrescentado, a mesma de sempre: taxação.

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  5. E este blog tem desde o seu início este joão pimentel ferreira a fazer aquilo que se vê quotidianamente.

    (E ainda por cima a pedir batatinhas assim deste jeito mole e acobardado.
    Este asmo lundgren é o próprio JPF que nem coragem sequer para o desmentir).

    O resto é a "idiotice" própria de alguém que apareceu por aí montado na segunda derivada, a tentar mostrar que Passos Coelho era o campeão do combate ao desemprego. As gargalhadas ainda ecoam lá na sede dos "liberais" do género. Um zelota é um zelota e é um zelota. E o que é a mais, só mesmo alvo de gozo.

    Vejamos como JPF começa:
    "A Europa tem vários anos de políticas sociais, de esquerda e anti-liberais, contrárias à livre iniciativa privada e com uma regulamentação excessiva".

    Só mesmo um entusiasta confesso do Chile de pinochet pode dizer esta idiotice

    Políticas de esquerda não as vê esta Europa há muito.Se as visse JPF estava agora por aí a pedir um passaporte para os EUA ou para a Colômbia, para um sítio onde a mão invisível dos mercados pudesse continuar o saque da forma desavergonhada como o faz. E para onde pudesse continuar a elogiar as políticas sociais de Hitler (como já o fez)

    Depois estamos já todos fartos deste paleio próprio de. Olhem como ele arranja uma justificação ( à pimentel ferreira) para a ausência de gigantes tecnológicos na UE. Olhem como mete a viola no saco e nem uma palavra sobre as verdadeiras causas da estagnação europeia.Mas olhem como se cala com o exemplo chinês,esse sim com muitos anos de políticas sociais, contrárias à livre iniciativa privada segundo os moldes dos neoliberais de pacotilha e com uma regulamentação excessiva, de acordo com os mesmos moldes.

    A Ásia é muito grande e pode ser que assim passe. Os ilusionistas são assim. Mestres nessa coisa da pantominice

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  6. A fraude continua.

    Parece que os gigantes digitais não devem pagar os impostos pelo facto de já terem pago muito.

    Digam lá se isto não parece mesmo aqueles tipos a justificar a fuga aos impostos do Dono disto tudo? Porque já pagara muito.
    Nasce assim para estes cúmplices um conceito novo de taxação. Se já pagou "muito", está perdoado. Tem direito a isenções fiscais. A confirmar a máxima destas coisas.Quem rouba um euro é condenado, quem rouba um milhão recebe um convite da Holanda para depositar num paraíso fiscal

    E o que é relevante?
    Aquilo pelo qual JPF passa com o silêncio próprio dos comprometidos com.

    " Além disso, estão ainda entre as empresas que menos impostos pagam: algumas estimativas apontam para que, entre 2010 e 2019, estes seis gigantes digitais tenham poupado mais de 100 mil milhões de euros devido a esquemas legais para evitarem a tributação"

    E JPF, como bom neoliberal que se preza acha bem e bate palmas.Os coitados já pagaram muito.

    Pode ser que Arranjem um emprego, pode ser nessa empresa, Com certeza, Ele dava conta do recado,E pra eles era um sossego

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  7. O resto está quase tudo no texto de Vicente Ferreira e basta voltar a lê-lo.

    Já agora sublinhar o papel da Holanda nisto tudo, referido no texto aí em cima e a confirmar o passado e o presente da Holanda. Esta começou por receber de braços abertos as tropas do Reich em 1940. Era a então "ocupação suave"(Soube-se em 2008 que os alemães tinham pago uma recompensa aos funcionários policiais e administração holandeses para localizar e identificar os judeus. E aqueles esmeraram-se).
    Já na actualidade este país pariu ministros absolutamente boçais, bem representativos da escória neoliberal que ocupa os lugares de topo desta UE pos-democrática.

    JPF sente-se bem lá, depois do seu percalço com as patentes. Como "bom" neoliberal, a jogar de forma desonesta como o faz quotidianamente.E a demonstrar que também nesse terreno,da ética e dos princípios, estes neoliberais são mesmo uma fraude


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  8. O gigantismo digital criou-se em boa medida adquirindo muito do que na Europa dos pequeninos foi sendo criado na área digital.

    A questão essencial é saber-se porque essa acumulação de saberes não acontece no ambiente europeu e sempre tem acolhimento noutros lugares.
    Na Europa só o gigantismo do Estado tem lugar.

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  9. Pobre jose

    "Na europa só o gigantismo do Estado". O outro falava na "Europa com vários anos de políticas sociais, de esquerda"

    Dois comentários breves:

    - Para quem defendia o gigantismo do Estado português à época vergonhosa do salazarismo, não está mal.Com as colónias atrás e o cotejo de mortes e sofrimento, para onde a canalha iria arrastar os povos envolvidos.
    (O estado fascista e colonial seria assim para Jose, uma "outra coisa".
    Mudam-se os tempos, muda-se a verborreia)

    - Para quem vê gigantismo do Estado na Europa o que se pode recomendar é a substituição por lentes mais adequadas. O que se vê é o gigantismo das grandes empresas que colonizam os interesses dos Estados e dos povos. Sob o império do Euro.E é ver os estados sucumbirem ao gigantismo da mão invisível dos mercados

    Ainda por cima com fugas desta índole ao fisco, como aqui denunciado


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  10. JE, deixemo-nos de verborreias e veja a carga fiscal total na Europa e EUA.

    http://www.crfb.org/sites/default/files/OECD%20Tax%20Revenue.png

    Os números servem exatamente para queimar a gordura subjetiva do debate

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  11. Um não assumido desonesto de nome joão pimentel ferreira, portador de uma série de nicks e que entra por aqui adentro com o à vontade dos vendedores da banha da cobra, quer que lhe dêem trela.

    Asmo lundgren serve-lhe de introdução para a candonguice. O próprio vem aqui pressuroso a tentar passar por gente séria

    E para o atestar,agita-se e agita. E puxa de um site, assim a modos que um trumpista a declinar a ronha dos impostos.

    Já conhecemos a canção do bandido

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  12. A propaganda neoliberal tem destas coisas. Tenta fazer passar por boas, o que de facto o é, só na cabeça de fundamentalistas neoliberais e de trumpistas escondidos

    Ficará para mais tarde uma análise da função social da tributação fiscal.

    "Total US tax revenue equaled 24 percent of gross domestic product, well below the 34 percent weighted average for other OECD countries.Total US tax revenue equaled 24 percent of gross domestic product, well below the 34 percent weighted average for other OECD countries.

    US taxes are low relative to those in other high-income countries (figure 1). In 2018, taxes at all levels of US government represented 24 percent of gross domestic product (GDP), compared with an average of 34 percent for the other 35 member countries of the Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD).

    Among OECD countries, only Chile, Ireland, and Mexico collected less tax revenue than the United States as a percentage of GDP. Taxes exceeded 40 percent of GDP in seven European countries, including France, where taxes were 46 percent of GDP. But those countries generally provide more extensive government services than the United States does."

    Isto é duma publicação anódina e mais actual que os numerozinhos do pobre pimentel ferreira

    Porque o que este jpf faz é pura demagogia e canhestro jogo de palavras. Os números ,ao contrário do que quer fazer crer, precisam sempre de ser contextualizados.

    A gordura subjectiva do debate assumida involuntariamente por jpf parece que vai cair em cima dele, cobrindo-o da cabeça aos pés. Parece que jpf quer-nos fazer crer no paraíso terrestre que é o méxico.Ou os serviços de saúde nos EUA

    Confirma-se assim que jpf foge do debate e aldraba. De facto nem uma simples palavra para a enorme fuga fiscal. Agita números sobre a carga fiscal. De forma estranha e com o despudor de um jpf

    Com dois pormenores deliciosos:

    -De repente a questão foge do "eles já pagaram muito, não devem agora pagar mais" para um "eles pagam muito pouco" pelo que não devem pagar mais"

    E no espaço de dois dias o mesmo sujeito que afirmava isto:
    "Como europeísta não sou contra este imposto digital porque na prática é uma medida de protecionismo europeu contra as políticas de Trump ou da China."

    Sai agora à liça em prol dos impostos made in USA

    Este tipo para além de tudo aquilo que é, é também um enorme aldrabão



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