sexta-feira, 20 de março de 2020

Proto-qualquer coisa

"Nós tivemos uma crise tremenda depois de 2011. Mas agora nada se compara com isto (...) De um momento para o outro, pode haver uma disrupção qualquer na nossa vida colectiva, que seja organizada, perpretada por um indivíduo, por um conjunto de indivíduos ou por um grupo, para o qual o Estado tem de ter resposta constitucional, jurídica."

Quem afirmou estas palavras ontem, na televisão pública, não é um deputado de extrema-direita. É, sim, director de um dos jornais de referência nacionais - o jornal Público. E é jornalista.

Manuel Carvalho não é um neofascista, mas o que disse pode representar uma deriva de uma certa intelectualidade neoliberal, favorável a uma normalização do regime de excepção, não se sabe muito bem contra quem - "um indivíduo, um conjunto de indivíduos ou um grupo" -, embora se saiba em que sentido: vivêmo-lo em 2010-2014 e ainda sofremos por isso.

O Manuel Carvalho não pensa verdadeiramente isso. Mas há outros que pensam mais do que ele. É o caso de constitucionalistas até na bancada socialista ou de Paulo Otero que defende a necessidade neoliberal de um estado permanente de emergência, a coberto dos efeitos da crise sanitária:
"seria conveniente que, cada um de nós, além de limitado na sua liberdade de circulação, introduzisse medidas de autocontenção e reforço da solidariedade – os tempos do desperdício e da abundância [de quem?] podem também estar suspensos, eventualmente até por um período muito superior à declaração formal de estado de emergência, sem que se saiba com certeza se regressam tão depressa. Ninguém duvide que a presente crise de saúde pública vai gerar uma crise económico-financeira e ambas estarão na base de uma previsível (e dramática) crise social: desemprego, miséria e até desordens podem suceder-se, num cenário de progressiva conflitualidade, suscitando a eventual necessidade da intervenção das forças de segurança ou mesmo de militares para garantir a segurança de pessoas e de bens".
O que é isto? O que se pretende é um salto na História:


"O mundo, tal como o conhecemos até fevereiro, pode-se ter eclipsado e a responsabilidade não será, por certo,da presente declaração do estado de emergência".

Na verdade, o Estado de Emergência pode redundar num proto-golpe de Estado - já legitimado pelos peritos da Constituição - que coloca o Presidente da República ao leme do decreto, de 15 em 15 dias. Aquilo que não conseguem no Parlamento, estão a querer que o seja - como frisou Marcelo Rebelo de Sousa (MRS) - com a força que lhe advém de ter sido eleito pelo voto directo dos portugueses.

Teixeira da Mota desdramatiza o decreto do PR, mas sublinha várias vezes que "cabe-nos estarmos atentos". Não é de estranhar, pois, que António Costa se tenha distanciado de imediato de Marcelo na sua declaração na conferência de imprensa de ontem:
"Algumas das disposições constantes do decreto são claras e exequíveis por si próprias não carecendo de regulamentação: é o caso daquelas que suspendem o direito à rebeldia ou o direito à greve em sectores essenciais".
E tenha desdramatizado a situação, ridicularizado o decreto presidencial, ao tornar um drama numa farsa. Ao ponto a que chegámos! E as forças que Marcelo está a libertar.

Mais uma vez me vem à memória aquela triste figura a subir à tribuna do Parlamento com um cravo na mão, sem nunca o colocar na lapela.

PS: Leia-se os esclarecimentos prestados pelo porta-voz da PSP ao jornal Público:
Ao PÚBLICO, o porta-voz da PSP, o intendente Nuno Carocha, admite que foram ponderados os pormenores da primeira foto como o sobrolho carregado dos agentes e o tom cinzento. E que são propositados. Pretendem passar uma ideia de “resolução, determinação”. “Quisemos dar sobriedade e solenidade ao momento, porque é a primeira vez que o país se encontra em estado de emergência. E daí a formatura, com um oficial em comando, mostrando a predisposição, ordenada, para resolver as situações. A espada, que nem é a nossa arma típica, é o instrumento que simboliza o comando na formatura”, descreve o intendente.

9 comentários:

  1. Os neoliberais não são fascistas... Mas como eles criam as condições para o surgimento do Fascismo, até parece que o fazem de propósito!...

    E porque será que o santo neoliberal Milton Friedman era amigo de fascistas, como é o caso de Pinochet?

    Acham mesmo que é coincidência?

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  2. E temos o caso da comunicação social Portuguesa que colabora com toda a esta situação, difundindo notícias falsas sobre o número de mortes em Itália provocados pelo Covid-19, como é o caso da Rádio e Televisão de Portugal (RTP) que é paga com o dinheiro dos cidadãos, e que se está a colocar num papel que só a vai prejudicar como entidade:

    - «...O caso mais grave é o de Itália, onde já morreram mais pessoas do que em toda a China. São 3405 mortos, num total de 41.035 infectados...» - RTP
    https://www.rtp.pt/noticias/mundo/italia-e-o-pais-com-mais-mortes-por-coronavirus_v1213830

    Na verdade o número de vítimas mortais por Covid-19 estava apontado para 12 em Itália de acordo com o Instituto Superior de Saúde italiano, conforme noticia o jornal «La Stampa»:

    - Coronavirus, l’Istituto Superiore di Sanità: “Solo 12 le persone decedute senza patologie pregresse”
    https://www.lastampa.it/cronaca/2020/03/18/news/coronavirus-l-istituto-superiore-di-sanita-solo-12-le-persone-decedute-senza-patologie-pregresse-1.38605276

    No entanto houve um erro na redacção do relatório sendo que o número efectivo de vítimas mortais por Covid-19 em Itália é de 3 mortes causadas pelo vírus e não de 12, conforme aponta o comunicado do Instituto Superior de Saúde italiano:

    - Comunicato Stampa N° 22/2020 Coronavirus: in media 8 giorni tra sintomi e decesso, terapia antibiotica la più utilizzata
    https://www.iss.it/web/guest/primo-piano/-/asset_publisher/o4oGR9qmvUz9/content/id/5304852

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  3. Sempre ficaria bem que, em vez de lançar suspeitas conspiratórias sobre tudo que mexe, se fizesse uma análise de casos como método de avaliação das consequências deste desastre:

    Um estabelecimento é encerrado por estar destinado a atendimento público sem cumprir os critérios de serviço essencial:
    - Receita para o período = zero
    - Renda do estabelecimento ou IMI = por inteiro
    - Água e luz = mínimos
    - Segurança, manutenção e outros custos fixos = os que houver
    - Salários ao pessoal = 25,5% (20% do valor mensal+ o proporcional de férias, subsídio,13º)
    - encargos resultantes da não suspensão de pagamentos
    - provável obsolescência/quebra de valor dos stocks
    - baixas expectativas no retorno à actividade
    - se tiverem que despedir desde já ou após o lay-off, acrescem custos de indemnização

    Os que tiverem que demonstrarem que já estão desgraçados, agravam tudo isso pelo tempo da sangria de 40% à receita.

    Se considerarmos:
    - Que a milagrosa recuperação pela Nova Economia se fez pela inovadora rota das "lojas e lojinhas, tascas e tasquinhas",
    - Reconhecido que capitais próprios negativos é prática generosamente acolhida nas leis da República para as empresas portuguesas, as portas que se vão abrir em liquidação… são o primeiro passo no novo milagre que cedo se anunciará.

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  4. O que distingue Marcelo de Cavaco é a "finesse" do 1º. Cavaco nunca usou o cravo vermelho, e empossou contrariado o Governo minoritário do PS. Marcelo já disse que esta não seria a solução que apadrinharia. Mas ambos estão de acordo: dar a mão ao PSD e reconstituir o velho arco ps/psd, com outra muleta alternativa que pode não ser o CDS. O psd/cds com Cavaco, Coelho e Portas ao leme governaram contra a Constituição, violando-a sucessivamente. Marcelo foi mais longe, na esteira de Ferreira Leite: conseguiu suspender para já e parcialmente a Constituição com a declaraão do estado de emergência, renovável cada 15 dias.

    Por alguma razão a declaração do Estado de Emergência foi apoiada pela UGT, pelas Confederações do Grande Patronato, pelo PSD, pelo CDS de Chicão, pelo Chega, de Ventura, com o voto contrariado de parte do PS Mistério é o papel do Bloco no embrulho!

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  5. Ainda um pouco de calma!
    Então o fascismo vai regressar,sob a batuta do M.Carvalho ? Mas que cena ! Sem obra publicada,com aqueles linguados mixurucas do Público,sem saber qual é a sua mão direita,sem saber marcar passo,injustamente acusado de ser jornalista,um homem destes vai tomar o poder,pôr a Constituição em cacos,fazer fugir o da oportuna quarentena,fazer passar â clandestinidade o Costa?
    Alguém,parafraseando Alberto Pimenta e o seu obrigatório "Discurso sobre o Filho da Puta",obra cuja leitura é obrigatória para todos,afirma que basta surgir o Primeiro Filho da Puta para de imediato se mostrar o cardume dessa espécie, até então submersa.
    Ainda assim não os vejo,aos Filhos e filhos da Puta a olharem nos olhos do Salgueiro Maia futuro que,em tempo,os fitará

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  6. E se os militares e forças policiais tomarem o lado dos insurretos?
    O que vão fazer os neoliberais?
    Queimar as sedes do PCP?
    Assaltar os paióis de tancos?
    Mandar tocar a rebate, para o povo trazer as enxadas?
    Quem?
    Os idosos acamados nos lares?

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  7. Caro figueiredo,

    O mesmo jornal confirma o valor relatado pela RTP.
    https://www.lastampa.it/cronaca/2020/03/20/news/l-aggiornamento-della-protezione-civile-4032-morti-quasi-38-mila-i-casi-totali-1.38617133

    Caro Jose,
    Se ouvir hoje o primeiro-ministro, ao anunciar as medidas de emergência, compreenderá a importância da medida de manutenção dos postos de trabalho. Mesmo que com apoio público.

    Caro Abraham,
    Não consegui deixar de lançar uma gargalhada com o seu texto. Tão-pouco vejo a iminência do que assinala. Apenas vejo os sinais. E assinalo os sinais. São eles relevantes? São eles significativos? Não sei. Mas convém estarmos atentos. Foi só isso. E chamar a atenção do Manuel Carvalho, que conheço bem, para que não se deixe levar pelo cantos das sereias...

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  8. Caro João

    Ouvi o 1º ministro.
    Só ouço falar em linhas de crédito; isto significa o seguinte:
    - Fechas a porta, aguentas o emprego, suporta os prejuízos e dou-te a oportunidade de pôr o que te venha a sobrar do teu capital a trabalhar, um dia destes, para pagares o que te vou empresar um dia destes; vai fazendo contas de 15 em 15 dias, e logo vemos onde vamos parar; quando abrires a porta tens provavelmente pela frente uma crise e o mesmo pessoal.
    - Em alternativa, entra em falência, e do que te sobrar, faz o que quiseres.

    Uma falência bem negociada é muito provavelmente a melhor opção.

    A pergunta óbvia aos defensores dos trabalhadores é esta: se para as empresas encerradas o lay-off fosse subsídio de desemprego aos trabalhadores, onde é que isso vos ofendia os princípios?

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  9. Em paralelo, para o trabalhador a opção económica é ser posto em quarentena; é quase tornar-se funcionário público por algum tempo, o que é do melhor que se pode ter por estes lados..

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