domingo, 25 de novembro de 2018

Esqueçam as aldeias

Com a divulgação dos resultados dos próximos censos, a realizar em 2021, será possível conhecer com maior rigor a dimensão das mudanças profundas que atravessaram o país desde 2011, ano do último exercício censitário e data de início do processo de «ajustamento», que acentuou os impactos da crise iniciada em 2008.

Uma dessas transformações diz respeito à mais que provável intensificação do processo de desertificação do interior, aprofundando as tendências registadas entre 2001 e 2011. Isto é, com os aumentos de população a circunscreverem-se às NUT das áreas metropolitanas e do litoral norte e Algarve (com valores entre 1 e 13%), e com as restantes a registar perdas em regra superiores a 2% e que chegam a atingir valores próximos dos 10%.

Sendo generalizada a tendência, neste período, para o aumento da concentração da população em cidades (com os residentes em núcleos urbanos a passar de 38 para 42%), nas NUT com perdas demográficas registam-se situações em que esse processo de concentração vem acompanhado de uma perda muito significativa (acima da média nacional) de população a residir em lugares com menos de 2 mil habitantes. É o caso, nomeadamente, das NUT do interior norte e centro e do interior do Alentejo e do Alto Minho. Ou seja, regiões em que o declínio demográfico é acompanhado por processos de crescimento urbano, à custa de lugares de menor dimensão, numa espécie de autofagia territorial que foi salvando os núcleos urbanos destas regiões.

Estamos a falar, sublinhe-se, das mudanças ocorridas entre 2001 e 2011, importando agora conhecer o que aconteceu desde então. Uma das hipóteses que se pode colocar é a de que na última década se possa ter esgotado a capacidade de atração de população rural para as cidades e vilas de muitas destas regiões do interior e que portanto a tendência de declínio comece a atingi-las também. O que significa que o desafio do combate à desertificação e aos desequilíbrios regionais já não passa pela revitalização humana dos espaços rurais, mas apenas, se ainda for possível, das próprias cidades e núcleos urbanos.

15 comentários:

  1. Acompanharia todo o texto até à penúltima frase. Mesmo que a hipótese levantada no último parágrafo se verifique, tal não significa que, no interior, apenas as cidades mereçam o desenvolvimento de políticas que promovam a fixação de populações. Isso significaria - agora sim - apenas tentar estancar a migração para o litoral centro/norte a oeste e para o sul (e nem me refiro à emigração, de que se apurará a extensão nos censos de 2021, após um período em que pode ter havido um regresso, mesmo que ligeiro). Seria, no fundo, a gestão de um sintoma e não a resolução da causa. O que implica que, de facto, o que é necessário é procurar dotar o interior, na sua totalidade e não só nos centros urbanos, de condições para que o movimento se inverta. O problema, claro, é saber como.

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  2. No outro dia, numa das minhas caminhadas por caminhos rurais encontrei um homem a cortar à machadinha uma acácia já seca. Palavra puxa palavra, agora os proprietários das terras até agradecem que se apanhe a madeira seca. É menos combustível para o incêndio seguinte. E não há nada que se possa fazer que dê rendimento. O mais rentável são pomares que só empregam gente na época da colheita e nuns quantos tratamentos fito-sanitários por ano. E de que é que um trabalhador ou agricultor vive nos outros 10 meses? Tudo o resto que se possa fazer fica mais caro do que ir buscar à prateleira do supermercado.

    Isto para dizer que o mundo rural está fechado num ciclo de baixas rentabilidades que são em grande parte devidas a importações maciças de países longínquos de produções de agricultura industrial com salários ainda mais miseráveis que os nossos.

    Nadar contra a corrente pode dar péssimos resultados. E quando os recursos são escassos, mesmo que se saiba que essa escassez é engendrada artificialmente, convém aplicá-los prudentemente.

    As aldeias são de facto para esquecer porque não têm o perfil adequado às necessidades de formação e emprego da nossa população. Isso não nos exime de planear uma ocupação do território. Mas como?

    Tenho uma certa curiosidade de perceber qual terá sido a evolução de uma povoação como Idanha-a-Nova, na qual foram feitos avultados investimentos em infraestruturas e que teóricamente oferece uma boa qualidade de vida aos seus habitantes. Mas será que o número e qualidade do emprego acompanhou os investimentos feitos?

    Por outro lado o êxodo para as cidades não foi, a meu ver, acompanhado da criação de emprego qualificado em empresas que tirem partido da densificação urbana. Por isso sou muito céptico quanto a uma tal densificação enquanto nos fôr vedado enquanto país o acesso a indústrias de alto valor acrescentado que tirem partido da concentração de mão de obra qualificada que tal densificação propicia.

    Enfim, apenas algumas reflexões assim a esmo.

    S.T.

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  3. A culpa da desertificação do interior do país é de Merkel, de Schäuble, do Euro e do Eurogrupo. É por causa destas entidades também que a pedreira ruiu em Borba.

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  4. A hipótese que é colocada do esgotamento da capacidade de atracção das povoações, cidades médias e vilas do interior que seria identificada entre 2001 e 2011,por ocasião do último censo realizado,poderá não ser uma conclusão irrealista,até porque os movimentos migratórios com origem naquelas povoações, com deslocações para as cidades das zonas metropolitanas e para fora do país, não cessaram e a renovação geracional deixou,há muito,de estar assente nas aldeias vilas e lugares de menor dimensão.

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  5. A desertificação do país é fruto da evolução dos modos de produção agrícolas. A sobreavaliação do euro face à nossa capacidade produtiva apenas agudiza o processo por expôr os produtores agrícolas nacionais a uma concorrência externa exacerbada.

    No entanto essa influência é contraditória. Porquê?

    Porque num processo sem euro a transferência para actividades de maior valor acrescentado seria a consequência natural. Com o euro a criação de empresas e emprego qualificado ficam bloqueados, gerando apenas desemprego ou emprego precário, tanto no interior como nas zonas metropolitanas atingidas por uma desindustrialização precoce.

    Quanto à pedreira de Borba, lembro apenas que a segurança é uma "commodity" que só as empresas, autarquias e estados prósperos e bem regulados podem pagar em pleno.

    S.T.

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  6. "Quanto à pedreira de Borba, lembro apenas que a segurança é uma "commodity" que só as empresas, autarquias e estados prósperos e bem regulados podem pagar em pleno. "

    Correcto, por exemplo, nos estados onde a tirania do Euro não reina, nunca caem pedreiras.

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  7. Entendamo-nos quanto aos desertos.
    As zonas em que só a densidade populacional e uma vida de miséria justificavam ser exploradas são para deixar desertas ou entregar à floresta.

    E é tão importante definir as zonas a recuperar como as zonas a abandonar.

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  8. A tirania do euro faz mal às pedreiras - será que o Cuco regressou do castigo?

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  9. É pá...vão-se lixar. A fuga do interior começou nos anos 40, e nunca mais parou! Agora vêm fazer estudos com o Euro e mais nao sei o quê. Só balelas. Quem decide em Portugal, NUNCA quis saber do interior para nada. Nem na ditadura, nem na democracia! A culpa é toda nossa, mas gostamos muito de olhar para o lado!

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  10. Haaaaa, não me desatem a língua sobre a responsabilidade da EU na queda da ponte Morandi de Génova.

    Primeiro, a EU pressionou a privatização das autoestradas italianas.

    Segundo, a gestão imprudente e gananciosa da concessionária privatizou os lucros e socializou a tragédia.

    Não é difícil de entender, pois não?

    Não se diz que tão ladrão é o que vai à vinha como o que fica de guarda à porta?

    S.T.

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  11. Vamos lá a ver se a gente se entende.

    Os processos de transferência de população de meios e ocupações agrícolas para ambientes urbanos e ocupações na indústria ou nos serviços faz parte de uma via de desenvolvimento que tem sido seguida um pouco por toda a parte.

    Tem sido assim na China, em África e em todos os países emergentes como antes já tinha acontecido na Europa desenvolvida, nos USA e no Japão.

    Se repararmos até a Espanha, aqui mesmo ao lado, precedeu-nos nesse movimento. Eu apenas esclareci dois aspectos que julgo inquestionáveis e que são particularmente importantes no caso português:

    Por um lado a esmagadora concorrência dos produtos agrícolas importados, já de si forte devido à globalização mas objectivamente agravada pela sobrevalorização do euro face à nossa economia.

    Se a nossa taxa de câmbio implícita ou REAL é +- 40% abaixo do euro isso significa que os preços dos produtos agrícolas importados têm um desconto de igual valor, o que, reafirmo, exacerba a desvalorização do trabalho agrícola e torna não rentáveis muitas explorações e culturas.

    Por outro, ao encorajar o consumo em detrimento do investimento, o euro entravou esse processo de concentração urbana que seria normal e até desejável.
    Por que haveriam as cidades de "perder atractividade" senão por efeito de estagnação a nível empresarial e de criação de emprego?

    Se alguém tem alguma interpretação alternativa que a exponha em termos racionais, mas recuso liminarmente balelas do tipo "A culpa é toda nossa". Quem quiser que se vá auto-flagelar para o raio que o parta.

    S.T.

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  12. O comentador ST está correcto, as pontes só começaram a cair a partir de 2002, data da entrada no Euro. E o desastre Ferroviário de Moimenta-Alcafache, o maior da história do país, onde morreram 150 pessoas, é culpa de Merkel, de Schäuble, do Eurogrupo e da tralha pafista, que definhou a ferrovia nacional para cumprir as metas do défice.

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  13. Ora bem, cá temos a figura de estilo do "straw man", desta vez pela pena de um autointitulado Dr. Cunhal talvez para jogar com condicionamentos antigos de pessoal do PCP ou semear a confusão.

    Seja como fôr atribui-me afirmações que não fiz e portanto sou forçado a denunciar a fraude.

    Portanto, queira ir fazer companhia ao Sr. Ricardo Silva e quiçá flagelarem as costinhas um do outro.

    S.T.

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  14. A questão dos preços agrícolas ilustra bem o efeito de uma moeda sobreavaliada na economia real.

    A curto prazo é excelente. As mercadorias importadas são super-baratas, o consumo dispara e anda toda a gente satisfeita.

    Enfim, toda a gente não, porque os produtores nacionais vêm as suas margens esmagadas se quiserem vender, vão à falência ou deixam simplesmente de produzir. Em todo o caso ninguém no seu perfeito juízo vai investir. Para quê, se depois não se consegue ter preços competitivos?

    É por isso que uma moeda sobreavaliada é uma maldição para um país. Destrói todo o sistema produtivo e os consumidores que a princípio ficaram todos satisfeitinhos da silva vêem-se desempregados e incapazes de consumir.

    É o que se chama serrar o ramo da árvore no qual se está sentado.

    S.T.

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  15. Para uma abordagem genérica sobre as relações entre salários, produtividade, localização, densidade urbana e desenvolvimento este "paper" fornece um quadro de análise que me parece consistente numa leitura em diagonal:

    https://www.nber.org/papers/w23279.pdf

    Há também algumas considerações que se podem fazer em relação ao caso português.

    Políticas industriais que favoreçam a concentração empresarial podem ter um efeito devastador em ambientes, ou melhor, em unidades territoriais que não tenham a necessária densidade urbana para suportar o tamanho de, por exemplo, uma grande unidade industrial.

    Mesmo quando grandes unidades industriais se associam a cidades de média dimensão geram-se laços de dependência que criam "monopsony", ou seja, essa grande empresa pode negociar trabalho mais barato porque é a única que o oferece localmente.

    O outro inconveniente dessa dependência é que se por qualquer razão a empresa falha, os efeitos para a cidade associada são devastadores. Exemplo actualíssimo, Oshawa:

    https://www.theguardian.com/business/2018/nov/28/general-motors-oshawa-plant-closure-employees-respond

    Portanto, para lá dos efeitos perversos do euro, Portugal tem ainda contra si uma política industrial da EU que favorece fortemente a concentração empresarial quando o tecido empresarial português não tem dimensão para competir, e além disso a distribuição urbana também é desfavorável.

    Mudanças na distribuição urbana exigem avultados investimentos, o que entra em flagrante contradição com a utilização de uma moeda sobreavaliada. Quem vai investir para produzir o que quer que seja quando importações equivalentes têm um desconto implícito de 40%?

    S.T.

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