A partir da população residente segundo a dimensão dos lugares, mostrou-se aqui que entre 2001 e 2011 a desertificação do interior do país se traduziu, a par das perdas demográficas, numa tendência para a concentração da população nos núcleos urbanos.
Ainda sem dados que permitam analisar a evolução registada desde então (os mesmos só serão conhecidos com os censos de 2021), pode contudo ter-se uma ideia da capacidade de revitalização demográfica destes territórios a partir das dinâmicas do envelhecimento entre 2011 e 2017. Para tal, o Índice de Envelhecimento - que determina o número de idosos (65 e mais anos) por cada 100 jovens (até 15 anos) - constitui um bom indicador. Quanto mais elevado for o valor obtido, maior é o grau de envelhecimento demográfico (sendo que valores inferiores a 100 traduzem a existência de uma maior proporção de jovens face a idosos).
Para a análise pretendida importa contudo considerar não só o Índice de Envelhecimento registado, mas também a sua evolução recente (2011 a 2017), de modo a identificar as regiões que, de forma cumulativa, apresentam estruturas demográficas mais envelhecidas e ritmos de envelhecimento mais acentuados, sugerindo à partida uma menor capacidade de regeneração. Cruzando as duas dimensões, verifica-se que a Área Metropolitana de Lisboa e o Algarve são as únicas que apresentam, em simultâneo, Índices de Envelhecimento (IE) e Variações do Índice de Envelhecimento (VAR) inferiores à média, seguindo-se o caso da Área Metropolitana do Porto e das NUT adjacentes (Cávado, Ave e Tâmega e Sousa), com valores abaixo da média no IE mas acima do valor médio no que respeita à variação desse indicador.
Num terceiro patamar surgem as NUT do Alentejo e a Beira Baixa, que combinam estruturas demográficas já particularmente envelhecidas em 2001 (muito acima da média) e que por isso registam menores aumentos do IE entre 2001 e 2017 (abaixo da média). Por último, as restantes NUT caraterizam-se por acumular valores de IE e de VAR acima da média, sendo contudo de destacar quatro casos de envelhecimento mais acentuado, que correspondem ao interior norte e centro (Beiras e Serra da Estrela, Douro, Terras de Trás-os-Montes e Alto Tâmega), nos quais ambos os indicadores assumem valores acima da média mais o desvio-padrão.
Estamos evidentemente perante processos que não começaram em 2001, mesmo que se tenham acentuado desde então. São dinâmicas de tempo longo, que se sedimentaram e incrustaram de forma gradual e que diferentes políticas (ou a sua ausência) não souberam até hoje reverter ou atenuar, sendo ilusório pensar que a natalidade será suficiente para resolver o assunto. Aliás, sobre o processo de desvitalização progressiva destes territórios é de leitura imprescindível o ensaio de «geografia emocional do interior» de Álvaro Domingues, no Público do passado fim-de-semana.
Tenho curiosidade acerca da forma como a desertificacao do interior e acompanhada pela evolucao dos precos do imobiliario.
ResponderEliminarOlho para os anuncios em agencias espanholas, e ha imensa variedade em quantidade, qualidade e preco. Olho para os equivalentes lusos, e parece-me que so quando a casa deixa de ser habitavel e que aparece a venda por menos de 30 ou 40 mil euros. Arrendar? so em estado novo ou quase novo.
Fico com a impresssao que ainda ha muito a ambicao de se fechar negocio so se as condicoes forem 100% ideais (e conducentes a enriquecimento subito!). Em contraste, por estas terras britanicas onde vivo, a decisao de viver a 1 hora do emprego vs 1h30 e acompanhada de poupancas visiveis no que toca a renda de casa.
Sendo certo que isto e opiniao e nao estatistica, acho que esta falta de urgencia em fazer-se negocio e tambem razao para o o envelhecimento do interior. Aqueles que se recusam a vender/arrendar nao se deveriam queixar depois da falta de vizinhos, investimentos e infraestruturas.
Uma provocação (assumida): Não são as pessoas rurais e tidas pelos "progressistas civilizados" como intelectualmente fracas, que votam nos Trumps e nos Bolsonaros? Então é deixar tudo como está. Aí "estamos" a fazer um bom serviço. É continuar.
ResponderEliminarBasta recuarmos aos incendios do ano passado que tanto preocuparam as ditas elites civilizadas da nação, para percebermos que não se quer resolver porra nenhuma do interior profundo. Os poucos (que só podem ser parvos) que ainda resistem a viver num interior onde ninguém quer saber da existencia deles (nem para votos contam...pois até nisso são insignificantes), não têm escolas, não têm hospitais, não têm estradas, não têm sequer um poder local que os defenda, pois esses também já só batem continencia ao chefe que já foi civilizado e já está à beira-mar plantado, além de vitimas dessa exclusão, acabaram a ser perseguidos e ameaçados pelo todo poderoso estado central comandado pelas tais elities civilizadas. Ai ai... houve incendios (onde sempre houve incendios), nao pode haver mais, malandros! essa malta pouco evoluida tem que limpar as matas, nem que seja à força! Multas para quem não cumprir! Abaixo os eucaliptos! Esses bárbaros provincianos que vivam do ar!
É fantastico como é q ainda há gente, que, se sujeita a isto.... O normal de facto era ninguém viver no interior, dado o tratamento "democrático" que levam por parte do todo poderoso estado central.
Caro Nuno Serra,
ResponderEliminarQuando diz "desertificação" não ficaria melhor dizer "despovoamento" ?
Cump.
MRocha
Dentro de uma zona monetária, a única forma de equilibrar assimetrias regionais é pelo investimento do estado e pelas transferências fiscais.
ResponderEliminarNa ausência de incentivos as empresas privadas procurarão as zonas onde possam maximizar as vendas e os lucros e minimizar os custos.
Como consequência, entregues a si mesmas as regiões desfavorecidas aprofundariam o atraso em relação às regiões mais desenvolvidas.
A mesma relação que existe entre as zonas metropolitanas e o interior português é a mesma que existe entre o centro da EU e as suas periferias. Com uma diferença significativa: Enquanto entre o interior e o litoral português é o mesmo povo, a mesma solidariedade, a mesma língua, o mesmo sentir e os mesmos salários da função pública, entre o centro e as periferias da EU são diferentes povos que já afirmaram taxtivamente através das suas escolhas políticas que recusavam fazer transferências para os menos favorecidos.
Logo, enquanto no seio de um país cabe ao estado fazer os investimentos e as transferências necessárias para assegurar o mínimo de bem-estar às populações do interior, o mesmo deveria acontecer no seio de uma união monetária. Como ao pedido de investimentos e transferências a resposta é "NEIN!", a zona euro deve ser dissolvida para dar a cada povo os seus devidos instrumentos monetários, vulgo, moeda.
A metodologia é diferente no que toca às regiões desfavorecidas de Portugal. Como somos todos portugueses e existem entre nós laços de solidariedade, há que estabelecer investimentos e transferências fiscais através das autarquias (por exemplo) que minorem as assimetrias regionais.
Uma tal política está em contradição com a necessidade de aumentar a produtividade através da concentração urbana, pelo que o segredo da abelhinha seria estabelecer o "mix" de medidas que dessem o melhor resultado para o máximo número de portugueses e apoiar aqueles que percam nessa barganha. ( Ver o meu comentário de 29 de novembro de 2018 às 12:01 no post Esqueçam as aldeias. )
Sou claro?
S.T.