segunda-feira, 1 de outubro de 2018
Cada vez mais desiguais
Por estes dias, a propósito de algumas iniciativas parlamentares sobre o assunto, tem-se discutido a desigualdade salarial nas empresas do nosso país. O caso não é para menos – nos últimos dez anos, a disparidade entre o topo e a base da distribuição dos salários aumentou de forma significativa.
Nesta semana, um estudo elaborado pelo Expresso revela o panorama das 18 empresas cotadas que integram o PSI-20. O estudo confirma a tendência de aumento da disparidade salarial nestas empresas: entre 2010 e 2017, os gestores de topo (presidentes executivos, ou CEO’s) viram o seu rendimento aumentar 49,7%; ao mesmo tempo, o rendimento médio dos trabalhadores das empresas diminuiu 6,2%, o que faz com que o rácio médio entre o salário dos gestores e dos trabalhadores tenha aumentado de 24:1 para 33:1 (excluindo trabalhadores em regime de outsourcing, cujos vencimentos costumam ser ainda menores). É o retrato de um país cada vez mais desigual.
O aumento da disparidade na distribuição dos salários foi acompanhado por uma diminuição do peso dos salários no PIB. A interpretação desta tendência é simples: os trabalhadores recebem uma parte cada vez menor da riqueza gerada no país. Segundo dados do INE, a parte dos salários em percentagem do PIB em 2009 era 37,4%, tendo depois diminuído até atingir o seu valor mínimo em 2015 - 34,2% do PIB (nos últimos três anos registou um tímido aumento).
Este aumento da desigualdade salarial é indissociável da evolução do emprego no mesmo período. Se é verdade que a taxa de desemprego oficial tem vindo a diminuir nos últimos anos, também o tipo de emprego criado se alterou profundamente. A precariedade tem ganho cada vez maior peso no mercado de trabalho em Portugal, tornando-se a regra entre os jovens, o que ajuda a explicar o cenário de baixos salários e fraco poder negocial dos trabalhadores.
Os empresários e os economistas ortodoxos costumam justificar o comportamento dos salários com a evolução da produtividade. Na verdade, a teoria económica dominante diz-nos que a remuneração do trabalho é equivalente ao contributo relativo dos trabalhadores para a riqueza gerada, pelo que os salários aumentam se aumentar a produtividade do trabalho. Desta forma, excluem-se da análise as relações sociais entre quem emprega e quem trabalha - relações de hierarquia, poder e capacidade negocial, influenciadas por fatores como a legislação laboral em vigor, o nível do desemprego ou o contexto político. No entanto, ao contrário da tese habitualmente defendida, os números do INE contam uma história bem diferente – entre 2009 e 2018, enquanto os salários reais estiveram estagnados, a produtividade aumentou de forma constante.
Se é difícil aplicar a tese descrita à evolução dos salários dos trabalhadores das empresas, mais difícil ainda é procurar aplicá-la às remunerações dos gestores. Neste capítulo, os aumentos verificam-se mesmo em empresas que apresentam resultados negativos.
Portugal não é, contudo, um caso isolado – na verdade, a desigualdade salarial tem aumentado na generalidade dos países mais desenvolvidos, sobretudo devido à estagnação dos rendimentos do trabalho, que já discutimos numa série de artigos anterior (aqui, aqui e aqui).
Alarmados por esta tendência, vários autores têm alertado para os efeitos negativos da desigualdade no funcionamento das economias capitalistas. Joseph Stiglitz, que recebeu o equivalente ao prémio Nobel da Economia em 2001, tem sido um dos defensores mais destacados do combate às desigualdades. Num livro que escreveu recentemente, O Preço da Desigualdade, Stiglitz defende que a crescente disparidade de rendimento entre o topo e os trabalhadores prejudica a eficiência económica, uma vez que tem um efeito de diminuição do consumo e, por isso, da atividade económica e do lucro realizado.
No entanto, os impactos da desigualdade salarial são bastante mais abrangentes. No Reino Unido, um estudo recente concluiu que os jovens com contratos precários (em particular os contratos zero-horas, com cada vez maior peso no mercado de trabalho britânico) costumam apresentar piores índices de saúde física e psicológica em relação aos restantes, além de terem maior probabilidade de desenvolver problemas relacionados com ansiedade e stress. Sociedades mais desiguais prejudicam a qualidade de vida das populações e tendem, por esse motivo, a ter um impacto negativo nos níveis de coesão social.
Apesar de ter sido recebida com a relutância habitual por parte das associações de empresários, e de a proposta apresentada pelo BE no parlamento não ter sido aprovada, a discussão dos últimos dias vai ao encontro da tendência que se tem verificado nos países mais afetados pela desigualdade, descrita neste artigo. Como só se podia esperar - afinal, esta não reflete diferenças de mérito, não aumenta a eficiência económica e não pode ser o caminho de uma sociedade democrática e inclusiva. Combater a desigualdade salarial é, por isso, do mais elementar bom senso. E quem o defende tem de ser consequente no combate.
É nas empresas e não nos decretos que há um combate a fazer.
ResponderEliminarMas esse combate começa no factor crítico da diferenciação: compromisso para com os objectivos da empresa - azia sindical consequente...
Na Venezuela, à exceção do camarada Maduro, são todos iguais!
ResponderEliminarOs factos são evidentes, e as razões são claras. Sobra a enorme hipocrisia dos que apregoam a necessidade de combater as desigualdades na nossa sociedade: o Governo e o próprio Presidente da República têm-no proclamado - mas nada se faz, antes se contraria.
ResponderEliminarMais eficaz talvez seja começar por melhorar os ordenados mais baixos, estabelecendo (calculando) o salário considerado NORMAL para um trabalhador português ter uma vida digna, e promover melhores condições para a família.
A redução das diferenças escandalosas entre os vencimentos deverá seguir o método que consiga devolver mais riqueza para a sociedade em geral.
Um post duma enorme clareza.
ResponderEliminarQue deixa logo os dois primeiros "comentadores"com os bofes na boca, a atirar para o lado
Muito bom, caro Vicente Ferreira
Percebe-se que este "jose" atire para o lado.
ResponderEliminarEle é um dos que vê desmascarada em toda a sua crueza as aldrabices que andou ( e anda) a debitar.
Quando confrontado com a escandalosa estagnação dos salários, teve o desplante de há dias vir a correr defender o indefensável.
Deste jeito pianinho:
"Suspeita-se que em algum momento será de considerar a ideia de que a subida de salários se relaciona com o aumento da produtividade".
https://ladroesdebicicletas.blogspot.com/2018/09/ha-que-debater-este-problema.html
( deixe-se para lá o estilo rebuscado de "jose", a imitar o "discurso claro e lúcido" do outro aldrabão)
Pois é. Aqui neste post de Vicente Ferreira, preto no branco, o desmontar desta treta manhosa.
Que faz Jose, tal como já tinha feito no post referido?
Parte para outra. Não dá por nada ( tal como um célebre poema que um dia tentou imitar) e de forma agastada ultrapassa as suas bacoradas, transformando-as em conversa da treta do género de treta de conversa mesmo:
"factor crítico da diferenciação: compromisso para com os objectivos da empresa", blablabla e blablabla.
Ao mesmo tempo não podia ser mais claro. Do que por aqui e por ali anda a fazer. Das suas falacias repetidas ad nauseam. Da sua terrível impotência argumentativa
Com a cereja no topo do bolo. Admire-se como, de fora irritada e pesporrenta,se atira contra os sindicatos.
Não, não é só azia. É algo mais fundo e mais entranhado.
Um outro comentário, "anónimo", de 1 de Outubro de 2018 às 10:11, refere-se a Maduro.
ResponderEliminarReconhece-se o estilo do pobre joão pimentel ferreira aonio eliphis, que à mesma hora distribuía correspondência no Observador e no Público. A nossa estimada Nádia confirmava-o.
Mas é de uma patetice atroz contrapor a este bem documentado post o seu rodriguinho habitual sobre a Venezuela.
Depois não se queixe das queixas e das atitudes lá por casa
"É nas empresas e não nos decretos que há um combate a fazer."
ResponderEliminarClaro. Como nas grandes empresas:
"entre 2010 e 2017, os gestores de topo (presidentes executivos, ou CEO’s) viram o seu rendimento aumentar 49,7%; ao mesmo tempo, o rendimento médio dos trabalhadores das empresas diminuiu 6,2%, o que faz com que o rácio médio entre o salário dos gestores e dos trabalhadores tenha aumentado de 24:1 para 33:1 (excluindo trabalhadores em regime de outsourcing, cujos vencimentos costumam ser ainda menores)"
Este tipo pensará que somos o quê?
Já vimos argumentos menos idiotas do que este a defender a "livre" "garra" dos mercados
Os salários baixos devem-se ao aumento da procura (de salário) face à oferta (de emprego).
ResponderEliminarFunciona assim. Não há volta a dar.
Os salários altos (dos CEOs, e outros) devem-se à corrupção. É que os gestores de topo são designados pelos "acionistas de referência" das SAs. Não são eleitos por maioria de capital.
Votam nesta ou naquela pessoa para CEO da Sociedade em função de negócios previamente combinados com os futuros gestores. Negócios desenhados para favorecerem os referidos acionistas.
Não me custa acreditar que grande parte dos milhões auferidos pelos gestores de topo são simplesmente oferecidos em quem votou neles... É o roubo descarado dos pequenos acionistas...
Mas desde quando o estado tem alguma coisa a ver com os salários que as empresas privadas pagam, desde de que todos sejam acima do salário mínimo instituído por lei? Já não pagam os altos salários muitos mais impostos em sede de IRS?
ResponderEliminarMas o que é que se propõe?
Seja claro Vicente Ferreira!
Sim, o que é que o Estado tem a ver com os salários? Ou a saúde? Ou a educação? Ou a segurança? Ou a habitação? Ou com o investimento privado? (Ah, espera!, se for para apoiar projectos de investimento privados já pode ter a ver...)
ResponderEliminarO que é que nós temos a ver uns com os outros?
Ainda assim, é bom saber que há quem ache que o SMN é um referencial mínimo e um instrumento do Estado para fixar esse referencial. Afinal, não é inútil. O que já não se deve colocar, obviamente, para a regulação das formas de contratação nesse mercado livre que é o da força de trabalho. É só mercado a funcionar, os sindicatos é que distorcem o mercado (oh, porra, mas assim não é só o mercado a funcionar, até fica a parecer que existe aquilo da luta de classes ou lá o que é, o que se calhar também ajuda a explicar a força que o patronato faz no sentido da desregulação... just saying...)
Pois é
ResponderEliminarMas o Estado tem mesmo a ver com o regabofe dos vampiros que por aí andam
É altura dos cidadãos tomarem nas suas mãos o seu destino. E dar uma machadada nos projectos neoliberais defendidos pelos pimenteisferreira aonio eliphis destas e doutras terras
Desaparecido o tema Maduro, temos agora a cena habitual a fingir que os DDT pagam impostos
Pela terceira vez joão pimentel ferreira tenta a sua sorte. Primeiro como anónimo fazendo o seu esterco habitual em torno da Venezuela, depois defendendo o esterco do regabofe dos vampiros que por aí andam e finalmente como "vitor" a fazer esta figura aí em cima anunciada.
ResponderEliminarEis o retrato ( feio ) da forma de actuar da seita neoliberal. Não olha a meios, não tem escrúpulos e falta-lhe coragem para se assumir
Uma perspectiva vista do ponto de vista do UK:
ResponderEliminarhttps://www.rt.com/shows/renegade-inc/379579-uk-finance-curse-suffer/
É que a maior fatia da desigualdade provém da financeirização da economia.
Prestem especial atenção aos dizeres do professor Werner, é um especialista em bancos.
S.T.