(Este é o terceiro artigo da série sobre a distribuição de rendimento nas últimas décadas. É possível ler os anteriores aqui e aqui.)
Há pouco mais de um ano, na sua intervenção no Fórum do BCE realizado em Sintra, Mario Draghi constatou que “as reformas estruturais [do mercado de trabalho] podem ter tornado os salários mais flexíveis para baixo, mas não necessariamente para cima”. A afirmação surpreende pela franqueza de quem sempre defendeu a necessidade de reduzir os direitos do trabalho – afinal, estas reformas apenas permitem a compressão dos salários em períodos de crise, dificultando o crescimento dos mesmos em períodos de recuperação do emprego.
No entanto, as reformas laborais não são um fenómeno recente. A implementação de medidas hostis à negociação coletiva, aos sindicatos e aos direitos laborais remonta aos anos 80, período no qual o monetarismo se tornou a doutrina dominante entre os governos dos países ocidentais. Com esta viragem, o objetivo de atingir o pleno-emprego foi substituído por um compromisso com o controlo da inflação e o equilíbrio orçamental, o que motivou a necessidade de conter o crescimento dos salários.
Um dos aspetos a ter em conta é a redução da importância dos sindicatos. Ao dificultar a associação de trabalhadores, através de variados mecanismos em diferentes países, a taxa de sindicalização diminuiu consideravelmente, como podemos observar no gráfico. Estas medidas tiveram, por isso, o efeito desejado – reduzir o poder da negociação coletiva.
A crise financeira de 2007-08 agravou esta tendência. As alterações à legislação laboral impostas, por exemplo, nos acordos entre a troika e os países que recorreram ao financiamento externo são conhecidas no nosso país: facilitar os despedimentos, reduzir a duração e o montante dos subsídios de desemprego e enfraquecer a contratação coletiva, limitando deste modo o poder de negociação dos trabalhadores.
Entre os efeitos da flexibilização do mercado de trabalho podemos assinalar o aumento sem precedentes do emprego a tempo parcial, temporário, ou a proliferação de contratos “atípicos”, como os contratos zero-horas (por cá menos habituais, mas de grande relevância, por exemplo, no Reino Unido). Estes contratos permitem às empresas manter trabalhadores sem lhes oferecer trabalho nem remuneração, podendo a qualquer momento convocá-los para tarefas, pagando à hora. Um verdadeiro exército de reserva de trabalhadores – onde é que já o tínhamos lido?
Em Portugal, estas reformas contribuíram para agravar a desigualdade de rendimento, sobretudo a partir da crise. É por este motivo que devemos olhar não apenas para as estatísticas do emprego e desemprego, mas também para a sua evolução qualitativa. Para este efeito, o indicador da subutilização do trabalho, que o INE voltou recentemente a publicar, dá-nos uma ideia mais clara da evolução do mercado de trabalho. Este indicador junta aos desempregados oficiais o subemprego de trabalhadores que gostariam de trabalhar mais horas, os inativos que não procuraram emprego, mas que se encontram em condições de trabalhar, e os inativos sem disponibilidade para trabalhar (à data do inquérito). O resultado é revelador: a taxa de subutilização do trabalho em Portugal, no final de 2017, estava fixada em 15,5%, quase o dobro da taxa de desemprego à mesma data (8,1%). A precariedade tornou-se um dos traços principais do mercado de trabalho, em Portugal como no resto dos países da OCDE.
Como vemos, décadas de degradação dos direitos do trabalho diminuíram o poder de negociação dos trabalhadores e enfraqueceram a sua posição face a quem emprega, o que ajuda a explicar o fraco crescimento dos salários nos últimos anos e a preocupação das mesmas instituições que promoveram este processo.
Podemos concluir este conjunto de artigos reconhecendo que, ainda que errado no diagnóstico, o relatório da OCDE acerta ao identificar um importante problema. Embora seja destacado pelo governo, o ligeiro crescimento económico dos últimos tempos não se tem refletido na evolução dos salários reais, pelo que a riqueza continua a não ser distribuída de forma igual por todos. E crescer sem distribuir serve de muito pouco.
Relevante: https://www.socialeurope.eu/decentralised-collective-bargaining-oversold
ResponderEliminarPorque razão se fala em progresso quando aumenta a desigualdade? O que significa exactamente não se defender o pleno emprego? Qual o significado da palavra "democracia"? E já agora para que serve?
ResponderEliminarAs mais elementares questões deixaram de ter espaço nesta nossa sociedade...
Mais impressionante é como a taxa de subutilização do trabalho aumentou em 2017, contrariando a tendência de descida nos anos anteriores a par da taxa de desemprego.
ResponderEliminarResta saber o que se passa com a população ativa, inativa e subemprego a tempo parcial...
Convém frizar que embora o termo seja o mesmo: "sindicatos", não existe a mínima semelhança de entre o termo quando aplicado a um universo de empregados no privado e, por outro lado, quando refere a multitude de organismo públicaos ou intervencionados, de todas as espécies, inclusivé na administração central, aos mais altos níveis.
ResponderEliminarRecorda-se "sindicato" de Juízes, poder Judicial.
(Excepção: Deputados e governantes -Legislativo e Executivo- pois legislam e aprovam os seus respectivos proveitos e condições laborais.)
Seria interessante uma análise do quase incomensorável universo sindical estatal em Portual.
Impressionante de facto é toda a abordagem feita pelo autor do post. Com a preciosa síntese do anónimo das 14 e 35 e o link de Paulo Marques
ResponderEliminarLá está este aldrabão do Pimentel. Com o seu ódio aos sindicatos e a falta de verticalidade própria da espécie
ResponderEliminarConvém salientar o modus faciendi da tralha neoliberal.
ResponderEliminarTraveste-se de tudo e mais alguma coisa. E usa todos os expedientes para fugir ao que de fundamental se debate.
O que usa é geralmente reles. E está aberto o caminho para o que é secundário
Uma nojice de facto
Se bem que os salários estão neste momento a subir, com o aumento do emprego.
ResponderEliminar«a riqueza continua a não ser distribuída de forma igual por todos»
ResponderEliminarPrimeiro, não é suposto que seja de forma igual para todos; como se todos fossem iguais em termos de contribuição para a riqueza.
Segundo, se a perda de riqueza não é igual para todos a que propósito o seu acréscimo haveria de ser igual para todos.
Terceiro, se quando decresce a riqueza não são diminuídos salários, a que propósito é que haveriam de crescer sempre que cresce a riqueza.
Um excelente post que chama, para desconforto da espécie, o nome aos bois. Para além da distribuição perfeitamente desigual há ainda a questão da apropriação da riqueza por parte dos do topo da pirâmide. E tudo o que constitua uma ameaça aos donos do mundo é tratado de forma cavernicula pelos serventuários dos tais 1%
ResponderEliminar"Os salários estão neste momento a subir"?
ResponderEliminarTalvez ler melhor o que se expõe e que fundamenta.E apresentar dados concretos para essa afirmação tão temerária.
O mesmo tipo que fala aí em cima de forma assaz curiosa sobre os sindicatos ( há, de acordo com a sua versão do Observador, os sindicatos de organismos públicos, os maus, e os de organismos privados , os bons), é um bom aldrabão.
ResponderEliminarNem há meia dúzia de dias equacionava assim os sindicatos, deixando já não a sua marca de pafista ressabiado, mas de eterno vendedor da banha da cobra de quem, nas relações laborais, escolhe o lado do patronato
"a parasitagem sindical na Alemanha também tem destruído muito a Deutsche Bahn"
Em todo o seu esplendor o ódio aos trabalhadores e às suas estruturas de classe.Quer sejam de organismos privados ou públicos, o que estes tipos não toleram é mesmo a luta organizada do mundo do trabalho
Mais um elo de ligação entre o neoliberalismo e aquele recanto de onde nasceu a besta do fascismo
Os salários dependem essencialmente do PIB per capita:
ResponderEliminarhttps://www.veraveritas.eu/2018/05/on-myth-of-low-salaries-in-europe.html
One of the main political and economic issues evoked by the majority of left-wing people in Europe, specially in southern countries, is that some governmental, budgetary or political choices, due to capitalist and neoliberal approaches, tend to make salaries low. Undoubtedly that wages in southern Europe are low, when compared to those in northern Europe, that is indeed merely a simple fact to assess. But the main political-economical question that immediately arises is, what is the cause for such low wages in Portugal, Spain or Greece. And the collected data from Eurostat doesn't seem to confirm any of the left-wing theories for low wages, such as the high inequality amongst workers, the labour governmental policies nor the standard on the minimum wage. Indeed, the data seems to simply attest, that there is a very strong correlation between the GDP per capita and the gross wages, that is, those incomes before taxes. Therefore, if you'd like to have your country to have higher wages, then you have to press your government to introduce policies to promote economic growth. Nonetheless, in the country where I come from, Portugal, the political debate is surreal and everyone talks about low wages, as if they were a misconduct from destiny or the evil intents of the greedy capitalist and financial system. Indeed there is inequality in wages in Portugal, and there is low labour protection in many new jobs for the youth, nevertheless rationality says the cause for low wages comes directly from economic performance, and not from legal or political measures. Good salaries are paid by good economies. Europe is no exception!
Esse site não é do Pimentel?
ResponderEliminarEstá armadilhado. .
E trata de pura propaganda passista troikista
ResponderEliminarUma espécie de lixo Já aqui desmontado n vezes
O Pimentel Ferreira sabe-o. Mas volta sempre ao local do crime
Lá vem outra vez o vitor-pimentel-aónio-cunhal-cunha-simões com aqueles links manhosos e com a treta do costume.
ResponderEliminarNão, os salários não dependem do PIB. Já aí atrás mostrei que não e basta pensar no caso alemão em que as reformas Hartz2 reduziram os salários em relação à produtividade.
Simplesmente convenceram os amarelos sindicatos alemães a reduzir as suas reivindicações, rebentando assim com essa relação salários -- PIB e essênciamente transferindo uma espectacular fatia dos ganhos do trabalho para o capital. Ambos, capital e trabalho neste caso eram alemães, mas a traição dos sindicatos foi prenhe de consequências para o desequilibrio da zona euro.
Se essa relação de que fala fosse automática os trabalhadores alemães já deveriam estar a ganhar muito mais do que realmente estão.
S.T.
Este texto deste tipo aí em cima ( será o joão pimentel ferreira? ) é surreal.
ResponderEliminarPerfeitamente surreal. Um comunicado do zé manel fernandes em inglês. Será para promover o produto após o Brexit?
O resultado desta mediocridade vem directamente da performance neoliberal? Será que se está a re-candidatar a um lugar num hipotético futuro governo pafista?
Estava a ler estas idiotices em inglês, mesmo aí em cima, e estava a lembrar-me do post do João Ramos de Almeida há dias
ResponderEliminarA racionalidade desta malta neoliberal anda muito por baixo.Aconselhava-se o autor ( ou a autora) a ler com atenção estes textos de Ferreira Vicente. Aprendia alguma coisa, poupava-se o próprio de fazer figuras tristes e poupava-nos o tempo dispendido a ler histórias da carochinha
Estava a ler estas idiotices em inglês, mesmo aí em cima, e estava a lembrar-me do post do João Ramos de Almeida há dias
ResponderEliminarA racionalidade desta malta neoliberal anda muito por baixo.Aconselhava-se o autor ( ou a autora) a ler com atenção estes textos de Ferreira Vicente. Aprendia alguma coisa, poupava-se o próprio de fazer figuras tristes e poupava-nos o tempo dispendido a ler histórias da carochinha
In Portugal the salary is seen as a right related to an individual and dignified way of life.
ResponderEliminarAny connection with richness produced is an unacceptable neoliberalist proto-fascist concept.
Why is that? Esquerdalhada dixit!
Esta frase deste sujeito aí em cima, sim, a deste amigo do pimentel ferreira, tão caritativo para com ele, que até se apressa a debitar também em inglês, nasceu propriamente de quê?
ResponderEliminarDa conversa dos chefes das confederações patronais a aconselhar o uso do inglês manhoso para propagandear conceitos tirados directamente da alcova neoliberal?
Da conversa entre os dois amigos, pimentel e jose, para fazerem esta figura de menoridade intelectual, género bobos da corte, para que não se reflicta sobre os textos escritos por Vicente Ferreira?
Da conversa tida entre o zé manel fernandes e os frequentadores do seu jornal para sabe-se lá o quê?
Mas francamente será que estes tipos pensam que vão a algum lado com estas idiotias típicas de produtos mal acabados da sua classe de exploradores?
Estes comentários em inglês assim paridos fazem lembrar as nossas damas de sociedade ociosas, que o gostam de praticar nos seus chás-canastra, com o dedo mindinho levantado e os leques a abanar para lhes arrefecer as carnes
ResponderEliminarMas a ligação a uma típica classe social que parasita os demais está precisamente no manifesto que este mesmo jose expõe ( ainda não em inglês, ainda não em estado de caridade para com pimentel ferreira) em relação à distribuição da riqueza.
Há quem defenda que uns são mais iguais do que os outros. Vem de longe. Passou pelos Reis e outras formas anedóticas de legitimação do poder, atravessou os tempos, deixou como relíquias desses mesmos tempos, uma nobreza as mais das vezes impotente e senil e adquiriu no ultimo século outras tonalidades. O fascismo, o nazismo,o racismo bebem dessas águas.
O endeusamento do poder do dinheiro tem marcado as nossas sociedades nos últimos tempos.
É ver como os instrumentos de propaganda funcionam na sua promoção. As formas idiotas, submissas e abjectas como se referenciava Ricardo Salgado é um exemplo que salta de forma imediata.