sexta-feira, 9 de março de 2018

Pensamento light

A poucos dias do Congresso do CDS, a dirigente do CDS deu anteontem uma entrevista à RTP.

Para um partido que não chega aos 10% da intenção de voto, mas que afirma querer liderar a direita, estar-se-ia à espera de ideias mais consistentes sobre o pensamento do CDS. Mas da conversa percebeu-se que o mandato governamental do CDS de 2011/15 ainda está mal digerido e que as grandes linhas de pensamento económico ainda andam muito baralhadas pelo Largo do Caldas. E que o seu discurso está muito colado à espuma dos dias, a surfar os temas mais mediáticos. 

A pobreza do pensamento centrista é visível na moção de Cristas ao Congresso. Aliás, convida-se a que se leia as diversas moções para perceber que o CDS tem um pensamento incoerente e inconsistente, variado mas indistinto, sobre temas essenciais e estratégicos, e que por isso lhe é mais fácil surfar o dia-a-dia. Uma delas, considera mesmo que "a nova vaga de emigrantes deve ser vista como uma afirmação da capacidade e do engenho de Portugal no mundo" ou que "Portugal tem de assumir uma política activa para o crescimento da natalidade, financiada pelo Estado e não pelas empresas". Mas ao mesmo tempo, mantendo o esforço para cumprir a regra orçamental de reduzir a dívida pública até 60% prevista no Tratado Orçamental, o que é mais uma quadratura do círculo improvável. Mas tudo isto merece um estudo mais detalhado, proximamente. 

O discurso televisivo de Assunção Cristas é mais um exercício, aliás, de quadratura do círculo: camufla o que correu mal, puxa de galões que não são os seus, tudo baralha, sem que o entrevistador a tenha confrontado.

Primeiro. Para Cristas, não houve austeridade: houve necessidade. Na realidade, necessidade foi o que levou ao empréstimo de curto prazo que - nunca é por acaso - trouxe agarrado um conjunto de políticas, fortemente ideológicas, assumidas pela direita (CDS inclusive). Outras políticas poderiam ter sido adoptadas, mas a direita quis aquelas, que fracassaram estrondosamente.

As políticas adoptadas geraram uma montanha de 1,5 milhões de desempregados. Mesmo do ponto de vista orçamental, foi um fiasco: entre 2011 e 2013, dos 20 mil milhões de euros de austeridade (entre cortes na despesa pública e aumento da receita fiscal), o défice apenas se reduziu em 6 mil milhões por causa da recessão provocada. Por cada 1 euro retirado ao défice, retirou-se 1,25 euros ao PIB. Aliás, Cristas a certa altura afirmou aquilo que a esquerda costuma repetir sobre o fracasso das medidas adoptadas: "Mesmo na dívida, diminuiu em percentagem do PIB. Nós continuamos endividados, continua a haver um agravamento da dívida".


Ficou sem saber-se - e ninguém lhe perguntou - por que razão isso aconteceu quando era suposto estar a reduzir-se a dívida, fruto das políticas adoptadas no passado. Estava no Memorando.

Teria sido por culpa do protectorado da troica? Não foi, porque Cristas omite esse facto olimpicamente. Troica e memorando são, aliás, palavras proibidas. Fala do "grande esforço de todos os portugueses", quando esse esforço não serviu para nada e teve de ser invertido! Até a Comissão Europeia já vem dar o dito por não dito.

O fruto da austeridade aplicada transformou-se para Cristas em "crise mundial e europeia" e "depressão", sem que se explique por quê, já que Portugal afundava nessa altura enquanto a UE já crescia. E a retoma é, assim, desvalorizada: "Tínhamos, em Portugal, uma capacidade produtiva instalada que não estava toda aproveitada em virtude da profunda depressão e da crise que foi uma crise mundial e europeia e, claro, com a retoma poderão, com muito pouco investimento, accionar essa capacidade produtiva".

Na entrevista, Cristas sublinha que, se houve retoma, foi por causa - "também" - das reformas adoptadas, nomeadamente a laboral: "Tenho sublinhado muitas vezes o facto de, por exemplo, António Costa ter resistido até agora a fazer mexidas na legislação laboral que eu espero que mantenha, porque hoje temos crescimento económico e desemprego a diminuir e emprego a aumentar também por causa de várias reformas, nomeadamente na reforma laboral feita pelo anterior governo". Quais teriam sido as outras reformas? A famosa reforma do Estado que Paulo Portas sintetizou numa página e que nunca levou à prática porque não lhe convinha voltar à recessão?

Noutra entrevista, de outro dirigente, Adolfo Mesquita Nunes, prevê-se que entre 10 a 40% dos actuais empregos deixarão de existir - devido à famigerada automação dos processos produtivos - e que "é preciso encontrar mecanismos de transição e mobilidade, para que as pessoas possam mudar de emprego, ter formação e ter a protecção social de que precisam nesse período". Para já, pergunte-se, com que dinheiro? "Temos um modelo de Estado Social que tem um conjunto de prestações sociais pensadas para desafios antigos. E, portanto, temos de adaptá-las". Os jornalistas não lhe perguntaram quais... Mas como se articula isso com o papel do CDS de 2011/15? Nessa altura, o CDS defendeu, com unhas e dentes, a redução da duração e do montante do subsídio de desemprego. E das compensações por despedimento. E o congelamento do SMN, que aumentou por razões eleitorais e pouco e sem discussão na concertação social... Algo que pressionou os salários para a descida do seu valor. Em que ficamos?

Pior. Enquanto defende esses méritos da austeridade, usa a austeridade para criticar Costa de a aplicar de forma camuflada: "Não é verdade que seja tudo cor-de-rosa, não é verdade que a austeridade tenha acabado. Não é verdade esta narrativa do primeiro-ministro de que acabou a austeridade e de que agora está tudo muito bem. E nós a cada momento conseguimos comprovar isso mesmo".

Mas se o Governo aplica a austeridade, mesmo que camuflada, Portugal deveria estar melhor. Ou não? Não, porque o CDS acha-se à-vontade para atacar a falta de recursos na Saúde que foi fortemente afectada pela política estúpida da austeridade...

Que tipo de política económica defende o CDS afinal? O CDS tem sido um partido sem espinha nem pensamento. E ainda por cima quer liderar a direita. Não vai longe.

13 comentários:

  1. Num ponto estou de acordo com o JRA, quanto ao tempo da troika: as reformas foram tímidas e muitas medidas foram tomadas fora de tempo.
    Já o soundbyte de que «a direita quis aquelas (políticas), que fracassaram estrondosamente» nem pode ser considerado discurso colado à espuma dos dias, mas o habitual e obsceno surfar da propaganda esquerdalha.
    Mas não obstante há que reconhecer que a denominada Direita mantém o essencial da parasitagem de Estado que é o essencial desta abrilesca falperra de esquerdalhos.
    Ainda que a defesa da função do estado na saúde seja admissível, certo é que nada de significativo é dito quanto à necessidade de escorraçar a matilha estatal de tudo o que mexe, numa parasitagem que deixa o Estado Novo aparentar ser obra de liberais.
    E é aqui que direita e esquerda se associam na construção de um país menor, de mamões a quem agora é moda vir propor que sejam inovadores e criativos!

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  2. Qualquer dia o PNR ultrapassa tanto o PSD como o CDS...

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  3. Qualquer dia descobre-se que o "José" é na realidade um velho estalinista dos quatro costados que goza como um perdido com a missão de provocar a assistência encarnando esta personagem fascistóide. Mas isso claro está que é segredo... de Polichinelo mas segredo!
    S.T.

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  4. Caro José,
    Tem de concordar que o discurso da Direita (PSD e CDS) em Maio de 2011 foi de abraçar a receita prevista no Memorando. O PSD até veio afirmar que tinha sido o pai do Memorando. E o CDS foi para o governo tendo Paulo Portas como vice. Não se é vice de um governo de cujo programa não se concorda. Tanto concordou que o aplicou à risca na área laboral e social.

    Só a partir de 2013, quando estava na cara que tudo estava a descambar, é que Paulo Portas veio vender a tese do protectorado, que havia de sair rapidamente desse jugo e que foi o CDS quem conseguiu evitar mais ingerências da troica...

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  5. Desvairado ou de cabeça perdida?

    Será moda? Terá alguma coisa a ver com o elogio do jose às balls de salazar? É que o cheiro que se desprende de tais comentários equivale ao que calculo que sai das referidas balls.

    Embora confesse que é apenas um palpite, porque o especialista neste assunto é mesmo o Jose

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  6. Caro João,
    Deixe-me recordar-lhe o arrojo e a rebeldia com que o governo da Geringonça se apresentou e apresenta perante Bruxelas. Pergunto-lhe se vê diferença de monta em relação ao que diz ser a atitude do PaF para com a troika. Comparando a gravidade e dependência comparativas, direi que o PaF foi menos cumpridor do que o é a Geringonça, e por mim acho isso um facto muito lamentável.

    Em 2013 o que se verificou é que não só a recuperação internacional era já antecipável, como o miserável estado das estruturas económicas tinham antecipado um efeito que se acreditava vir a ser obtido no tempo; acresce que se verificara uma em absoluto surpreendente adesão voluntária à austeridade.
    Sobre este último aspecto recordo-lhe (admito que com alguma saudade) esse tempo em que a circulação automóvel estava bem longe do pandemónio actual.

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  7. Os factos são uma coisa tramada.

    E quando os factos se apresentam como factos contra os "factos " que jose hoje apresenta, cedo se percebe que este se revolte contra os factos.

    Repare-se no ligeiro tom de censura imprimido agora por jose à troika.

    Antes, quando pensava que o 28 de Maio do Passos iria durar mais 48 anos, saudava a troika daquela forma que os vende-pátrias vulgares fazem em ocasiões semelhantes.

    E quando a Troika se foi embora, as choraminguices que jose debitava pela sua (aparente)ida. Só lhe faltou uma poesia épica decassilábica. Ou não?

    Perante o fracasso patente da governação directa dos grandes interesses económicos,vulgo troika, jose não tem outro remédio senão assobiar para o lado.

    E desta forma cobarde ter que reconhecer tal fracasso, atrás de pérolas como estas: "reformas foram tímidas ... fora de tempo."


    Mas a cena continua:"a direita quis aquelas (políticas), que fracassaram estrondosamente". Um facto tão gritante que entra pelos olhos dentro.

    Como jose a nega ?

    Com esta poderosa argumentação:
    "Porque é um soundbyte e é o obsceno surfar da propaganda esquerdalha."

    Ou seja,macaqueando a sua própria propaganda. jose posta slogans publicitários idiotas com o seu quê de insultuoso.

    E é com esta espuma de becos pouco recomendáveis que jose tenta negar uma evidência :"A direita quis aquelas (políticas), que fracassaram estrondosamente"

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  8. Mas continua o circo dos factos de jose de ontem. que desmentem os factos do jose de hoje:

    Jose, de hoje:
    "há que reconhecer que a denominada Direita"....bla-bla-bla ( já lá vamos)


    Jose, em 2012, passados cerca de 38 anos do 25 de Abril de 1974, gritava irritado e fora de si:
    -"a esquerda está no poder há 38 anos!"

    Um ano e meio depois berrava com as mãos na cintura em pose de peixeiro:
    -"há 40 anois (!) que somos governados por variantes de esquerda".

    Barroso e Santana Lopes, Portas ou Cavaco catalogados desta forma tão "extremista" por um extremista como jose.

    A denominada direita é afinal uma variante de esquerda.

    Tudo dito sobre os verdadeiros propósitos ideológicos de tão vetusta e serôdia personagem

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  9. Mais uma vez, o que faz jose perante o descalabro da governação duma direita caceteira, vampiresca, predadora, corrupta, filha dilecta da canalha corrida em 1974 ?

    Tenta sacudir a água do capote e papagueia o breviário dos ressabiados salazarentos. Está-lhe entalada no goto a gesta histórica que abriu as portas à liberdade e que correu com os seus ídolos ( apresentados agora, não se riam por favor, como "obra de liberais")

    E temos a seguir o destrambelho completo por parte de jose, a atestar a crispação que o sacode e agita e o tom ideológico que abraça e regurgita:
    "parasitagem de Estado" que é o essencial desta abrilesca falperra de esquerdalhos", "escorraçar a matilha estatal de tudo o que mexe","um país menor, de mamões"


    Cabe perguntar:

    -O tal país era maior quando salazar mandava matar e morrer em África e quando os esbirros da Pide cumpriam as ordens do mesmo sacana sem lei? Ou quando o país se afogava na miséria e na pobreza?

    -A referência ao "escorraçar" de tudo o que mexe teve como leitmotiv aquela frase de Goering que dizia que sacava logo da pistola quando ouvia falar em cultura?

    Para atirar em tudo o que mexesse?


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  10. O desnudar da farsa do que é o CDS/ PP, mais a inefável Cristas deve custar. E este post é bastante expressivo na forma como o faz

    Deve custar aos saudosos apologistas destes tipos, quer considerem aquele partido como de "direita" ou como "variante de esquerda"

    A farsa tem destas coisas. Embora esta farsa continue num registo piegas de saudades incontidas e de anedotas ditas de quem está a vender banha-da-cobra com um tom sério:

    "acresce que se verificara uma em absoluto surpreendente adesão voluntária à austeridade".

    Ahahahah

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  11. A tentativa de reescrever a história é velha de anos. Convém de qualquer forma ter pelo menos alguns laivos de veracidade e de distanciamento para se tentar impingir aldrabices desta monta

    Há registos de centenas de postazinhas, comentários, ameaças, zangas, impropérios, pieguices, da parte de quem agora fala numa adesão voluntária aos processos austeritários contra precisamente quem lutava e contestava tais processos.

    Curiosamente no início de Março de 2013, o DN titulava na primeira página:
    "Um milhão e meio protestou contra Governo"

    Andava muito ocupado na época esse tal Jose a defender a política caceteira do governo de Passos e Portas.Eram os elogios às cenas de intervenção policial, eram as confissões ideológicas ultra-montanas, era o convite descarado ao uso da força e da violência. Chegou mesmo a defender um golpe para obrigar o Tribunal Constitucional a arrepiar caminho

    Em 2013, ao contrário das considerações sobre a "recuperação internacional" antecipável, viveu-se a demissão irremediável de Portas. Como consequência da surpreendente adesão voluntária à austeridade,Vitor Gaspar demitia-se, estimulado ao que dizem por uma cidadã que lhe demonstrou na pele quão extensa era essa tal adesão voluntária.

    Por essa data, esse tal jose, completamente fora de si perante o desenrolar dos acontecimentos, escrevia pelo seu próprio punho uma cartinha particular a Paulo Portas onde mostrava sem margem para dúvidas a sua satisfação pela recuperação expectável. Uma verdadeira anedota.

    A questão volta a colocar-se. Estes últimos disparates que jose agora posta são para esconder o seu assumir pelas balls de salazar ou a questão é mais grave ( ainda) e passa pela deterioração do seu estado de saúde?

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  12. Fica claro da limitada recensão do meu pensamento, generosamente fornecida acima, que desde Abril toda a afirmação política mantém aquela tónica apostólica, esquerdalha de invocar os coitadinhos.
    O regime do Estado Novo temperava essa tradição fradesca com o culto dos heróis, os exemplos de sacrifício pela Honra, pela Grei e mais moderadamente pela Fé.
    Disso só sobrou o culto do sacrifício pela Fé (agora comuna), incensado, romantizado em paroxismos de servidão à causa dos arrebanhados, servindo como sonho o que é inato a qualquer cardume atento às pulsões do colectivo.

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  13. O processo demencial manifesta-se todavia por mais outra questão.

    Quando se fala no" arrojo e na rebeldia" do governo de Portas/ Passos / Cavaco e Cristas.

    Que descaramento. Quem não se lembra daquelas cenas canalhas de subserviência abjecta perante a troika e a Alemanha?

    Quem não se lembra dos milhares de posts dos vende-pátrias vulgares a pregar o rastejar perante os credores, a defender a mais nojenta submissão à troika, aos credores, aos agiotas e a madame Merkel?

    Quem não se lembra do papel de jose nesta sua missão troikista e de apologista da servidão incondicional?

    Quem não se lembra das piadas, muitas em forma desenhada, em que Passos era representado como um vira-lata a lamber de forma nauseabunda as botas de Merkel?

    Quem não se lembra igualmente da atitude de chantagem que o FMI,a comissão europeia, o eurogrupo, a tralha toda por junto e atacado, fez para com o governo de Costa e de como tentaram condicionar e manipular o Orçamento de Estado?

    Anunciava-se o caos

    Nessa altura o golpe em marcha foi denunciado. Porque aqui em Portugal assumia-se a vinda eminente do Diabo e invocava-se a Europa e o fogo como castigos divinos a quem desobedecesse aos troikistas, às agências de notação e aos impropérios e ameaças de herr Schauble e de herrinho Jeroen Dijsselbloem.

    Mas de Diabos sabe mais esta direita e direita-extrema, que o monta ( ou é montada por ele) de forma tão caninamente continuada

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