sexta-feira, 28 de abril de 2017

Esperança só na insubmissão


Francisco Assis é um exemplo, entre muitos, do que aconteceu intelectualmente à social-democracia: passou a pensar nos termos do mais vulgar euro-liberalismo. A sua última pilha de adjectivos, a sua última crónica, que tem um ou outro momento em que justifica concretamente o seu apoio programático a Macron, ilustra isso mesmo. Por exemplo, Assis afiançou que o antigo banqueiro é um social-democrata, entre outras razões, porque quer descentralizar a negociação colectiva, transferindo-a para dentro das empresas.

Na realidade, Macron segue nas circunstâncias francesas o programa da troika nas circunstâncias desta periferia, rumo a uma cada vez maior fragmentação das relações laborais. Historicamente, a economia política da social-democracia está associada à centralização da negociação colectiva, ao nível sectorial e nacional, até porque é aí que são gerados os maiores efeitos igualitários, também ajudados por políticas económicas deliberadamente orientadas para o pleno emprego. Este é o contexto que de resto reforça o poder do trabalho organizado dentro das empresas. Se há coisa de que Macron e Hollande não podem ser acusados é de social-democracia no poder, dado o seu compromisso com uma integração europeia desenhada para a impedir, gerando políticas de liberalização e de austeridade permanentes.

Neste contexto, a esquerda com futuro é a que funde a questão social, ligada ao trabalho e seus direitos, com a questão nacional, a da soberania popular, democrática e inclusiva, traduzida, entre outras, na reconquista da capacidade estatal de pilotagem da economia. A esquerda com futuro é aí a França Insubmissa. Sem esta força política emergente, sem uma firme oposição às políticas neoliberais, arriscam-se a validar a seguinte fórmula: Macron 2017= Le Pen 2022. Sempre que há mobilização social anti-liberal nas ruas e que esta encontra expressão política organizada, Le Pen é reconhecidamente ultrapassada. 

Entretanto, Jean-Luc Mélenchon, que obteve os melhores resultados para este campo desde o final dos anos sessenta, tem andado muito bem, convocando os seus apoiantes para uma consulta, que produzirá mobilização política e um resultado claro contra Le Pen, em linha com todo o percurso anti-fascista deste notável dirigente político, sempre pronto a enfrentar Le Pen. Ao não se precipitar, não se confudiu com Fillon e quejandos. Confiou na sua base de apoio e nos seus valores. 

Os que o apoucam pela esquerda são os mesmos que recusam encarar a verdade e que contribuem para a mentira com origens europeias: a UE, em geral, e a Zona Euro, em particular, são os melhores aliados institucionais de Le Pen, dadas as políticas que também impõem ao povo do Estado francês. São os mesmos que queriam ficar reféns de um P sem o S e sem o F e da perversa americanização das primárias, cujos resultados estão à vista. Felizmente, existe uma esquerda que não tem medo de mobilizar o descontentamento popular, canalizando-o para um programa de esperança na soberania democrática na escala onde pôde e poderá existir. Esta é a esquerda que nunca desiste.

16 comentários:

  1. Nem mais.

    Muito bom comentário

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  2. Compreendo que algumas personalidades de hoje se preocupem com o estado actual da velha Europa. Todavia já Platao na velhinha Grecia ou do ingles Tomaz More (acusados de uma “doença demoniaca” chamada Utopia ate´ aos dias de hoje) as elites ainda não perceberam/aceitaram que os Jean Luc Melenchons considerados com tal “doença” exponde seus conhecimentos a´ voragem das sociedades, foram e são verdadeiros revolucionarios. O facto da anti-utopia ser mais do mesmo e não apresentar outro modelo de sociedade indica, mais tarde ou mais cedo, a sua derrota. de adelino Silva

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  3. Francisco Assis tem razão. A Esquerda que ele critica lembra os Bourbons pós-revolução, não esqueceu nada e não aprendeu nada. E o João Rodrigues devia ter vergonha de andar a vestir a camisola da social-democracia, quando a sua família política não fez outra coisa que não denegri-la e persegui-la (deve ser porque o chavismo já não convence ninguém). Não tenho que lhe lembrar da conversa do 'social-fascismo' dos anos 30, que metia a social-democracia no mesmo saco do fascismo, pois não? Nem das perseguições no Bloco de Leste após a II Guerra... Como bem diz o povo, tarde piaste... Mélenchon agora, parece querer misturar Macron com Le Pen. Os velhos hábitos realmente demoram a morrer. E os seus apoiantes discutem se votam em branco ou se se abstêm na segunda volta... O inimigo está às portas de Bizâncio e as pessoas discutem quantos anjinhos podem dançar na cabeça de um alfinete. Quando ainda era de Esquerda, em 2002, Mélenchon não hesitou em criticar a Extrema-Esquerda por não concentrar o seu voto no corrupto Chirac. Agora, que perdeu as eleições, e pode-se culpar os media, ou o pobre do Hamon, que esse facto e inelutável e é preciso aceitá-lo, é incapaz da mínima grandeza (imagine-se o que não se diria de alguém que se recusasse a apoiar Mélenchon contra Le Pen). Mas poupe-me às racionalizações e taticismos obtusos, de que Macron 2017= Le Pen 2022. O risco real é de uma Le Pen 2017=Le Pen 2022=Le Pen 2027, etc. É disso que se fala. E isso implica um apoio a Macron sem condições, sem tergiversações (e aí vão tarde), mas também sem mais promessas. Tão somente e apenas...

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  4. Em algum tempo, alguém disse que tínhamos de mudar de povo e não de políticos – O povo erra muito, os políticos estão sempre certos. De tal forma que, ainda não satisfeitos, inventaram essa coisa das sondagens…Como se a Historia não existisse ou para que servira´ ela perante o “vil ignorante”?
    Em todos os tempos, mesmo os melhores e mais sensíveis cidadãos do planeta fizeram as “ democracias” ao jeito dos interesses do seu clã.
    A França e os franceses não podem fugir aos seculos de cultura hegemónica europeia, de cultura do Poder Absoluto, da cultura colonialista que a domina visceralmente.
    Macron e Marine são “nascituros” dessa cultura tal como a maioria dos franceses; não sendo miniaturas de Napoleão, e´ essa esfinge que adoram… as estrofes da Marselhesa perderam o sentido perante a banca e os banqueiros. de Adelino Silva

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  5. Não tenho por hábito comentar comentários. Mas o Jaime Santos conhece a expressão paz podre, não conhece? E já que falamos de França, Governo de Vichy também lhe diz qualquer coisa seguramente.
    Agora coloque estes termos na sua equação e vai ver como tubo bate certo no fim. Então, ficou com vergonha de si próprio ou já não tem estados de alma que o apoquentem?

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  6. Os socialistas andam histéricos a acusar Mélenchon de ainda não ter apelado ao voto em Macron.

    Mas foram os socialistas os principais responsáveis por abrir caminho a esta segunda volta e à possibilidade de eleição de Marine le Pen.

    Se o candidato do PSF, Benoît Hamon, tivesse desistido e apelado ao voto a Mélenchon, a estas horas eram Mélenchon e Macron que disputavam a segunda volta das presidenciais francesas. Mas os socialistas têm mais medo da esquerda da esquerda do que da extrema-direita.

    O resto, conversas de Jaimes Santos e quejandos, é conversa pour épater les bourgeois.

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  7. Ah, como os homens são…mesmo aqueles em que notamos conhecimento democratico, facilmente caiem no insulto.
    “E o João Rodrigues devia ter vergonha de andar a vestir a camisola da social-democracia”. Fiquei perplexo com esta frase.
    Que se dizer de Françoise Hollande mentor de Macron ao serviço da Fundação Saint Simon e do Instituto Montaigne. Talvez o Marechal Petain lhe sirva de referência…
    Oh Sr. Jaime Santos não será demasiado pesado só por que não gosta? Veja la´… de Adelino Silva

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  8. Tão somente e apenas.

    Um voto no neoliberalismo hoje é um voto na extrema-direita amanhã. Os primeiros servem os banqueiros e a alta finança, esmagando todos os demais. O que irá alimentar as le Pen do presente. Mas sobretudo do futuro

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  9. A França e os franceses estão a ser constantemente bombardeados por fora e por dentro como nunca se viu, ate´ parece que desaparecera´ da geografia europeia se Marine Le Pen sair vencedora deste pleito. Sim, porque entre uma direita torta e uma torta direita o diabo que os escolha.
    Ate´ fazem lembrar aquela dupla Mário Soares-Freitas do Amaral em que uma boa parte da esquerda – os comunistas entre eles – engoliram o “sapo”, para depois o mesmo M. Soares, aconchegar no seu regaço o “Terrifico Fascista” F. Amaral. Ele há com cada uma…
    de Adelino Silva

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  10. "O banqueiro e a neofascista platinada"

    O que nos dizem as eleições francesas?

    1. Os partidos de governo reduzidos a 26% dos votos, 50% se lhes somarmos Macron, o seu subproduto. Em 2012 eram 65%. Hollande e Valls (e, com eles, Macron) destruíram o PS francês, como se antevia; a direita clássica (Fillon, 20%) ficou atrás da extrema-direita (21%). Continua a estiolar o espaço político das elites liberal-conservadoras oligárquicas, apostadas desde há 40 anos em reverter o ciclo das políticas de correção das desigualdades a que o fim da II Guerra Mundial obrigara e em concentrar a riqueza em nome do "saneamento" da economia. Depois da Grécia, Espanha, Itália, a Europa Centro Oriental e parte da Europa do Norte, a França vem juntar-se aos países onde os partidos tradicionais da direita e da social-democracia liberalizada já não capazes de convencer a maioria da sociedade que tudo se resolve entre eles e se vêem obrigados a inventar o "novo" (Macron, os Ciudadanos em Espanha...) ou a integrá-lo no seu seio (Trump, Modi na Índia), para, encenando um registo "anti-sistema", impedir a formação de uma alternativa. Para se perceber bem o "bloco central" de Macron, é só esperar para ver com quem se coligará ele nas legislativas.

    Com a sua passagem à segunda volta (24% não é nenhum triunfo), confirma-se também esta nova moda: uns quantos ricos deixaram de pagar as campanhas eleitorais dos seus testas-de-ferro e atiram-se eles próprios para a frente. Macron é só mais um, depois de Berlusconi, Trump, Piñera (no Chile), Macri (na Argentina)... É a onda dos milionários que, por cima dos partidos tradicionais, vêm propor-se como ídolos do sucesso "ao alcance de todos" (slogan de Macron), como quem melhor entende o descontentamento dos pobres! A campanha "comercial" de Macron não passa de um "neocentrismo" oco (ver análise do historiador Olivier Meuwly no Temps de Genebra, 28.16.2017), ainda que Francisco Assis (PÚBLICO, 27.4.2017) queira ver um "social-democrata" no antigo banqueiro que rejeita abertamente a esquerda e a tradição socialista e que se rodeou dos liberalões que assessoravam o tão recomendável ex-chefe do FMI, Dominique Strauss-Kahn".

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  11. 2. Consolida-se, sem crescimento, o espaço eleitoral da extrema-direita e a sua capacidade de contágio das agendas da direita clássica e dos neoliberais em campos como a discriminação dos imigrantes e o discurso securitário. Marine Le Pen dá à FN o seu melhor resultado em presidenciais (+3,5% que em 2012), mas ele é pior que o de todas as eleições (europeias, municipais, regionais) dos últimos cinco anos. O perigo neofascista e racista da FN permanece, engrandecido por todas as concessões que lhe têm feito socialistas (tiradas xenófobas de Valls, degradação do Estado de Direito, aventuras bélicas em África e no Médio Oriente) e a direita clássica (a retórica contra imigrantes e refugiados).

    Que Paulo Rangel (PÚBLICO, 25.4.2017), que se senta no Parlamento Europeu com correligionários franceses que se recusaram a votar em socialistas contra a FN, subscreva agora disparates dignos de José Rodrigues dos Santos como "a extrema-esquerda e a extrema-direita foram sempre cúmplices" já dou de barato. Mas, em vez de querer meter no mesmo saco o que chama o "social-estatismo" de Le Pen e a alternativa progressista de Jean-Luc Mélenchon, era bom que dissesse que Macron partilha com Le Pen, além dos cortes nos serviços públicos, a vontade de reforçar o Estado policial em que o sempre prorrogado "estado de urgência" transformou a França. Mélenchon, pelo contrário, foi o único dos candidatos a exigir o fim deste e das medidas que violam o direito à privacidade e à presunção de inocência, e o único que viu as suas propostas secundadas pela Amnistia Internacional. Que Assis e Rangel façam coro ao considerá-lo "intrinsecamente antidemocrático" diz tudo deles próprios mas nada diz de Mélenchon".

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  12. "3. Mais de sete milhões de franceses votaram Mélenchon, o dobro de há cinco anos. Os seus 20% reconstituem o antigo espaço eleitoral que o PCF mobilizava até há 35 anos, um bloco popular que venceu a extrema-direita e Macron nos bairros populares da região parisiense, em Marselha, em Toulouse, em Lille, no coração que ainda bate da França trabalhadora que Hollande e Sarkozy quiseram fazer parar e que, ao contrário de Macron, é limpidamente anti-racista e antifascista. Muitos deles, "la mort dans l'âme", votarão Macron contra Le Pen. Que muitos deles não estejam disponíveis para um banqueiro que lhes propõe pior que Hollande é um puro ato de autodeterminação democrática".

    Manuel Loff

    (um artigo excelente,aqui disponibilizado, porque nem todos têm acesso ao Público)

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  13. Se os "instalados" da democracia representativa,

    não exorbitassem a sua legitimidade REPRESENTATIVA,
    armados em "donos disto tudo",

    a Vontade do POVO não seria SEGREGADA, pelos gabirus...
    ...do mal menor!

    Esta esperteza saloia dos "instalados", só pode dar...

    Trumps e Le Pens .

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  14. A 'pilotagem da economia' o verdadeiro sonho húmido da vanguarda da esquerda.
    Pudera, donos disto tudo é que era bom!

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  15. Lá estão os sonhos húmidos que herr jose teima em manter no seu discurso repetitivo.

    Não. Não se vai ter a grosseria de inquirir se tal insistência tem algo a ver com outros problemas já confessados pelo sujeito em causa.

    Mas não é passível de deixar de ser focado que herr jose aparece agora quase travestido, como se não tivesse nunca dito o que disse e tocado pungentes odes, precisamente a quem?

    Aos donos disto tudo.

    Agora faz fitas deste tipo.

    A "pilotagem da economia" continua a ser o apanágio dum grande patronato que cresceu à sombra dum estado monopolista e que sonha aumentar ainda mais a taxa de lucro.

    À custa de todos os demais.

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