quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

O outro lado do SMN: a negociaçao colectiva

Todos os economistas estão de acordo em aumentar o salário mínimo nacional (SMN). Mas depois há uns que vêem mais os problemas em aumentá-lo. Aonde é que, na sua ideia, surge esse problema?

Fonte: 3º Relatorio do SMN

Surge quando, ao aumentar o salário mínimo, esse aumento fá-lo aproximar-se do salário mediano (seta amarela) – ou seja, aquele valor que separa a metade inferior do universo dos assalariados da metade superior. Por outras palavras, quanto mais o SMN se aproximar do mediano, maior o risco do aumento do SMN se reflectir na escala salarial.

E qual é o problema disso? Ah! Aqui surgem todos os argumentos da fragilidades das empresas, da concorrência e da competitividade nacional que, tudo junto, fazem com que, nos últimos anos, os salários tenham perdido peso na distribuição do rendimento em favor dos lucros, contribuindo para uma maior desigualdade. E isso sem resolver o problema de competitividade que se propunham combater.

Quando se analisa o 3º relatorio sobre o SMN, verifica-se que, em 2015, se havia 21% dos trabalhadores a ganhar o SMN (!), o conjunto da massa salarial afecta a eles representa apenas 7,6% do total! Isso devido a uma grande desigualdade salarial. Muitos recebem pouco, mas poucos recebem muito. Ou seja, um aumento de 5% no SMN representa um aumento da massa salarial total de 0,5% (sem contar com os novos trabalhadores abrangidos)! E quanto contaria isso para os preços finais? Os salários contam com menos 20% dos custos de produção! Mas dos outros – os denominados “custos de contexto” (lindo nome, não é?) - nunca se fala. Vai se falando, mas nunca se ataca o problema porque atinge outras empresas. Fala-se agora no acordo chegado na concertação social, mas para que se estude - mais uma vez - o problema...

Ora, o que é que está a acontecer em Portugal? Em Portugal, esse “problema” da relação entre o salário mediano e o SMN existe.

Porquê? Porque o salário mediano se mantém incrivelmente baixo (782 euros). Recorde-se que o SMN foi aumentado para 557 euros. Algo que mostra a elevada desigualdade salarial existente em Portugal face a outros países da Europa.

Fonte: 3º Relatorio do SMN

E por que se mantém o salário mediano tão baixo? Ah! Aqui surgem todos os argumentos da fragilidades das empresas, da concorrência e da competitividade nacional... etc, etc.

Na verdade, para as empresas, surge como uma espiral virtuosa: Quando mais se pressionar os salários médios para baixo – vidé esvaziamento da negociação colectiva – mais o salário mediano baixa, mais se aproxima do SMN e menos probabilidade haverá de aumentar o SMN (com base nestes argumentos). E supostamente, tudo isso deveria diminuir o desemprego. Mas não é isso que se vê: o desemprego aumentou e desceu independentemente do SMN ter sido congelado ou aumentado.

Para os trabalhadores, surge como uma espiral recessiva: quanto mais baixo o salário médio, mais baixa o mediano, menos aumenta o SMN, maior a pobreza entre os assalariados. E isso sem que os novos empregos tenham ordenados dignos. Segundo o 3º relatório do SMN, quase 40% dos novos contratos eram pagos com o SMN, contribuindo para a aproximação do salário mediano do mínimo...

Portanto, há duas formas de resolver a questão:
1) Manter esta lógica assente em 20% dos custos das empresas – em que o SMN tem de ser aumentado com apoio do Estado porque as empresas se recusam a aceitá-lo...;
2) Inverter a lógica e criar alguma ansiedade para o lado das empresas, fortalecendo a negociação colectiva e fazendo o ordenado mediano aumentar (seta vermelha no grafico).

Como se enquadra o acordo chegado sobre o SMN? Isso fica para outro post.

3 comentários:

  1. As médias, as estatísticas, as tretas.

    O SMN conta para as empresas de actividades em que a sua presença conta.
    Para muitas delas a questão é simples - ou salário ou negócio; e onde acabar o negócio acaba o salário e melhoram as estatísticas do SMN, para grande crédito dos apologistas de que «não interessam ao país actividades de baixos salários».


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  2. Ah ,este rugido ensurdecedor por parte do perito quando as suas peritadices são desmontadas friamente pelos factos e pelos dados.

    Um verdadeiro perito. Patrão-perito convocado como perito.
    E que como perito apenas produz esta "coisa" aí em cima expressa como resposta à análise cuidada de João Ramos de Almeida.

    Só os olhos lhe saltam das órbitas e os dedos tremem no teclado quando escreve:
    "ou salário ou negócio".

    Tinha mesmo que ser o "negócio", não era mesmo herr jose? Porque essa estória do salário devia ser chão que tinha dado uvas, não era mesmo herr jose?

    Um estudo sobre a iliteracia seria também importante. Mas um outro sobre a cupidez desta gente também seria muito útil

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  3. Muito obrigado pela demonstração que nos explica por A+B em como é continua retórica patronal com vistas curtas e de deficiente capacidade evolutiva para fazer face a um mercado cada vez mais competitivo, optando pela falácia de baixos salários (no caso tão bem demonstrado, o mediano) vs lucro.

    As entidades patronais insistem, elas sim, numa verdadeira luta de classes (irónico, não é?)olhando para os trabalhadores como um peso morto para o negócio e nunca uma mais valia para o mesmo sem apostar no pagamento de salários condizentes à responsabilidade do trabalhador assim como uma continua aposta no conhecimento do mesmo.

    Não vale mais a pena tapar o sol com a peneira; o ido (des)governo apostou numa catastrófica desvalorização do trabalho e no desinvestimento da modernização das empresas para competir em mercados cuja a mais valia do nosso produto (que nunca foi a quantidade mas sim a qualidade) foi enviesado pelos novos ponteiros da concorrência nacional para com mercados onde a legislação laboral é ainda uma miragem e onde prima a quantidade sem qualidade deixando-nos a meio caminho do lucro a medio/ longo prazo que apenas a curto prazo incentiva as exportações a curto prazo sem uma verdadeira consolidação estratégica dos mesmos onde apenas a proximidade geográfica de certos mercados importadores disfarçam, pontualmente, a estratégia medieval dos nossos "patrões".

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