terça-feira, 17 de maio de 2016
Estejam atentos aos vírus...
No debate sobre os contratos de associação, creio que a chamada de atenção do Nuno Teles deve ser levada a sério por toda a esquerda, dado o tipo de argumentos que tem sido mobilizado por demasiada gente deste lado da barricada:
"A discussão em torno dos abusivos contratos de associação está centrada em argumentos de mercado (…) [T]odo o tipo de argumento tem o seu lugar. No entanto, se queremos perceber melhor a força social de quem está do outro lado da barricada e sair da trincheira defensiva nas discussões mais latas em torno da educação, então temos de conseguir articular as diferentes lutas na construção de um serviço público, universal, gratuito e de qualidade, não sujeito ao mercado ou aos processos que o procuram mimetizar. Caso contrário, a vitória de hoje contribuirá para a derrota de amanhã."
Neste campo, António Costa mostra como se faz, colocando o argumento dos recursos numa posição subordinada em relação a valores bem mais importantes:
"E se há área em que é fundamental concentrar os recursos é na defesa e no financiamento da escola pública porque é a escola de todos, a que garante a igualdade de oportunidades a todos e aquela que permite a todos uma efectiva liberdade de poder aprender com a qualidade que todos temos de exigir".
Talvez não seja por acaso que o PS anda a falar criticamente do "vírus da fé excessiva na autorregulação dos mercados”, fórmula ambígua, já que não há mercados realmente existentes que sejam auto-regulados, mas que parece ir no bom caminho.
E já que estou a implicar com a argumentação de certa esquerda, deixem-me só referir mais uma dimensão: a crítica aos "falsos" liberais nacionais porque estes defendem a subsidiação dos privados na educação. É como se a esquerda precisasse de resgatar um qualquer bom liberalismo. Estranha e equivocada prática. De Adam Smith a Milton Friedman, passando por John Stuart Mill, se há algo que une muitos economistas políticos liberais e neoliberais (Friedman usou este termo, já agora) é a defesa de uma certa subsidiação pública da educação, reconhecendo que este é um campo onde existem falhas de mercado, para usar uma expressão de uso corrente, e tendendo a promover a separação entre financiamento mais ou menos público e provisão tendencialmente privada como forma de as resolver. Neste aspecto, o cheque-ensino de Milton Friedman, a partir dos anos cinquenta do século XX, é o culminar do esforço intelectual e político para resolver falhas de mercado com subsidiação pública conforme à manutenção do princípio concorrencial de mercado. Não é defeito, mas sim feitio. Os nossos liberais estão perfeitamente dentro de toda uma tradição internacional. Não a subestimem, por favor.
Dir-me-ão que esta não é a discussão. É sim senhor. Como muitos liberais reconhecem, os contratos de associação são um instrumento, tosco e vulnerável, mas um instrumento, para criar, qual plano inclinado na lógica que o Nuno Serra aqui expôs, o hábito de separar o financiamento, público, da provisão, privada, organizando politicamente, de forma progressiva, um mercado educativo. Não foi aliás por acaso que Crato defendeu contratos de associação mais generosos, ao mesmo tempo que ia colocando no debate a ideia mais ambiciosa do cheque-ensino.
A mesma lógica, já agora, está presente nas parcerias público-privadas na saúde ou em tecnologias políticas como o cheque-dentista. A esquerda que queira ganhar este debate e os outros nos sistemas de provisão de saúde e de educação, por exemplo, não pode dar para o peditório da liberdade de escolha, uma das grandes ilusões que alimenta todas as desigualdades. A esquerda que queira ganhar tem de combater com denodo o vírus liberal em vários sistemas de provisão. E, já agora, o vírus gémeo do utilitarismo que acompanha tantos dos seus argumentos...
João Rodrigues, Quando se critica liberais subsidiodependentes não se está a legitimar um bom liberalismo. Está-se é a chamar chupistas ao liberais, que é o que eles são. Qualquer liberal é um aldrabão chupista e intelectualmente desonesto.
ResponderEliminarMais uma vez, um excelente e lúcido post. A ler nas linhas e nas entrelinhas
ResponderEliminarComo tudo que é discurso de esquerda, a leitura deve ser feita do fim para o princípio.
ResponderEliminarVisto desse modo só posso dizer que este é um post coerente e verdadeiramente de esquerda.
«A esquerda que queira ganhar tem de combater com denodo o vírus liberal em vários sistemas de provisão. E, já agora, o vírus gémeo do utilitarismo que acompanha tantos dos seus argumentos...»
Deixemo-nos de economicismos que a questão é ideológica e é nessa base que tem de ser discutida.
Já lá vai o tempo em que a esquerda ganhava terreno à porta das fábricas, mobilizando os proletários.
Os tempos mudaram. Agora é preciso apanhá-los no berçário, levá-los guiados até à idade adulta sem interferências que os desviem para o conhecimento das liberdades e da inventiva dos privados, esses corruptores dos bons costumes, dos regulamentos e das directivas de quem conhece a verdade e é guia dos povos.
«a esquerda…não pode dar para o peditório da liberdade de escolha»
Nada de mais óbvio: o verdadeiro esquerdalho é guia, não seguidor; dirige, não é dirigido; é luz, não é sombra!
«aos “falsos” liberais nacionais porque estes defendem a subsidiação dos privados»
Nada de lhes dar troco. Pouca conversa!
O verdadeiro liberal não tem direito a ensino gratuito, faz pela vida e paga para aprender. Todos os outros são falsos liberais, oportunistas que se aproveitam do ensino gratuito - essa benesse que só à esquerda pertence e que só a esquerda tem o direito de administrar.
Estávamos no ano 1975 a bordo da Fragata Comandante Hermenegildo Capelo, em Benguela, encostados a´ muralha do cais de descarga do minério de ferro extraído das minas a céu aberto de Cassinga, Angola, quando comecei a ler
ResponderEliminarMilton Friedman (com suas falhas do mercado)
e outros senhores da economia neoliberal
O vosso artigo fez voltar a´ lembradura tal situação de Guerra Civil em Angola derivada da Guerra Colonial. E já agora as oitocentas e quatro toneladas de ouro existentes então, em reserva no Banco Mundial.
A ambiguidade não estará no mercado mas sim nos ´mercantilistas´ que julgam viver em pleno seculo XIX, isto e´, são Narcisistas…
Talvez seja a ultima excrescência do capitalismo como tal. Talvez…
Pelo que se ouviu ontem nos Pros e Contras e pela arrogância com que blasfemavam, há que tomar com firmeza as rédeas da governação.
Ainda que receoso! De Adelino Silva
Eu não subscrevo os termos do comentário do anónimo das 15:54, mas subscrevo a questão que levanta: criticar a Hipocrisia de posições supostamente liberais não é legitimar um qualquer Liberalismo. Mas sublinho a coerência de quem defende o cheque-ensino, por exemplo, por oposição a quem considera que cabe ao Estado dar tratamento preferencial a certas organizações educativas (leia-se, as ligadas à Igreja Católica). De qualquer maneira, não vejo nada de errado na Liberdade de Escolha per si. Acontece que considero que ela se subordina a princípios mais importantes, em primeiro lugar a Igualdade no acesso a um ensino de mínima qualidade, essencial para assegurar a Igualdade de oportunidades, e que é minada por todas as formas de subsidiação dos privados, cheque-ensino incluído, e em segundo lugar o equilíbrio orçamental e a boa gestão das finanças públicas que a Direita manda às malvas quando se trata de dar prebendas aos amigalhaços do costume.
ResponderEliminar“…serviço público, universal, gratuito e de qualidade, não sujeito ao mercado “
ResponderEliminarOportuno postal sobre a “lengalenga do mercado na educação”. De facto, a melhor resposta às contas e erros de viés da direita (as turmas que custam X, a taxa de sucesso que é Y) é a “defesa e o financiamento de uma escola de todos”. Ponto. O erário público nunca pode servir para sustentar o individualismo de alguns.
"Como tudo que é discurso de esquerda, a leitura deve ser feita do fim para o princípio"
ResponderEliminarMas a que propósito tal afirmação? Foi uma epifania? Uma revelação? Uma alucinação particular? Um produto resultante de auto-flagelação intelectual?
Ou trata-se apenas do vulgar senso comum dum que acha que o sol gira à volta da terra?
"Deixemo-nos de economicismos"?
ResponderEliminarUm exercício útil é aconselhar o sujeito que diz isto a saber que tipo de blog é este e o que é a economia política.
Não custa muito. Verá que a ideologia está aqui mesmo sem necessidade destas bravatas de ignaro personagem
"apanhá-los no berçário"?
ResponderEliminarMas quem quer reproduzir o modelo do senso comum a encaixar na mioleira das crianças e aí permanecer como guia e farol da actividade intelectual dos seres humanos não é quem diz tais afobações?
"conhecimento das liberdades e da inventiva dos privados"
Como inventiva estará incluído o processo dos privados onerarem o estado à custa dos tais contratos de associação aqui denunciados? Ou a inventiva de deixar os privados colégios ensinarem o senso comum que é o Criacionismo e os aventesmas anti-ideiais da Revolução francesa?
"não pode dar para o peditório da liberdade de escolha"...
ResponderEliminarA frase está incompleta.
Deixemo-nos de demagogias baratas e corrijamos quem tenta aldrabar à custa de guias, seguidores, diriges, não diriges, luz e sombra! !!!
Eis então a frase correcta e não adulterada:
"A esquerda que queira ganhar este debate e os outros nos sistemas de provisão de saúde e de educação, por exemplo, não pode dar para o peditório da liberdade de escolha, uma das grandes ilusões que alimenta todas as desigualdades".
"Nada de lhes dar troco" "Pouca conversa"
ResponderEliminarMas então que conversa é a deste que passa aqui o tempo a meter conversa ( se é mesmo isso que faz) e a lastimar-se depois que lhe dão conversa demais?
"o verdadeiro liberal não tem direito a ensino gratuito"
ResponderEliminarFalso. Essa é de cabo de esquadra. está escrito taxativamente: todos devem ter direito a um "serviço público, universal, gratuito e de qualidade, não sujeito ao mercado ou aos processos que o procuram mimetizar".
Inclusive os verdadeiros e os falsos liberais. E mesmo os que, sendo o mais que quiserem, abominam o conhecimento e como consequência dão estes erros de palmatória
"Todos os outros são falsos liberais, oportunistas que se aproveitam do ensino gratuito"
ResponderEliminarMais uma vez a iliteracia deixa marcas.O que se pretende e repete-se é "um serviço público, universal, gratuito e de qualidade, não sujeito ao mercado ou aos processos que o procuram mimetizar"
Neste campo até mesmo os "falsos liberais" têm direito a esse ensino, público, universal, gratuito e de qualidade." É mesmo ou deve ser, universal.
Não têm é o direito de parasitarem o Estado, desviando verbas públicas para verbas privadas. Nem de pedirem dinheiro para um ensino que não é público, universal e de qualidade, quantas vezes assente em sensos comuns de muito duvidosa proveniência
cagalhão zé
ResponderEliminarsó dizes merda
é a única coerência que te conheço
Jaime Santos queixa-se dos meus termos, que não subscreve. Vá-se lá saber porquê. Acaso Cristóvão e Jose lídimos representantes da coisa se distanciam do dito? É arranjar-me um espécime que não se adeque ao descritivo como o sapatinho da Cinderela que pensarei em reconsiderar. Até lá, sou exacta e cientificamente exacto, o que, com mariquices, Jaimes Santos nunca alcançará.
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