quarta-feira, 13 de maio de 2015

Uma década


E o contexto é o de uma sociedade desigual nos sacrifícios e nas vantagens, precária e insegura para a maioria e garantista e blindada para uma minoria. O problema que aqui me interessa não é apenas ético, apesar da ética também contar. É social. É o de uma elite que vive num mundo à parte, com regras à parte, e é por isso incapaz de perceber a vida dos outros. Poderiam ser ricos e perceber tudo isto. Poderiam ser pobres e não perceber nada disto. A vida está cheia destas incongruências e não sou dos que acham que alguém que defende a justiça social tem obrigação de levar uma vida espartana e que os pobres têm obrigação de ser socialistas. Mas julgando, como julgam, que os seus privilégios excecionais resultam do mérito, não podiam deixar de julgar que as banais dificuldades dos outros resultam de desmérito. Quem vive confortável na injustiça nunca poderá compreender a sua insuportabilidade. Quem pensa que o privilégio é um direito nunca poderá deixar de pensar que a pobreza é um castigo.

Excerto de uma crónica de Daniel Oliveira - A vida dos outros. Não sei se está no livro, mas acho que pode estar. É preciso dizer os nomes e sobretudo identificar as estruturas que também têm nome. É uma década disto por um dos imprescindíveis da opinião publicada.

16 comentários:

  1. Noto que o livro contou com apresentação por pelo menos um destacado membro da elite criticada. Seria bom que quem queira acabar com as injustiças percebesse que não pode contar com ajuda de quem delas beneficia. A recorrer a isso colocará sempre o combate num terreno onde está destinado a perder.

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  2. “Sociedade precária e insegura para a maioria e garantista e blindada para uma minoria.”

    “Queriam o quê, os malandros, direitos adquiridos?”

    Uma maioria que não pára de crescer, até acabar por ir viver para debaixo da ponte.
    (150 mil famílias não conseguem pagar o empréstimo da casa). Aqui
    http://www.jn.pt/PaginaInicial/Economia/Interior.aspx?content_id=4233560

    Mas para a Troika e o governo do Passos isto tem sido todo um “pograma” de sucesso! (Até serem corridos à paulada.)

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  3. há muito que deixei de o ler.

    tenho o joão rodrigues e mais próximos de Oliveira, há, por exemplo, Bateira, Teles, Mamede, que ao menos não são intelectualmente desonestos.

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  4. "E o contexto é o de uma sociedade desigual nos sacrifícios e nas vantagens, precária e insegura para a maioria e garantista e blindada para uma minoria."

    Esta frase merece uma atenção particular, nomeadamente sobre duas questões:
    - Quem faz parte, afinal, da minoria? Há algumas categorias óbvias (grandes empresários, ...) e consensuais (não vale a pena portanto discuti-las). E os quadros médios/altos da Administração Pública (médicos, juízes, ...)?
    - Quem assegura o garantismo? Quem defende, por exemplo, o garantismo dos tais quadros médios/altos da Administração Pública?

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  5. como se vê com 14 de maio de 2015 às 11:20, há sempre uns tipos a querer atirar lama para a ventoinha.

    perante os das negociatas de milhões, transitando da coisa pública e política para a banca e finaceiras, altos postos nas construtoras e escritórios de advogados concretos, filhinhos de banqueiros e influentes, acena com quadros intermédios e altamente preparados da função pública.

    trafulhas.

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  6. O anónimo das 11:20 está a pensar pequeno. Não é na função pública que está o problema (embora a sua instrumentalização demonstrada em casos notórios e recentes seja um problema). Quem está blindado são os Donos de Portugal. Os que garantem rendas em PPPs., os que têm acesso privilegiado à privatização de monopólios naturais, aos que pagam aos escritório de advogados com assento no parlamento para terem leis à medida.... etc etc...
    Talvez não haja categorias muito estanques, a partir de certo nível. Mas há que distinguir entre corruptos e quem por último beneficia dessa corrupção. (QUe a lei certa pode até tornar legal)

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  7. Também vai ser lançado hoje, ao fim da tarde, o livro “Cercado”, que descreve os bastidores da vida política de Sócrates nos últimos dez anos (seis dos quais passados ao leme do PS e do Governo de Portugal):

    expresso.sapo.pt/sociedade/2015-05-14-Socrates-chegava-a-pedir-20-mil-euros-com-um-dia-de-intervalo

    Vale a pena lembrar que Daniel Oliveira - cujo livro sobre a "década dos psicopatas" também vai ser lançado hoje, ao fim da tarde - defende com unhas e dentes que é "tempo de avançar" ao encontro do partido que se deixou conduzir por Sócrates e ainda disso se orgulha.

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  8. O que tira força é os sucessivos cenários de calamidade iminente, espiral recessiva.Como não se verificam desacreditam. Bater na tecla sem umas propostas bem estruturadas so acaba por desacreditar os demagogos.Cantar loas a maus governos gregos é dar tiros nos pés e arruinar a credibilidade

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  9. Não se verifica, diz o Cristovao montado na boa vida dele e do direito ao castigo para os outros.

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  10. “Uma calamidade eminente e uma espiral recessiva que não se verificam…”

    O A. Cristóvão não deve viver cá, não lê/ouve notícias, nunca ouviu falar da pobreza envergonhada (só conhece o Banco Alimentar!), de milhares de pessoas sem qualquer rendimento, de jovens de 30 anos sem trabalho, de gente a ficar sem tecto…

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  11. Caro L.Rodrigues,

    Mas,os

    "os Donos de Portugal. Os que garantem rendas em PPPs., os que têm acesso privilegiado à privatização de monopólios naturais, aos que pagam aos escritório de advogados com assento no parlamento para terem leis à medida.... etc etc... "

    ganham eleições livres !


    O problema não será também porque:

    "função pública que está o problema (embora a sua instrumentalização demonstrada em casos notórios e recentes seja um problema)"

    pelo seu tamanho desmesurado, e á espera de recuperar os "direitos/privilégios adquiridos" vota neles ?

    cumps

    Rui Silva


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  12. Diz que é contra as elites e blá-blá-blá. Mas tem um partido feito para tentar conservar o PS no poder. Que aliás se vai lixar com isso. O próprio Daniel veio dizer que é um bluff que queira puxar o PS para esquerda, porque ao fim da tarde estarão sempre dispostos a negociar. Oliveira é das elites. Nunca teve, claro, porque é mais hábil que o seu amigo Tavares (com quem nunca iria fazer um partido junto, dizia Oliveira), a lata de dizer que fazia tudo por um pézinho no Conselho de Ministros.

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  13. Subscrevo as palavras de Dias e de L. Rodrigues

    Quanto a quem diz que "os donos de Portugal" ganham eleições livres...

    Eis a confissão pública que os donos de portugal são a governança que nos governa."Os que garantem rendas em PPPs., os que têm acesso privilegiado à privatização de monopólios naturais, aos que pagam aos escritório de advogados com assento no parlamento para terem leis à medida"

    Quanto Às eleições livres...Havia muito a dizer .
    Mas sempre é bom lembrar o que coelho e portas diziam antes das eleições. Ora quem promete uma coisa e não cumpre...no olho da rua com carta de despedimento por justa causa e pena de prisão pelas patifarias que fez.Até mesmo os neoliberais mais honestos hão-de concordar com isto.
    ( e não falemos da corrupção promovida pelos tais "donos de Portugal".Afinal filhos dilectos dos Donos de Portugal de outrora)

    Quanto á frase citada pelo Sr Silva, que eu vou repeto para que não haja dúvidas:

    " Não é na função pública que está o problema (embora a sua instrumentalização demonstrada em casos notórios e recentes seja um problema). Quem está blindado são os Donos de Portugal."

    A tentativa ínvia de culpar os outrora designados como f. públicos já teve melhores dias.
    As continhas domésticas de quem acha os números excessivos já foram desmontadas.Os ditos "privilégios" também. (Só a palavra demonstra bem ao que se vem e o que se procura).
    E aí remete-se para o texto claro de L. Rodrigues.

    (Faz lembrar um disparatdo comentário dum fundamentalista dos mercados e das negociatas privadas que procurava justificar a venda aos bocados da riqueza do país pela necessidade de impedir "privilégios" para o público.Ah,este apetite pelo dinheiro, sem vergonha e sem frieo, que subverte toda a racionalidade e toda a dignidade humana.

    De

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  14. MRS na apresentação! E não gosta das elites. Isso é tão Tempo de Avançar!

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  15. António Guerreiro hoje

    «Fábula Política para principiantes

    Numa sociedade ideal, cujas leis fossem a delicadeza, a cortesia e a afabilidade, num mundo sem constrangimentos nem fricções que fosse a combinação de todas as possibilidades compatíveis, de tal modo que o resultado fosse a bondade máxima, nesse mundo descrito por Leibniz, na sua Monadologia, como o melhor dos mundos possíveis, Daniel Oliveira reuniria as suas crónicas num volume intitulado A Década dos Psicopatas e teria Marcelo Rebelo de Sousa a fazer a apresentação do livro.

    Nos convites e nos comunicados à imprensa haveria de ler-se: “Deus calcula e o mundo faz-se”. Mas essa luz fina que emana do sistema leibniziano, onde tudo concorre para uma ordem hierarquizada e harmoniosa, não penetra onde há política, nem sequer ilumina os doces costumes da democracia.

    Ainda assim, sem ser preciso supor a existência desse mundo — onde tudo se faz e se desfaz por correspondências, harmonias e concordâncias — vamos ter na mesma Marcelo Rebelo de Sousa a apresentar os Psicopatasde Daniel Oliveira. Sob tais condições, o acontecimento não é propriamente uma mónada, um mundo fechado sem portas nem janelas, mas uma escancarada fábula política do nosso tempo.

    Ou melhor, uma parábola, como é — por exemplo e para regozijo de quem gosta de fábulas para metafísicos — O Silêncio das Sereias, de Kafka. Não é que a convocatória feita a Marcelo Rebelo de Sousa, para o lançamento do livro, seja obrigatoriamente um sinal de partilha, com o autor, de opiniões e escolhas políticas. Devemos, aliás, presumir o contrário.

    Mas há, logo à partida, um dado com base no qual se institui um consenso fundamental: ambos aceitam entrar no jogo de encenações e papéis completamente estereotipados que empesta todo o debate político e desencoraja a simples ideia de entrar nele. A questão é esta: Marcelo Rebelo de Sousa representa, ao mais alto nível, um discurso que quer passar por análise ou comentário políticos, mas de onde a política foi evacuada.

    Ele assimilou completamente a política quer à luta pelo poder, quer ao exercício e ao objecto desse poder. Para ele, toda a política é uma questão de tácticas e estratégias, de fintas e simulações. E ganha o que for mais cretino. É desta matéria que são feitas as suas prelecções, enquanto animador do crochet televisivo.

    E, nesse posto, ele é “ o professor”, isto é, aquele que ocupa o lugar da verdade e detém o saber do expert. Esta ideia de uma inteligência que sabe da coisa política e se dirige às pessoas que não sabem, e que por isso lhe fazem perguntas para obter a resposta oracular, é uma negação da política.

    Na melhor das hipóteses, aquilo de que Marcelo Rebelo de Sousa fala pertence à ordem da polícia (ele próprio transformou-se num cartoon de polícia sinaleiro) e não à ordem da política, para nos referirmos a uma oposição já clássica. Esta noção de polícia deve ser entendida não no sentido da repressão, mas da lógica puramente gestionária que ordena a sociedade por funções, lugares e títulos a ocupar.

    Ora, um cartoon pode chegar até a Presidente da República (não seria, aliás, o primeiro), mas não serve para iniciar qualquer conversa ou diálogo que tenha como tarefa repolitizar o espaço político. Em relação ao que Marcelo Rebelo de Sousa diz e opina não importa discordar, estar mais à direita ou mais à esquerda, ou convidá-lo para o espectáculo pluralista do conflito das opiniões. É outra coisa que se exige, se a tarefa é também a de impedir a cretinização comunicativa e opinativa. Essa coisa chama-se “diferendo” e significa um desentendimento de base.»

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  16. De, O que repugna Cristovao Rui Silva não é a promiscuidade entre decisores políticos e financeiros, a circulação entre a política e os negócios, o nepotismo, padrinhos e afilhados.

    O que repugna Cristovao e Rui Silva é a existência de uma Função Pública com quadros bem preparados e com salários dignos.

    Vale a pena dar trela e realimentar quem tem da cidadania o entendimento da lei do mais forte na Selva?

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