domingo, 22 de fevereiro de 2015

Nesta União Europeia é possível ir de A para E?


Hoje sabemos que há mais do que uma resposta possível à crise. Existe A (de austeridade) e existe também B, C, D e E (de esperança). A maioria dos gregos decidiu fazer alguma coisa para passar de A a E. Com isso conseguiu já uma coisa invejável: um governo que ao lado da maioria do povo também quer passar de A a E.

Esse governo começou a negociar com os guardiões de A. A negociação continua. O que conseguiram? Não farei balanços e muito menos julgamentos, precisamente porque a negociação ainda vai no adro e sobretudo porque acho indecente, do lugar relativamente confortável onde me encontro, arrogar-me a julgar quem teve a coragem de assumir a responsabilidade de uma passagem de A para E.

Há no entanto uma pergunta que se vai tornando obsessiva e que não consigo varrer para debaixo do tapete: ainda há nesta Europa possibilidade de passar de A para E, ou a União Europeia, particularmente a zona euro, transformou-se numa máquina capaz de suprimir no ovo qualquer veleidade de deslocação de A para E?

A União, particularmente a zona euro, constitui (digamos assim) uma estrutura feita de tratados, regras e outras instituições. Esta estrutura é dotada de instrumentos disciplinares poderosos. O Banco Central Europeu, em particular, dispõe (literalmente) de armas de destruição maciça.

Essa estrutura, tendente a conservar A, tanto pode adaptar-se para acomodar tensões decorrentes de passagens locais a E, como pode exercer pressão para adaptar, isto é suprimir, as tentativas locais de passagem de A a E.

É possível alterar a estrutura a partir de transições locais de A a E?. Não é fácil. Essas transições serão sempre desfasadas no tempo, pelo que se a estrutura for capaz de suprimir cada uma delas à nascença, a transformação da estrutura não ocorre. A transformação da estrutura a partir de transições locais só pode ocorrer se a estrutura for ela própria relativamente plástica, adaptando-se ela. Será plástica? Isso é o que estamos a descobrir a partir da experiência grega.

Se a rigidez predominar, as tensões locais continuarão a aumentar. A estrutura não verga e não vergando tenderá a quebrar. E o problema como sempre acontece em situações deste tipo, é não sabermos o que significa exactamente “quebrar”. Era preferível que vergasse, mas se isso não acontecer…

Estou certo, ou estou errado? Admito estar errado. Se calhar estou a ser muito “mecânico” ou “estruturalista”. Mas estou aberto à discussão. Quero mesmo que a discussão aconteça, sem anátemas, etiquetas de “soberanista” ou de “federalista”, de “europeísta” ou de “anti-europeista”. O pior seria varrermos o problema para debaixo do tapete. Estamos numa encruzilhada. Temos de enfrentar o dilema e sobretudo continuar a forçar a transição de A para E, apesar de possíveis desacordos quanto à plasticidade da estrutura e a direção desejável da sua evolução.

10 comentários:

  1. Joaquim Tavares de Moura22 de fevereiro de 2015 às 16:02

    Caro José M. Castro Caldas,

    Esta questão é talvez a de maior importância nos dias de hoje e gostaria de deixar aqui a minha opinião.
    No actual quadro institucional e jurídico da União Europeia o ir de A para E não é possível à luz dos tratados, sobretudo do tratado orçamental.
    Curiosamente esta questão não se coloca para a Grécia na medida em que ela está sob um programa de assistência financeira onde as condições são as que forem acordadas.
    As questões principais são três:
    1º) O tratado orçamental. Com o actual tratado orçamental, independentemente de ser adoptada uma leitura mais estricta ou mais flexível, não há forma de fugir a A, para os países com um endividamento externo elevado;
    2º) A falta de coordenação da política econónima à escala da UE. De modo a evitar que o choque externo não acentue o efeito recessivo das politica de austeridade nos países com defices públicos excessivos.
    3º) Mudança do estatuto do BCE, garantindo um papel mais relevante de intervenção no mercado de modo a ser garante da promoção do emprego e do crescimento económico.
    4º) Uma política orçamental comunitária, com reforço significativo do fundo de coesão (teria de passar para o triplo) de modo a atenuar o choque das políticas monetárias nas economias menos competitivas e periféricas.
    5º) Política Fiscal. Iniciar um processo gradual de harmonização das políticas fiscais, sobretudo IRC, e tributação autónoma dos rendimentos de capital e das transações nos mercados financeiros (taxa tobin).

    Saber se estas mudanças são possíveis no quadro político actual é outra questão. Sobretudo se tivermos em conta que algumas destas mudanças (mudança do estatuto do BCE) colidem com a constituição alemã. Assim, coloca-se a questão de saber se os alemães querem outra Europa. E aí eu acho que a resposta é não.

    Resumindo, mudar a Europa para que seja possível ir de A para E, depende em primeiro lugar da Alemanha. E, na minha opinião, a Alemanha só muda se a isso for obrigada e por pressão externa. Isto é, não chega a Grécia, é preciso, a Itália, a França, Portugal e a Espanha, pelo menos.

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  2. Comparando as listas dos objectivos com o que foi pre-acordado não é nada animador.Talvez se entenda porque depender do dinheiro dos outros só poderia dar nisso, era irrealista querer impor regras. O que não bate bem é as declarações dos puliticos gregos a explicar aos seus cidadãos: não noto diferença dos aldrabões a que estamos habituados.

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  3. Joaquim Tavares de Moura22 de fevereiro de 2015 às 16:38

    A minha desculpa pelo erro.

    Onde se lê "As questões principais são três" deve-se ler "As questões principais são cinco".

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  4. Obrigada: escreveu claramente os pensamentos confusos que me assolavam. É verdade que é preciso ir de A à Esperança. E é difícil. Não me parece provável que tenha sido uma capitulação. Que a situação deve ser extremamente difícil, não há dúvida. E que para chegar a "E" muito caminho há que andar, na Grécia principalmente, mas em Portugal, Espanha, ...O governo Grego não se pode deixar isolar, do povo grego e da solidariedade dos restantes povos europeus.

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  5. Os comentadores afectos ao governo vaticinam grandes cedências do governo grego. Na lógica de que para haver equilíbrio orçamental, ou se aumentam impostos ou se corta nas funções sociais do estado - na Educação, na Saúde ou na Protecção Social e, dizem, não haverá grande margem para novo aumento de impostos na Grécia.
    Quando se fala em impostos será necessário afirmar antes, de que tipo de impostos se trata. Impostos que incidam sobre a maioria da população, sobre os trabalhadores ou impostos que incidam sobre os mais ricos. Isto é, estamos a falar de impostos sobre o trabalho ou impostos sobre o capital?
    Ora, o que os governos do euro têm imposto aos cidadãos desde o início da crise financeira dos bancos, tem sido cortes sociais e aumento de impostos sobre unicamente o trabalho. Reformas fiscais no sentido de aumento de impostos sobre o capital é coisa que nenhum país tomou. Não se aumentou o IRC (em Portugal diminuiu), não se congelaram os benefícios fiscais às grandes empresas (em Portugal segundo TC em 2013 foram mais de 1.100 milhões de euros de isenções fiscais), não se taxam fortunas nem se aplicam taxas nas transacções financeiras, permite-se que grandes empresas fujam às suas obrigações fiscais pelo simples registo em paraísos fiscais, etc.
    Não deverá surpreender ninguém se o governo grego apresentar na próxima segunda-feira um conjunto de reformas que, a par de uma profunda reforma fiscal que aplique impostos ao capital enuncie uma profunda reforma na administração pública no sentido de eliminar serviços paralelos parasitas e eliminar a corrupção.

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  6. Nesta UE é possível qualquer país fazer o que bem lhe apetecer. Viu-se isso nas últimas décadas na Grécia e em Portugal. Em ambos os países os estados pediram dinheiro emprestado e gastaram em coisas que não previam qualquer retorno que permitisse devolver e pagar os custos dos empréstimos. O resultado está agora à vista.

    Fora da UE o resultado em qualquer desses países possivelmente teria sido ligeiramente diferente, mas não por falta de vontade dos governantes. Provavelmente teriam estoirado mais cedo, pois quem emprestou não lhes daria tanta credibilidade estando fora da UE.

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  7. “O resultado está agora à vista”.
    Pensar que a crise financeira de 2008 que atingiu os bancos e logo a economia dos estados é coisa do “viver acima das possibilidades” é uma perfeita “história para crianças”.
    Sabia o António Silva que a Espanha, país igualmente atingido pela austeridade, tinha em 2007 uma dívida pública de 27% do PIB, inferior e muito à da Alemanha e um super ávit e não défice orçamental quando a Alemanha no mesmo ano tinha défice?
    Hoje a Espanha está com uma dívida pública da ordem dos 100%.

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  8. Carlos Sério, obrigado, aí está outro bom exemplo. A Espanha dentro da UE também fez o que quis, nada a impediu de se meter em loucuras e aí está o resultado.

    Mas penso que não foi tão entusiasmante quanto isso, se olharmos para os dados do Eurostat sobre o PIB e a dívida pública:

    http://ec.europa.eu/eurostat/tgm/refreshTableAction.do;jsessionid=Exyzll-FPrvlrqqMb_42c0EsEpGyMDjmQtp5-XLSb8C4xvyZ-Dtd!-1700085361?tab=table&plugin=1&pcode=tec00001&language=en

    http://ec.europa.eu/eurostat/tgm/refreshTableAction.do;jsessionid=MfCzlPMXc8bBEeCReDR3s1YVENNCqa295vY9NK58J5Pa_iLyFqmI!-1700085361?tab=table&plugin=1&pcode=teina225&language=en

    Podemos constatar que o PIB em 2007 e em 2013 foi, respectivamente, de 1 080 807 M€ e de 1 049 181 M€, enquanto a dívida pública foi de 383 798 M€ e de 966 181 M€.
    Ora calculando os rácios obtemos valores de 35.5 % em 2007 e de 92.1 % em 2013 de dívida pública sobre o PIB.

    Hoje serão certamente valores diferentes, mas ainda não estão disponíveis sequer dados de 2014. De qualquer forma dá para se ficar com uma boa ideia da magnitude. Portanto, mais uma vez obrigado.

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  9. O caminho a seguir não é de A a E; Mas de C como caos, a L como Libertação.

    Cada minuto que passamos, como reféns, a falar do embuste demente ao qual a mafia que o criou deu o nome de "união europeia", é mais um minuto perdido a não falar no essencial :
    Quando ? Qual é a data ?

    - ou da explosão desta inépcia da história levada a cabo por um bando de predadores psicopatas e irresponsáveis

    - ou a data da libertação, com a aplicação do Artigo 50 do tratado TUE (de âmbito fascista, imposto à força às populações alvo, incluindo as que votaram contra ele)

    E ontem já era tarde.

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  10. "O caminho, faz-se caminhando."

    ...é preciso, é ter pernas!


    As luminárias de serviço, fartam-se de cortar pernas!

    Sempre de forma cirúrgica, lá vão cuidando dos interesses... ESCLAVAGISTAS!

    A democracia representativa, é o bisturi dos instalados.

    Subverter a VONTADE do POVO, é a água que alimenta estes sabujos.

    A fonte, tem de ser SECA.

    Só assim, será possível chegar a ... "E" !

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