Em artigo no Público, «Pelo direito a nascer», o Juiz Pedro Vaz Patto afirma que, «na sequência da vitória do "sim" no referendo, o aborto por opção da mulher até às dez semanas de gestação foi não apenas despenalizado (como decorria claramente da pergunta), mas também legalizado, isto é, passou a ser realizado com colaboração directa ou indirecta do Estado, em estabelecimentos de saúde públicos ou legalmente autorizados». E considera, por isso, ser «difícil afirmar que, contra o que propugnavam muitos partidários do "sim" no referendo de 2007, o aborto não é fomentado, promovido e incentivado pelo Estado».
Sem rodriguinhos de linguagem, o que Vaz Patto está a dizer é que, desde a vitória do "Sim" no Referendo sobre a descriminalização da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG), o aborto passou a ser «fomentado, promovido e incentivado pelo Estado», apontando, logo de seguida, «as consequências deste regime»: para Vaz Patto, «aproximadamente uma em cada cinco gravidezes termina em aborto voluntário, sendo que um quarto destes corresponde a repetições». E mesmo reconhecendo, a custo, uma evidência que o próprio não nega nem poderia negar (o facto de «o número absoluto [de abortos "por opção da mulher" ter] descido ligeiramente»), procede ao remate final do seu argumento: «a proporção entre abortos e nascimentos (cujo número absoluto ainda desce mais) vai subindo de ano para ano». E é bem verdade, Dr. Vaz Patto: como mostra o gráfico seguinte, essa proporção situava-se num patamar próximo de 17,6% em 2009, aumentando gradualmente até atingir, em 2013, os 21,0%.
O problema é que temos um problema matemático de interpretação dos resultados. Porque sobe a proporção de IVG face ao número de nascimentos? Será por que o número de abortos não cessa de aumentar, em virtude dos estímulos desbragados e imorais do Estado, como sugere o Juiz Vaz Patto? Não: o número de interrupções voluntárias de gravidez por opção da mulher passou aproximadamente de 19.500 em 2010 para cerca de 17.400 em 2013 (registando portanto uma redução na ordem dos 11%, que não pode ser qualificada - como faz Vaz Patto - de «ligeira descida»). O que se passa é que, alavancada pela devastação económica e social causada pelo «ajustamento» e pela austeridade, a natalidade se encontra em queda livre, gerando assim um clássico «efeito de denominador». Isto é, a ilusão de que um fenómeno revela uma determinada tendência (contrária à que de facto se verifica), apenas porque a variável com que é calibrado gera esse efeito enganador. No caso em apreço, é a descida abrupta e paulatina da natalidade, nos últimos anos, que faz pensar que as IVG por opção da mulher estão a aumentar quando, na verdade, sucede exactamente o contrário.
Não é demais dizer que todos têm o direito a ver respeitadas as suas convicções (foi aliás isso, curiosamente, que sempre esteve em causa, do lado do "Sim", no referendo) e a expressá-las livremente junto de terceiros (como os que, por exemplo, como refere Vaz Patto, tendo votado a favor da descriminalização não aceitariam «que o Estado fomentasse, promovesse ou incentivasse o aborto»). Mas exige-se também a todas as partes, na contenda, um mínimo de escrúpulos e seriedade no esgrimir de argumentos.
NOTA: Agradeço à Shyznogud e à Fernanda Câncio a ajuda imediata para localizar os Relatórios de Registos da Interrupção da Gravidez.
A pergunta do referendo em 2007 foi
ResponderEliminar«Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?»
O que estava em causa era a criminalização das mulheres por uma decisão que diz respeito, em 1º lugar à mulher. Eu concordei, não faz sentido prender mulheres por uma decisão destas.
Mas começar aqui e passar para uma liberalização subsidiada do aborto foi um passo excessivo. Eu, por um lado concordado com o fim da criminalização da mulher pelo aborto, não concordo com o apoio dado a esta actividade.
Tal como a concordo com a descriminalização do consumo de drogas leves, o que não quer dizer que concorde que se deve agora subsidiar os charros.
Vou fugir às questões éticas e morais do foro pessoal, olhando apenas a questão ecónomica e social:
http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1780560
"As mulheres trabalhadoras que abortam recebem 100 por cento do subsídio social, enquanto uma mãe que está de baixa para dar assistência ao filho só recebe 65 por cento do salário."
Que tal invertermos isto?!
Os cerca de 100 milhoes de euros anualmente afectos ao aborto, em intervenção, subsidios e deslocações seriam muito melhor aplicados em políticas de natalidade uteis.
"O que Vaz Patto está a dizer é que, desde a vitória do "Sim" no Referendo sobre a descriminalização da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG), o aborto passou a ser «fomentado, promovido e incentivado pelo Estado»" - negar isto é negar o elefante na sala, independente da má análise dos numeros que ele possa ter feito
É assim o Abril dos 'valores': não é crime, o Estado paga? É DIREITO ADQYURIDO.
ResponderEliminarO aborto passou a ser fomentado, promovido e incentivado pelo Estado.
Qual a surpresa?
Oh, Daniel Fanqueira, é construção de raciocínio pífia mas que se generalizou entre um certa direita. Funciona assim: Concordo com os meus oponentes, com ideias opostas às minhas (porque sou muito liberal e equidistante) mas... e depois vem o chorrilho de disparates, preconceito e ignorância. Oh, homem, o único elefante no meio da sala é a sua cegueira e preconceito. Ah, e poupe-me ao arrazoado: "anónimo isto e anónimo aquilo", porque Daniel Ferreira não o identifica mais do que o anónimo associado a este comentário.
ResponderEliminar1. Parece-me que a pergunta do referendo em 2007 trás de forma explícita que a realização do aborto seja feita em instituições públicas de saúde ao referir-se a "estabelecimento de saúde legalmente autorizado". Portanto, não restringe a estabelecimento privado.
ResponderEliminar2. Não é o subsídio social por aborto que está errado, é o da assistência aos filhos que se deve criticar numa altura em que o Governo anda muito preocupado com a descida demográfica nacional (mais em resultado da forte emigração e das dificuldades financeiras da população do que do simples aborto)
3. Não sei se são gastos cem milhões devido ao aborto. Sei que antes da legalização, as estimativas apontavam para valores claramente superiores. Ou seja, a legalização do aborto aliviou o erário público.
4. Nem sempre o aborto se deve a, chamemos-lhe assim, razões eticamente discutíveis. Não há distinção entre o aborto legalmente permitido antes da sua legalização (em caso de má formação do feto, violação, etx.) Portanto o aborto tem vindo gradualmente a reduzir com o apoio das instituições particulares q lutam para criar alternativas a solução final.
5. O referendo ao aborto despenaliza a IVG. Porém, ao contrário dos estupefacientes, abortar não se traduz pela prática de uma contraordenação como sucede com as drogas, pelo que, enquanto o aborto é legal, porque vem assim regulado, o consumo de drogas não o é, ainda que já não seja crime.
6. O problema com estas posições é que não deixam de ser radicais e de fanatismo que gostam são contra e preferem varrer os problemas debaixo do tapete c/o se eles assim desaparecessem. Conheço pessoas com responsabilidades sociais que votaram contra e que hoje reconhecem que a alteração legal tem sido benéfica par reduzir o aborto. Não ver isto é não quer ver. Não há pior cego do que aquele que não quer ver.
Eu acho importante também ter em conta o custo de oportunidade desta situação.
ResponderEliminarOu seja, se o Estado não desse às mulheres a possibilidade de fazer o aborto no serviço público se calhar muitas teriam de recorrer aos chamados abortos de vão de escada. Nesse sentido, há que ter em conta os custos de tratar as mulheres que sofrem de complicações decorrentes de abortos realizados em condições menos próprias.
Quanto ao resto, só me resta dizer que há que apostar mais na divulgação de métodos contraceptivos.
O que acho estranho é que esse senhor considere que um feto tem direito a nascer. Eu digo-lhhe para ler o Código Civil que diz claramente que a personalidade jurídica apenas se adquire com o nascimento. Mas direito a nascer para quê? Se há um aborto é porque os pais consideram que não têm condições nem vontade para criar essa criança. Na verdade estamos perante um acidente fruto da incúria e ignorância portanto acho que faz todo o sentido dar a oportunidade às mulheres para abortarem. Antes abortar do trazer para este mundo crianças indesejadas pelos seus progenitores.
Antes de me debruçar (mais tarde)sobre o cerne da questão há algo de imediato que não pode passar, por violação clara dos factos e por propaganda indirecta do regime de salazar/ caetano / espíritos santos / mellos e companhia.
ResponderEliminarÉ essa questão dos "valores" de Abril
O 25 de Abril abriu as portas a uma outra enxurrada.Foi relativamente breve porque entretanto outras enxurradas se levantaram, dirigidas pelas mãos dos mesmos donos de Portugal de outrora. Filhos sucederam aos pais.Também na política, sempre nos grupos económicos.
Entre outros surgiram personagems com valores de alta craveira , como um dias loureiro, ou um oliveira e costa ou um cavaco, ou um vara, ou um penedo,ou um relvas ou um passos.Gente de antahno a cheirar a antanho, com os mesmos critérios éticos dum cazal ribeiro, dum thomaz ou dum espírito santo da altura.
Todos os pequenos e grandes figurões que nos governam e onde repousa a governança neoliberal.Curiosamente os mesmos que foram, são (ou serão?) elogiados pelos mesmos que agora vêm pregar "moral" e "valores" duma forma no minimo hipócrita.
Atentemos apenas aos últimos dias, mesmo nos ultimos dias, para vermos o panorama de horror por parte da seita que tomou conta do país. Para além daquele espectáculo triste e abjecto dum coelho a roer o país da forma como um tecno o consegue fazer.
Eis os dados:
-Crato e as suas mentiras, a sua cobardia, a sua desfaçatez escondidas atrás dum tempo verbal e com o apoio explícito duns tantos moralistas da nossa praça.
-Paulo portas e Barroso metidos até ao pescoço nos submarinos, tentando esconder os "negócios" do poder para aumentar ainda mais o seu poder ( e outras coisas mais.
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-João Grancho , um tipo que é secretario de estado do crato e que foi agora apanhado como vulgar aldrabão , copista de estudos académicos sobre um tema assaz curioso " A dimensão moral" (provavelmente da actividade dum neoliberal em exercício de "cidadania" umbilical).
Um outro "Secretário de Estado castro almeida mudou regras de concurso e beneficiou empresa de Rui Rio"
"Ricardo Salgado pediu a Carlos Moedas para ajudar o GES"
Transcrições em directo:"O Carlos Moedas conhece o ministro luxemburguês, de quem é amicíssimo. Vai tentar contactá-lo para ver se nós o podemos contactar. Enfim, é uma coisa simpática. Ao José de Matos vai também tentar contactá-lo, mas não sabe se o apanha hoje
O então presidente do Grupo Espírito Santo telefonou a Moedas, na altura secretário de Estado Adjunto de Passos, pedindo-lhe que este ajudasse o grupo, que estava com dificuldades no Luxemburgo.
"O Moedas, o Moedas! Eu punha já o Moedas a funcionar", foi com esta frase que, segundo publica hoje o Sol, o presidente do GES na Suíça, José Manuel Espírito Santos, incentivou Salgado a ligar ao atual comissário europeu.
-Sabe-se que Vítor Bento foi para o BES sem deixar Banco de Portugal
-Sabe-se que o governador do BdP autorizou que Vítor Bento, quadro do BdP, ssumisse a presidência do BES.
Eis os altos valores que presidem aos mais altos valores da governança neoliberal. Uma pequena e pálida imagem da ùltima semana da governança ao serviço dos donos de Portugal de agora, exactamente os descendentes directos dos donos de Portugal do antes do 25 de Abril
De
E pensar que gentinha destas ainda tinha a lei do seu lado há pouco mais de 6 anos ... são perigosos, podem causar muito sofrimento com o seu fundamentalismo, e é absolutamente necessário continuar a desmascará-los. Nuno, sugiro que desenvolvas esta excelente análise e a sugiras para publicação ao Público.
ResponderEliminarAlvaro
A esquerda tem um único valor de referência que lhe assegura resolver o mais complexo problema; todo o indigno cidadão, se não tem meios económicos pelos quais possa ser penalizado, é uma dupla vítima da sociedade e como tal é seu encargo proporcionar-lhe serviços que generosamente define como de mínimos de dignidade garantida, na cadeia ou fora dela, conforme a lei aplicável.
ResponderEliminarEis o fundamentalismo no seu fundamento.
Alguém que diga que a "esquerda" tem um único valor de referência é alguém perturbado ou ressabiado.
ResponderEliminarAlguém fundamentalista no pior sentido que comporta a palavra. Pelo que o contraditório se torna um exercício inútil e fora de tempo.
Resista-se antes o silêncio sobre os "valores" dos herdeiros do 24 de Abril que nos governam.
(O palavreado sobre a "cadeia" é por demais sintomático porque alguns dos "heróis" do neoliberalismo podre e da direita trauliteira é onde deviam estar. Sempre, e ao contrário do que a desumanidade neoliberal apregoa, com um mínimo de dignidade. Mas na cadeia e ,pior para eles, , com o confisco do que roubaram, dos muitos milhares de milhões que saquearam).
De
Vaz patto vai na senda daqueles juízes que proclamaram há dias os limites temporais da "importância do sexo".
ResponderEliminarMas vai ainda mais longe.Filho dilecto dessa alcova de figurões grados das ditas "elites" fundamentalistas dos mercados e das missas, a universidade católica, segue embevecido o catecismo que lhe reza diariamente aquela figura já do anedotário nacional ( curiosamente com um lugar de relevo naquela instituição) o césar das neves. Esse mesmo, esse dos delírios oníricos quando diz que fala com Deus e que proclama que este lhe segredou aos ouvidos que o Mercado era o novo messias na terra.
Disse que iria voltar ao assunto do post, mas alguns bons comentários já foram produzidos, nomeadamente o de mexilhão e de anónimos, que souberam colocar os pontos nos is com uma clareza notável.
Citemos um artigo que contribui também para o esclarecimento da realidade e para a reflexão necessária, sem nos deixarmos arrastar para o uivo dos lobos sedentos de vítimas:
"Citemos:
"A Direcção geral da saúde alega que SNS até poupou com a entrada em vigor da lei".
A directora da Divisão de Saúde Reprodutiva da Direcção-Geral de Saúde, Lisa Vicente, defende a manutenção da lei tal qual está. “A licença, ou subsídio, dado às mulheres que abortam tem sido alvo de uma constante desinformação, nomeadamente porque esta licença protege as mulheres que sofreram abortos espontâneos, gravidezes ectópicas ou que foram obrigadas a interromper a gravidez por motivos como a malformação do feto ou doença materna”, sublinha.
Lisa Vicente considera ainda que a cobrança de uma taxa obrigaria o SNS a determinar se a interrupção anterior fora por vontade da mulher ou determinada pela “malformação do feto ou violação”, por exemplo. Quanto aos custos da interrupção voluntária da gravidez, a responsável da DGS é peremptória: “Esta lei traz mais benefícios do que prejuízos, nomeadamente porque fez diminuir consideravelmente o número de mulheres que recorrem às urgências com complicações decorrentes de um aborto ilegal, não só de abortos incompletos mas também infecções ou perfurações do útero”.
Entre os argumentos contra a alteração da lei, a responsável da DGS destaca o mais importante: “Entre 2001 e 2007, antes da entrada em vigor desta lei, o relatório das mortes maternas dá conta de 12 mortes em 92 atribuíveis a aborto. Depois disso, houve o caso de uma morte por aborto medicamentoso. E depois de 2009 nenhuma mulher morreu em Portugal por aborto”.
De
Resista-se à bandalheira neoliberal.
ResponderEliminarMas registe-se o erro e a correcção do dito
De
A responsabilização e moralização da responsabilidade de cada um tambem devia ser equacionada com menos fundamentalismo. Não se pode concordar que se esteja a repetir abortos sucessivos só porque a cabeça dos implicados não se dá ao trabalho de planear a vida com rigor. Há uma maneira de alertar e motivar as pessoas = ir-lhes ao bolso. Gratuito é sinónimo de desleixo.
ResponderEliminar( é precisamente a ameaça do "ir-lhes ao bolso " que deixa desvairados, com os olhos em órbita, a proclamar medidas punitivas e a apelarem aos "amigos" mais fortes , esta cambada do BES, do GES, dos passos, dos portas, dos belmiros, dos soares dos santos, das albuquerques.
ResponderEliminarEstes roubam milhões de milhões. Sinónimo de desleixo é que não será.Estão altamente motivados para continuarem o saque.
Como se vê)
De
Senão se puder ir-lhes ao bolso,
ResponderEliminarsendo barbarismo ir-lhes às trombas,
considere-se ir-lhes às trompas!
DE, eis uma boa oportunidade para para os responsos nazis...
Peça-se desculpa ao jose mas este tipo de linguagem não colhe.
ResponderEliminarNem pelo humor medíocre, nem pelo nível paupérrimo.
De
E um pingo de escrúpulos, não há Nuno Serra?
ResponderEliminarArtigo ridículo sr. Nuno Serra, a manipular estatísticas como lhe apetece talvez engane a esquerda ignorante que anda por aí.
Vejamos uma coisa: Se o número de nascimentos tem registado uma queda acentuada "pela devastação económica e social causada pelo «ajustamento» e pela austeridade"; não será também importante referir que as mulheres não só têm menos filhos, como também engravidam menos devido à conjuntura que vivemos?
Porque a forma mais correta e mais realista de abordar esta situação estatística é perceber o peso das IVG's no número de gravidezes. Uma vez que, existindo menos gravidezes é natural que existam menos abortos, MAS QUE NÃO SIGNIFICA QUE A PERCENTAGEM DAS MULHERES QUE ABORTARAM VOLUNTARIAMENTE NO TOTAL DAS MULHERES QUE ENGRAVIDARAM TENHA AUMENTADO.
Como se pode entender, afinal quem se enganou nas estatísticas foi o sr. Nuno Serra! Para variar, a carneirada da esquerda vai atrás de mais uma tolice estatística.
Caro Anónimo do dia 30 de Outubro,
ResponderEliminarDeixe-me ver se percebo o seu argumento (e não estou, sinceramente, seguro de o ter percebido): em sua opinião, a proporção do número de IVG no total de gravidezes deveria ter-se mantido (em vez de ter aumentado, em resultado da diminuição drástica da natalidade). É isso?
Se for isso, deixe-me dizer-lhe o seguinte: não sabemos (nem temos evidentemente que saber, era só o que mais faltava), quais as motivações que levaram à interrupção da gravidez (por sua livre opção). E portanto, quaisquer afirmações a esse respeito não passam de especulações, hipóteses interpretativas.
A sua, se bem entendi, é que não fosse a crise e o número de IVG teria aumentado (porque era essa a expectativa dos defensores do «Não» no referendo, a de que a partir do momento que se descriminalizasse a IVG passaríamos a ter uma rebaldaria).
Muito bem, é uma hipótese. As minhas hipóteses por acaso são outras: não só a descriminalização da IVG favoreceu o planeamento familiar (reduzindo portanto o número de abortos), como não se verificou a tese - tão querida às abencerragens que defendiam o «Não» no referendo - de que a IVG passaria a ser usada como método anticoncepcional.
E assinalo outra hipótese (que não passa disso mesmo): não é de excluir a possibilidade de, com as dificuldades trazidas pela crise (e pela magnífica austeridade e mais o fabuloso «ir além da troika»), algumas mulheres e casais se tenham visto forçados a optar pela IVG (sobretudo em situações de gravidezes não programadas), o que não aconteceria se as expectativas em relação ao futuro fossem outras.