Numa reportagem na revista do Público de hoje, sintomaticamente intitulada “os intelectuais de direita estão a sair do armário”, o jornalista Paulo Moura consegue escrever que há uma direita intelectual que começa a desafiar a hegemonia da esquerda no campo das ideias, graças ao esforço e mérito de um punhado de intelectuais, alguns saídos da clandestinidade da blogosfera e que confrontam com “realismo” as “utopias” dessa tal esquerda dominante. Incrível, não é? Em que país vive Paulo Moura pelo menos desde os anos oitenta/noventa, já lá vão bem mais de duas décadas?
Na realidade, Paulo Moura reproduz todos os lugares comuns de que é feita a hegemonia das direitas, incluindo a ideia de que continuam a ser uma minoria a precisar de conquistar espaço para as suas ideias prudentes e sensatas. Na realidade, são a maioria e têm o monopólio do radicalismo verbal, um contraponto direitista ao esquerdismo de outros tempos, na comunicação social. E sabem-no, claro. O seu à vontade é sintomático.
Olhem para o que se passa no campo da economia, onde a hegemonia é quase total, da produção ideias à sua reprodução nos jornais ou nos debates na televisão, onde o que surpreende é aparecer alguém a dizer qualquer coisa de esquerda, qualquer coisa civilizada. Façamos aliás um exercício simples. Abramos o Expresso: por cada keynesiano moderado, como Nicolau Santos, há um Daniel Bessa, um João Duque, um João Vieira Pereira e um Pedro Guerreiro.
Pensemos agora no campo das relações internacionais, em geral, ou no da integração europeia, em particular. Aí o panorama é tão desolador como na economia: o debate vai dos neoconservadores, como Miguel Monjardino, aos liberais de “centro-esquerda”, como Teresa de Sousa ou Jorge Almeida Fernandes. Os dois últimos especializaram-se, neste caso no Público, em saudar a esquerda que adopta os termos da direita e em apodar de populistas os que não o fazem. E que dizer de Nuno Rogeiro, por exemplo? E que dizer da quase ausência de espaço para o equivalente à esquerda, por exemplo para intelectuais marxistas, nesta e noutras áreas decisivas no debate político. Será demérito?
E que dizer de uma tendência, essa sim mais recente, mas pouco falada: a aposta dos capitalistas no campo da produção de ideias, sem mediações, com os muitos milhões de Soares dos Santos a patrocinar a melhor inteligência neoliberal que o dinheiro consegue comprar, agora na figura de um Nuno Garoupa? Sempre que o capitalismo se purifica, volta, com menos desfasamentos e mediações, a verdade que temos a obrigação de conhecer com realismo: as ideias dominantes são as ideias da classe dominante.
Nisto da hegemonia, até pode haver mérito, claro, mas há sobretudo redes sociais e aparelhos ideológicos bem financiados e oleados, diga Henrique Raposo as balelas meritocráticas que disser. A verdade é que hoje chegámos aqui: a utopia é um luxo da direita e já não requer nenhuma coragem. E a alardeada disposição conservadora à Oakeshott nunca passou de uma postura só para disfarçar o que sempre foi, é e será o natural activismo das direitas, com os seus usos e abusos do Estado e de outros aparelhos. Não se deixem enganar por Paulo Moura.
«...qualquer coisa de esquerda, qualquer coisa civilizada...».
ResponderEliminarEsta é a pesporrencia de esquerda que por um qualquer processo psicótico a dispensa de encontrar soluções que comprovadamente funcionem!
Muito bom.
ResponderEliminarComo Vitor Dias lembrava, curioso é ver tal hino ao disparate no jornal Público, escamoteando quem foi o seu director durante onze longos anos.
Um dos que saiu do armário há já bem logo tempo.Com a benção claro do sr Belmiro.
De
A Esquerda precisa pois, urgentemente, de um projeto editorial que lhe permita bater-se contra a Direita no campo da ideias e que apele um largo espectro de leitores, com uma linha editorial clara, contrariamente à pretensa independência que caracteriza os diários e semanários que ainda sobrevivem. E que seja igualmente um espaço de debate entre as diferentes Esquerdas, indo dos Marxistas aos Liberais. Não pode é servir só para alimentar um dos lados do feudo que existe em Portugal entre essas Esquerdas. Emídio Rangel teve em tempos, creio, essa pretensão. Bem sei que o sucesso de tal coisa depende da publicidade e essa é o poder económico que a controla, mas que saudade dos velhos tempos de 'O Jornal'!
ResponderEliminarA hegemonia da produção dos conteúdos da direita nos "mass media", é sobretudo a que lhe advém da hegemonia das classes dominantes, que ali vertem de forma impune a sua ideologia.
ResponderEliminarApenas uma alteração da correlação de forças no plano político pode conduzir a um outro estado de coisas, com o consequente resgate da democracia, também no plano da pluralidade de ideias. Mas essa unidade de esquerda, capaz de paulatinamente abrir tal caminho, tem encontrado obsctáculos múltiplos e, infelizmente, não apenas no campo da direita e dos seus interesses, propriamente ditos. Na verdade, para além dessa mascarada chamada PS, que alguns (cada vez menos, felizmente) insistem em colocar no campo da esquerda (talvez em razão de uma espécie de ordem natural das coisas, de que, tendo-se afirmado de um certo campo aí deve ser arrumado em sucessão natural e desligada de quaisquer conteúdos concretos - uma espécie de sucessão dinástica em ambiente republicano), também no campo da esquerda à esquerda do PS (a esquerda, então), há muito quem adore o Povo, mas lhe tenha horror ao cheiro. Vai daí, importa criar linguagens novas, abordagens mais contemporâneas, paradigmas de intervenção mais libertários. Tudo muito bonito, tudo muito higiénico, tudo muito inconsequente. Esse é o segundo e mais dramático dos problemas.
Marques Mendes, Miguel Sousa Tavares, Marcelo Rebelo de Sousa, Bagão Feliz, Manuela Ferreira Leite, Santana Lopes. no campo das televisões e do comentário para as massas, é impressão minha ou é tudo à direita...?
ResponderEliminarah espera! há o Louçã, à sexta feira à NOITE, para termos (esquerdas) todos igualdade de oportunidades na audiência.
A pesporrência de comentários como o deste jose que cataloga os que combatem a barbárie a que assistimos como se de "processos psicóticos" se tratasse. A necessitar de "tratamento" adequado?
ResponderEliminarA desfaçatez e a pesporrência, já sem vergonha e sem freio.
Já agora, um bom comentário caro João
De
Completamente de acordo com o anónimo das 14.47.
ResponderEliminarEstou totalmente de acordo com o
ResponderEliminarartigo.
Praticamente já não existe imprensa independente no nosso País. Toda a imprensa está mais ou menos alinhada na ideologia do capitalismo da 3º geração, embora alguns ainda se dêem ao trabalho de disfarçar um pouco.
A situação vai ao ponto das distribuidoras fazerem o boicote a alguns órgãos de informação , dos quais temos um exemplo flagrante
o mensário francês " Le Monde
Diplomatique "nas suas duas versões , em francês e português.
Ana Rita, um dos dramas com Miguel Sousa Tavares, Barreto ou Filomena Mónica é que há quem diga que são de esquerda.
ResponderEliminar"...um projecto editorial que lhe permita bater-se contra a Dieita.."
ResponderEliminarIsso é fácil. E que tal o mesmo tipo de projecto utilizado no PREC ? Censura e saneamentos internos levados a cabo pelas comissões de trabalhadores.
PS : Não confundir esta censura com a outra, a má. Esta é é uma cessura de ESquerda, logo boa e civilizada.
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ResponderEliminarCá está !