quinta-feira, 29 de setembro de 2011
Tobin or not Tobin?
A Comissão Europeia apresentou ontem um plano para a taxação das transacções financeiras. Esta é uma pequena taxa sobre operações cambiais, similar à proposta, nos anos setenta, pelo economista keynesiano e vencedor do prémio Nobel James Tobin. Apresentada pouco tempo depois do fim dos acordos de Bretton Woods – alicerçados num sistema de câmbios fixos internacionais e na convertibilidade do dólar em ouro – esta proposta procurava atirar um “grão de areia” para a engrenagem da especulação do novo mercado de câmbios flexíveis. A taxa deveria ser pequena, de modo a não afectar os investimentos de longo prazo, mas suficientemente significativa para desencorajar as transacções especulativas, na medida em que o seu efeito se multiplica de acordo com a frequência das transacções.
Desde então o problema da especulação financeira só se agravou, multiplicando-se as crises financeiras. Daí que no final dos anos noventa, num editorial do Le Monde Diplomatique, Ignacio Ramonet tenha recuperado a proposta - como forma não só de combater a especulação financeira, mas também de conseguir novas e extraordinárias receitas que poderiam ser usadas de forma solidária. Este editorial deu origem a uma associação, a ATTAC, hoje presente em diversos países, entre os quais Portugal, e é um dos factores que esteve na origem dos encontros internacionais por uma globalização alternativa, tornados famosos com os Fóruns Sociais de Porto Alegre.
Depois de anos de pressão internacional, até aqui sempre recusada pela UE, a proposta agora apresentada parece bem desenhada: duas taxas de 0,1% e 0,01%, conforme os produtos, seriam cobradas em todas as transacções financeiras, com excepção de certas operações realizadas pelas famílias e pelas pequenas e médias empresas. Procurar-se-ia assim evitar que a especulação cambial se deslocasse para outros mercados: quem passasse a pagar imposto nos mercados cambiais poderia optar antes por especular em mercados aproximativos destes, como por exemplo o mercado da dívida pública denominada em diferentes moedas. A receita prevista pela Comissão é de 57 mil milhões de euros por ano (à volta de metade do que é hoje o orçamento europeu). Nada mau.
As tradicionais vozes que se opõem a esta taxa já se fizeram obviamente ouvir. Todavia, muitos dos seus argumentos do passado deixaram de ser utilizados. Não é fácil defender que esta taxa traria ineficiência à finança global no contexto actual, por exemplo… O argumento mais comum é o do risco que os centros financeiros se desloquem para paragens mais fiscalmente amigáveis, das Bermudas à Suiça. Este argumento tem pouco peso. Se há coisa que temos aprendido com a actual crise é que os sistemas financeiros, mesmo estando muito integrados em termos internacionais, têm uma clara base nacional. Não existem verdadeiros bancos globais. Nem mercados de acções. Talvez Londres, como maior praça financeira do mundo, pudesse vir a ser afectada, mas dificilmente isso seriam más notícias para o resto da Europa ou mesmo para o Reino Unido, que com uma economia completamente dependente do sistema financeiro precisa urgentemente de reorientar as suas fontes de crescimento. Por outro lado, esta taxação tem a vantagem de chamar a atenção para os diversos paraísos fiscais existentes. A Europa tem o músculo económico necessário para forçar ao seu encerramento; aliás, até já foram dados alguns passos nesse sentido há cerca de dois anos.
A aplicação desta medida é ainda algo de longínquo - e não é de todo certo que venha a sair do papel. em particular, precisa do acordo dos estados-membros. No entanto, nada impede que quem sempre fez da Taxa Tobin uma bandeira aproveite esta pequena vitória para colocar maior pressão sobre os estados e avançar com uma agenda popular de controlo e regulação dos mercados financeiros. Não só é uma oportunidade para desmascarar os interesses que comandam hoje a economia europeia, como facilita a mobilização em torno de propostas concretas com alcance sistémico.
Do "press release" da Comissão Europeia (http://europa.eu/rapid/pressReleasesAction.do?reference=IP/11/1085&format=HTML&aged=0&language=en&guiLanguage=en) interpreto como estando isentas de tributação TODAS as operações realizadas pelos cidadãos (individuais) e empresas (não-financeiras).
ResponderEliminarEspero que assim seja, pois já bem basta a perda de poder de compra que um trabalhador sofre por via da inflação (o IPC subestima sempre a realidade por interesses políticos) e da tributação (extorsão estatal para benefício da "máquina" e não do cidadão).
Perante este ambiente hostil, um individuo que vai amealhando um "pé de meia" ou se dedica à especulação financeira ou então vai sendo devorado aos poucos. Isto porque a qualquer momento o desemprego surge (que subsídio haverá?)e no fim vem a reforma (que pensão haverá?).
Tribute-se os especuladores institucionais, pois esses são os tais que são salvos quando perdem. O pequeno arrisca por sua conta, ficando na miséria se for incompetente ou tiver azar.