Importa recordar que o Tratado de Maastricht consagrava um limite para a dívida pública de 60% do produto interno. Paul De Grauwe, à semelhança de muitos outros especialistas, considera que a "numerologia de Maastricht" é arbitrária, embora saliente que este valor corresponde ao quociente entre um défice público de 3% e uma taxa de crescimento nominal do produto de 5% (valor típico no início dos anos 90). O que muita gente não percebeu é que, com o Pacto de Estabilidade e Crescimento, a exigência relativa à dívida pública aumentou de forma absurda. Ao impor a meta do equilíbrio orçamental (saldo nulo a médio prazo), implicitamente o PEC consagrou como nível desejável da dívida pública 0% do produto. Com um numerador tendencialmente nulo, o quociente acima referido é também nulo, qualquer que seja a taxa de crescimento do produto. Ou seja, nos termos do PEC, os investimentos públicos têm de ser pagos num horizonte temporal estreito. O horizonte temporal dos beneficiários do investimento público é muitíssimo maior que o dos cidadãos que têm de suportar o correspondente encargo fiscal. Lembrando Romano Prodi, o PEC é estúpido!
Entretanto, todos sabemos que o PEC tem sido generalizadamente violado. Tal incumprimento não se deve, no essencial, a um laxismo dos governos. A razão é outra: a dinâmica da economia é incompatível com o cumprimento do PEC. Uma economia capitalista é intrinsecamente cíclica e, sobretudo após a livre circulação dos capitais especulativos, está mais sujeita a períodos de euforia que terminam em crises. Em tempos de recessão, a economia gera défices: as receitas fiscais descem e as despesas sociais no apoio aos desempregados e aos mais pobres aumentam. Contudo, num contexto de recessão, o PEC exige aos governos que cortem na despesa pública e/ou aumentem os impostos para que o défice se situe algo abaixo dos 3% (no mínimo). Não é preciso ser economista para perceber que estas medidas, em vez de reduzirem o défice, aprofundam a recessão e o desemprego. Quando o país não está em condições de contrabalançar esse efeito através das exportações, o défice acaba por não baixar significativamente. O PEC é mesmo estúpido!
Sob pressão da Comissão e do Conselho, desde a criação do euro que os governos têm vindo a cortar na despesa pública para tentar cumprir o PEC. Na prática acabam por cortar sobretudo no investimento e preservar a despesa pública corrente, aquela que beneficia no imediato os eleitores. Sabendo-se que as infra-estruturas em educação, investigação, saúde e cultura, e a correspondente despesa de funcionamento, são essenciais para o crescimento económico, então percebe-se que as pressões para o cumprimento do PEC, a par da política monetária restritiva do BCE, são responsáveis pelo baixo crescimento da zona euro desde a sua criação.
Por conseguinte, criar um travão constitucional à dívida pública significa consagrar ao mais alto nível jurídico uma regra absurda. Aliás, a proposta não terá sucesso e até será esse o resultado com que os líderes da Europa rica contam. Entretanto, sabendo que a maioria dos seus eleitores não quer ouvir falar de coesão e solidariedade, preferem adiar decisões cruciais até que os especuladores provoquem o desenlace que não têm coragem de assumir. Por mim, está mais que na altura de pensarmos no nosso futuro pós-euro.
(Da minha coluna no jornal i)
A propósito daquela fotografia:
ResponderEliminarQual deles é que disse: -Já os fodemos a todos.
Por mim estou farto de ver todos estes canalhas, bandalhos a gozar com todos nós.
ResponderEliminarConviria que se pusesse um fim a isto.
Esta gente nunca irá fazer seja o que for pelas pessoas.
Ao diabo com eles todos e particularmente os Coelhos, Barrosos, Socrates e outras viboras semelhantes.
A despesa de capital é claramente mais virtuosa que a despesa corrente. Nesse sentido, é pena que o governo de Portugal corte na despesa de capital quando a devia estar a aumentar.
ResponderEliminarRecomenda-se um bocadinho mais de cuidado com o tipo de bandalheira retórica que se quer praticar.
ResponderEliminarOra, seja 'D' e 'Dív' o défice e a dívida em razão do PIB, respectivamente, e 'r' a taxa de crescimento do PIB. A expressão que usa (ou postula, ou diz que um tal fulano postulou) para sustentar a retórica com que nos presenteia, nomeadamente, esta
D / r = Dív,
não faz sentido algum, porque não passa nos mais elementares testes de razoabilidade. Por exemplo, se eu tiver uma taxa de crescimento infinita com 'D' finito, não posso ter dívida nenhuma? Isto não faz sentido algum, aliás, é mesmo paradoxal.
Assim é muito fácil, inventa-se uma expressão que não faz sentido nenhum, diz-se que é com ela que estão a ser delineadas as políticas económicas e depois tira-se da cartola, surpresa das surpresas, um contra-senso grosseiro que a expressão encerra, usando-o como arma para mandar abaixo as políticas económicas.
Por favor, veja se revê os seus apontamentos de economia, ou lá o que é. Ou então veja faz um upgrade à honestidade intelectual. Ou então veja se começa a pensar melhor. Uma destas três coisas é necessária.
Caro Anónimo (20:01)
ResponderEliminarRecomendo-lhe que pense duas vezes antes de vir a este blogue comentar assuntos que desconhece. Acresce que a sua ignorância não desculpa o uso que faz de linguagem grosseira ou ofensiva.
Recomendo-lhe que estude alguma coisa sobre estes assuntos e pode começar por este texto de Paul De Grauwe: http://www.econ.kuleuven.be/ew/academic/intecon/Degrauwe/PDG-papers/Discussion_papers/Stability%20and%20Growth%20Pact%20CEPS%202003.pdf
A seguir, leia a minha posta: A dinâmica da insolvência.